Relacionamento

Se existe uma palavra no mundo que possa incitar sentimento de repulsa e medo é essa: Relacionamento.

Sempre tive como verdadeira a máxima: “o ser humano não nasceu para viver junto, mas também não nasceu para viver em separado”, tornando qualquer relacionamento uma dualidade sem fim de quereres, anseios e expectativas.

Se relacionar - seja com pessoas aleatórias, familiares, amores, amigos - é algo tão insólito e confuso, por isso seria mais fácil não o fazer.

Somos pessoas diferentes, com gostos e personalidades distintas, com o profundo desejo de que o outro seja, faça e aja de acordo com nossos conceitos de vida.

Sempre vemos o mundo por nossa paleta de cores e assim acreditamos no dever dos outros seguirem a mesma aquarela.

Mas, se somos tão diferentes, como é possível seguir os mesmos conceitos? Não é possível.

Não sendo possível, como se relacionar? A resposta teórica é simples, adaptando-se, aceitando diferenças, respeitando os limites de cada um, cedendo no que precisa ser cedido para se manter o equilíbrio.

Muito bonito de ouvir, mas quase impossível de pôr em prática.

Com a evolução humana, as revoluções pós-guerra e principalmente a independência feminina, física, psicológica e financeira, o ser humano tornou-se um ser ainda mais difícil de lidar.

Os dogmas sociais caíram, as imposições machistas e sexistas ruíram e com isso surgiu uma nova era social, na qual ceder, respeitar os limites e as diferenças tornou-se quase impraticável.

O ser humano, em sua essência, é egoísta e crê em sua verdade como sendo absoluta, tornando o outro um ser subjugado.

Nós nascemos sozinhos e morreremos sozinhos, nos relacionamos por necessidade de sobrevivência, como uma matilha. Juntos somos mais fortes contra os predadores, que no caso dos humanos, são os próprios.

A diferença entre uma matilha e uma sociedade civil está na disputa velada pelo poder, na matilha as regras são claras e não se relacionam na esperança de mudar o outro.

Trazendo o conceito para o lado amoroso, é praxe ouvir dizer sobre o casamento nos tempos atuais como sendo uma instituição falida na qual as pessoas não querem mais investir, caso o relacionamento esteja balançando, tenha problemas, esteja desgastado, acaba por se uma tornar peça mecânica, não valendo a pena consertar e sendo assim mais fácil trocar.

Difícil analisar essa questão sem saber a quem se refere.

Somos seres diferentes e temos como princípio a nossa verdade frente a verdade do outro, então até que ponto vale mesmo a pena investir?

Será melhor se afastar e ir em busca do “ser ideal”?

É justamente a diferença a causa do relacionamento ser ainda mais complicado.

Há algumas explicações que visam esclarecer o porquê de o ser humano ser como é.

Dizem que o ser humano é movido pelos exemplos que observa em sua trajetória de vida, principalmente, em tenra idade, assim se relacionar seria aprendido pelo subconsciente através dos exemplos convividos.

Outra explicação é de que se aprende de forma refratária ou imantada.

Dito isto, temos o seguinte: uma criança que conviveu em seus primeiros anos de vida com uma família tumultuada, onde não havia respeito, nem equilíbrio, pode duplicar esse conceito na fase adulta - acreditando ser o melhor caminho, único que se conhece, ou pode internalizar esse tipo de relacionamento como o que não quer e agir de forma oposta ao vivenciado.

Uma criança que não teve muito contato com mundo externo, viveu sua tenra idade de forma muito rígida, sem muitos contatos de carinho materno ou paterno, tende, em sua fase adulta, ser retraída, não sabe como dar ou receber carinho, se abrir, se deixar conhecer, ou ainda se torna pedante, carente, buscando sempre ter e estar em atenção total.

Todas as ações sobrevém dos exemplos e do aprendizado oriundo deles. E assim vai...

Se adicionarmos a este conceito o fardo social carregado, aquele imposto ao ser humano - também em tenra idade - de ser um agente político, bem visto, aceito no meio que se convive, cria-se uma bomba relógio, tentando equilibrar- se entre o que é, o que aprendeu a ser e o que os outros esperam que seja.

Isso é relacionar-se, viver em uma eterna corda bamba, um único descuido desmorona tudo a sua volta, esquece, o ser humano é um ser falho.

Por óbvio, diante das diferenças humanas, qualquer tipo de relacionamento, depois de certo tempo, necessita de alguns ajustes.

Os embates aparecem, as divergências de pensamentos e atitudes ficam evidentes, o encantamento dá lugar à realidade e é nesse momento que a presença dos questionamentos sobre o presente e o futuro dos relacionamentos afloram.

Nestes momentos, os conflitos são inevitáveis.

Há algo que possa ser feito? Consertar ou trocar. No que se refere a relacionamento, estes dois conceitos vão muito além do desejado.

Como dito no início desta digressão, somos seres sociáveis e muitos fatores influenciam nossas decisões.

É mais fácil não se relacionar, mas, a partir do momento que se decide fazer isso, é necessário estar disposto a assumir todas as consequências desse ato.

Durante muito tempo de nossas vidas, nos questionamos após o término de um relacionamento, sobre o que poderíamos ter feito para evitar, melhorar etc., prometemos não cometer os mesmos erros, que tudo vai ser diferente.

Nos esquecemos dos fatores ditos acima, quem somos, o que aprendemos e o que as pessoas desejam que sejamos, e nesse momento nos deparamos com os mesmos enredos.

No meu conceito, quando os relacionamentos estão conflitantes, existe um momento no qual se deve respirar fundo, ter muita calma, sentar e dialogar, ver onde estão os erros e fazer os devidos ajustes, pois, se sua decisão é estar envolvido naquele relacionamento, vale a pena investir, vale a pena ajustar e continuar uma vida amorosa digna de funcionar muito bem.

Tentar consertar não significa mudar o outro, mas sim a si mesmo, de forma a amenizar os impactos vindos de dentro para fora.

O outro, se perceber a necessidade de mudança, irá mudar por si.

Se realmente acreditar ser aquela pessoa, “a pessoa”, se a relação é saudável, mesmo diante de todos os defeitos, vale a pena investir até o último instante.

Depois desse limite, sim você pode pensar em rompimento, em trocar.

Tudo isso mantém você com a consciência tranquila de que fez de tudo e fez sua parte, principalmente, que não deixou passar algo tão importante em sua vida: o amor.

Não no sentido de colocar a culpa no outro pelo término, mas com a consciência de não ter dado certo ou de que deu certo, até aquele momento.

Infelizmente para uns e felizmente para outros, mesmo morando no mato, sem contato direto e constante com outras pessoas, mesmo vivendo como felinos solitários, nossa sociedade é uma grande matilha.

Por isso, em qualquer forma de se relacionar, há que se adaptar para dar certo, tornar se empático, ver pela paleta de cores do outro, colocar se em segundo plano em prol do todo.

Não é fácil, mas quem disse que seria?