DELICIOSO SINAL DO ALÉM

A morte ronda as nossas vidas numa calada vigília. Quanto mais envelhecemos, mais ela mostra suas garras, cheiros e texturas. Perdi o meu pai em 2002 e a minha mãe em 2019. A saudade de ambos foi ficando menos aguda com o passar do tempo, como é de praxe. A sala que ocupo na minha editora é repleta de quadrinhos com fotos e textos feitos por mim. Esses quadrinhos são pendurados na parede por ganchinhos, que já vêm com fita adesiva pra esse fim, reforçados por fita crepe. Alguns deles sempre caem ao chão. As quedas ocorrem quando estou trabalhando ou fora do escritório. Então os recoloco num ganchinho novo, reforçando com fita crepe. Os demais quadrinhos. afixados da mesma maneira, ficam firmes no seu lugar, nunca vão ao chão. Os que caem têm textos ou fotos relacionados aos meus pais. Entendo isso como sinal deles, como se dissessem algo assim: "filho, estamos por aqui, não fomos embora de vez...". Talvez um dia entenda melhor o motivo dessa mensagem, possivelmente quando nos reencontrarmos. Até lá vou curtindo esse fio de contato tão especial. Talvez tenha gente que também perdeu algum ente querido e ignore esses deliciosos sinais deles, o que é uma grande pena. Enquanto eu escrevia esse texto (5:29h da madrugada), entrou uma abelhinha e ficou zunindo pela sala, coisa rara na editora, senti que não foi por acaso e lágrimas vieram aos olhos pra dizer que compreendi, e adorei, o sinal do além.

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 14/09/2023
Reeditado em 14/09/2023
Código do texto: T7885179
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