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Com o passar do tempo, sinto que ando querendo tudo meu com mais qualidade. Desde o levantar, até escovar os dentes, lavar meu rosto e descer para fazer meu café. Sorrio para o espelho, independentemente do rosto que vejo. Já passei daquele tempo em que eu dizia para mim mesma: “Nossa, você está feinha hoje”… Hoje em dia eu estou sempre linda. Isso porque Deus, na sua sapiência, nos tira um pouco a visão para esses detalhezinhos.

Desço para preparar o café, mas antes, eu paro na janela de vidro da sala que dá para o lago. Tudo sem pressa, agradeço a Deus pelo meu dia. Faço então meu Bustello (café cubano, parecido com o brasileiro) e fico a esperar meu marido descer. Esse momento para mim sempre é especial e importante. Ver que estamos repartindo mais uma vez um café da manhã e a nossa prece matinal.

Mais tarde resolvo sair e pego o carro da minha filha. Ela está no Brasil fazendo seu MBA e estou encarregada de dirigir seu carro pelo menos 2 vezes por semana. É um Honda esporte preto, baixinho, e ele me certifica que já não sou tão jovem. Abro a porta, sento e afundo entre os vidros fumê.  Fico a procurar onde ligo o rádio e de repente o ar condicionado vem à tona e os limpadores de para-brisas comecam a funcionar, o que me dá um acesso de riso.

Na esquina aquele mesmo policial está ali, no cantinho, entre árvores. Sempre esperando alguem estar em alta velocidade ou não dar aquela paradinha básica na esquina.  Mas ele nunca me pegou! Mesmo porque estou na fase em que obedeço fielmente as regras. Já tive algumas multas, mas isso é passado.

Mais tarde, chegando em casa e balançando meu chaveiro, fiquei a procurar a chave de casa. E a simples visão da minha chave prateada me deu aquela sensação de segurança e felicidade. Parei por uns instantes olhando aquela chave e antes de abrir a porta olhei para o lago,  para o céu - e agradeci.

Minha casa, meu lugar tão querido e seguro, e aquela chave tem o poder de me fazer entrar no meu paraíso. Sorri para mim mesma. Meu paraíso particular, onde na entrada já tiro meus sapatos. Olho para minhas plantas em cascata caindo na parede da sala.

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Já estive nas portas de uma cirurgia plástica. Já estava tudo marcado e no penúltimo dia eu desisti. De repente descobri que não queria mais mudar. Tudo que eu queria era continuar sendo eu mesma. A olhar no espelho com a deficiência de meus olhos pelo desgaste do tempo, e me ver assim, perfeita. Não esqueço da minha alegria quando no dia seguinte olhei no espelho, acariciando meu rosto, e agradeci. Porque a verdade é que a perfeição está no sentir.

Hoje sou mais feliz: na aceitação das marcas de meu rosto, da perda daquele viço da juventude. Ainda me visto como jovem, e procuro roupas nas lojas de adolescentes. Acho que minhas roupas refletem essa menina que sempre vai morar em mim.

 

Mary Fioratti
Enviado por Mary Fioratti em 16/09/2023
Código do texto: T7886916
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