Minha repórter predileta

Minha repórter predileta não cobre o Vaticano. Não vê o Papa de perto ou de longe, orando e pedindo ao mundo fé, oração e fim das guerras no Oriente, na Ucrânia...

Minha repórter predileta não está na Argentina cobrindo a eleição presidencial em que ultradireita e esquerda se digladiam para governar o país.

Minha repórter predileta não está no Brasil, de olho nas reformas econômicas, na cobrança de mais impostos para os super-ricos, no dólar, na inflação e na taxa de juros. Minha repórter predileta não está de olho nessa figura abstrata que se chama mercado. Para ela, tudo é muito concreto, visível...

Minha repórter predileta não cobre as agruras desta terra, onde a violência campeia nas periferias e até onde os ricos se abrigam. Minha repórter predileta não cobre o desmatamento suicida, o marco temporal das terras indígenas, as chuvas destruidoras...

Minha repórter predileta não comanda jornais, emitindo opiniões, questionando seus pares, aprendendo com eles, errando, acertando, corrigindo-se em transmissões ao vivo, sempre difíceis.

Minha repórter predileta não tem medo de perder o emprego; só tem medo de perder a vida...Ela chega de vez em quando, não fala muito, não cobra pra informar e se tornou muito conhecida Brasil afora. Ela é repórter internacional de guerra. Não porque quis. De repente, ela, que estudava em Gaza, se viu no meio de mísseis cruéis e passou a cobrir essa terra retaliada, distante, onde não se respeita a vida das crianças, a vida em hospitais, as vidas inocentes que não atacaram, mas são brutalmente atingidas.

Minha repórter predileta não tem qualquer identificação no campo de batalha; não usa capacete, não usa o colete com a marca “press” e não é avisada do perigo. Ela aparece pouco, mas é muito replicada; reclama da vida, diz que perdeu peso (são as angústias, são as noites indormidas!), mostra a destruição e diz da esperança de voltar. Ela está em Gaza, com outros brasileiros, esperando que a deixem passar para o Egito e ser acolhida pela nossa diplomacia. Ela é jovem, tem 18 anos, é bela, é doce e tem sonhos como qualquer menina de sua idade.

Minha repórter predileta é Shahed Al Banna, voz suave que ameniza o caos!