Imediatismo

Me disseram uma vez: O ser humano desaprendeu a esperar o tempo certo das coisas.

Vivemos na época do imediato, eu quero e quero agora, só isso importa.

Há pouquíssimo tempo, se analisarmos pelo prisma da sociedade em si, conhecíamos e presenciávamos o processo de construção, fabricação, cultivo de tudo o que consumíamos, assim sabíamos o custo e o tempo de cada coisa.

Hoje se quero uma roupa nova, vou na loja e escolho um modelo pronto, se quero uma comida diferente, que seja, pego o que quiser nas prateleiras do supermercado ou passo no drive-thru do meu restaurante preferido, se quero um encontro furtivo ou um relacionamento a longo prazo, entro em um aplicativo de encontros, se quero crescer nas mídias sociais compro seguidores e pago o que for para ter o que preciso.

Não percebemos que para a roupa nova ficar pronta teve que ter um processo de fabricação minucioso e que a roupa que simplesmente pegamos e saímos, antes de chegar na loja, precisou de um bom tempo e vários processos de confecção.

Não entendemos que a comida que escolhemos no mercado, não nasceu ali e para ali chegar precisou de muita gente e de muito tempo para ser cultivada e transportada.

Tentamos pular etapas no que se refere a conhecer pessoas, escolhemos alguém como se escolhêssemos um prato em um Ifood da vida, se der match, ótimo, meio caminho andado.

Não queremos mostrar o que sabemos fazer bem, queremos seguidores, quanto mais melhor, crescer e ser visto requer trabalho e persistência, queremos tanto viralizar que o conteúdo na verdade não importa e o processo nem se sabe ao certo como funciona.

Queremos tanto e queremos agora que não percebemos que esse querer nos impede de ver como as coisas são.

Queremos tanto e queremos agora que a oferta de um modelo novo e pronto da melhor roupa do mercado nos faz clicar, sem pensar, em comprar, ou escolhemos o restaurante que tiver mais curtidas e seja mais badalado até porque se alimentar não é na verdade a intenção, ou clicamos na foto do aplicativo de encontro tendo por base a pessoa mais atraente fisicamente, como numa esteira de comida, corremos atrás das promessas mais mirabolantes de como crescer rápido na internet e ganhar muito dinheiro com isso.

Assim, a roupa que compramos nunca chega da forma que pensamos, a comida do restaurante badalado além de ser horrível e caríssima, só vale mais uma foto para as redes sociais, a pessoa que conhecemos no aplicativo quase não a reconhecemos presencialmente de tanto filtro que a foto ganhou antes de ser publicada, pagamos para ter mais seguidores, likes, etc. e no fim das contas não conseguimos nada.

Queremos tanto e queremos agora que seguir o tramite real e correto das coisas não é opção, assim não percebemos o risco que corremos.

Só paramos para pensar, quando o que queremos não é entregue da forma que escolhemos, nesse momento culpamos o outro, fomos enganados, caímos em um golpe, como existe gente mal-intencionada nesse mundo.

Na verdade, o mal-intencionado desde o começo fomos nós que na nossa pressa de ter e ser, não ouvimos nossa própria consciência, se ganharmos algo em cima de alguém ou alguma coisa então, melhor ainda.

Culpamos o outro quando na verdade esse outro só existe porque nós o alimentamos com nosso imediatismo.

Não queremos esperar o tempo das coisas, queremos que as coisas aconteçam no nosso tempo, quem é o culpado por isso?

Quem decidiu comprar um bilhete premiado só pela ganancia de ganhar um dinheiro fácil?

Quem pagou para que alguém, que nem se conhece, agilize os procedimentos da aposentadoria, ou quitar uma dívida por dez por cento de seu valor real, ou não pagar os impostos corretos e ter ainda mais lucros?

Quem deu dinheiro para alguém que acabou de conhecer só para ter a oportunidade de estar ao lado de um Adônis da vida?

Quem tirou o pouco que tinha para conseguir crescer na vida do dia para noite?

Quem vendeu os próprios bens abaixo do preço de mercado, sem os documentos válidos só para ter dinheiro na mão?

Queremos tanto e queremos agora que pensamos que os espertos somos nós, uma oportunidade não pode ser desperdiçada, mas na verdade o esperto se dá muito mal na sua esperteza e ao perder se transforma na vítima de si mesmo.

“Cavalo dado não se olha os dentes. ” Cuidado se o cavalo está sendo dado tem algo de errado.

Cada dia que passa vamos entrando mais e mais no enredo do imediato, se o outro conseguiu eu também consigo, não é possível que fulano está se dando bem mesmo não tendo nada de bom a oferecer e eu aqui lutando para conseguir ser alguém na vida sem muita perspectiva.

Queremos tanto e queremos agora que nos deixamos levar pelo querer e não entendemos que algumas coisas podem demorar a acontecer, mas se soubermos ver o além do que nos é oferecido conseguiremos enxergar as armadilhas montadas para nos pegar no nosso desejo de escapar do tempo e da colheita que nunca foi plantada.

O imediato quase nunca trás o resultado que acreditamos e quanto mais rápido vier, mais rápido vai embora.

Quem é o culpado?