Segue teu destino

Parece que eu derreto. Só me agarro a um pensamento por vez e logo solto em desinteresse, como uma criança descobrindo um brinquedo novo, mais brilhante, mais barulhento, mais misterioso. Natal se desmancha em calor.

Vejo uma escada vermelha em espiral, acho engraçado. O engraçado de todos os prédios, todas as construções, todos os projetos arquitetônicos, é que sempre alguém escolheu que fossem assim. Uma escada pra lugar nenhum, interrompida no meio, mesmo ela, saiu primeiro da ideia de alguém.

Mas só é assim pra as coisas, as pessoas raramente sabem o que são antes de serem mesmo. A casa vai ter que ir se costurando enquanto cai, temos que dar sorte de aprender a lição.

Painho brinca, diz que não fosse ele, meu nome seria outra coisa muito mais diferente, incomum, desses nomes que você diz e a pessoa te olha interrogante, dizendo "Como é?" E você tem que ir lá repetir de novo o nome, as vezes até soletrar e a pessoa te olhar estranho, querendo rir.

Meu irmão mandou uma foto minha antiga. Em vermelho, se desenha um narizinho e expressões de coelho no meu rosto. Páscoa. Eu olho pra a câmera desconfiado, elipse, como se ainda não soubesse quem um dia seria. E de fato não sabia. Numa mesa de plástico, um copo semi-vazio com coca cola. Estou a cara do meu sobrinho de dois anos nessa foto. Pensar nisso me faz rir um pouco, de felicidade. Lembro dele.

Ando muito triste ultimamente, muito sozinho, quase miserável. Vi um anúncio muito bizarro hoje, até puxei a caneta e anotei o slogan o mais rápido que pude, na mão mesmo. "Você pronto para o amanhã"

era tipo de um seguro de vida, plano funerário, não lembro muito. Mas tinha um cara de terno, sorridente, uma paisagem verde atrás e esses dizeres:

Você pronto para o amanhã.

Eu estava tão...como diz o sertanejo, estava tão mufino na hora que até ri em desespero. Que amanhã?

Achei essa poesia de Ricardo Reis, vou seguir o conselho, vou seguir o destino, mesmo que não conheça ainda o que é.

Segue o teu destino

Rega as tuas plantas

Ama as tuas rosas

O resto é a sombra de árvores alheias

A realidade

Sempre é mais ou menos

Do que nós queremos

Só nós somos sempre iguais a nós próprios