Apátrida

Apátrida, pela ONU significa aquele que não possui nacionalidade reconhecida em nenhum pais, que pode ocorrer por discriminação contra minorias na legislação nacional, falha em reconhecer todos os residentes do país como cidadãos quando este país se torna independente (secessão de Estados) e por conflitos de leis entre países.

Sendo considerada um problema invisível, porque as pessoas apátridas muitas vezes permanecem invisíveis e desconhecidas. Elas podem não ser capazes de ir à escola, consultar um médico, conseguir um emprego, abrir uma conta bancária, comprar uma casa ou até se casar.

A apatridia é uma situação física, momentânea (mesmo que demore uma vida para ser resolvida), externa e compartilhada. Mas há uma apatridia que não é vista a olhos nus, não pode ser resolvida por mediação internacional, por vezes não pode ser ouvida por quem deveria.

Um ser humano pode fazer parte de um meio sem se sentir parte dele, um apátrida em seu próprio mundo, que não se vê inserido, acolhido no meio em que nasceu, viveu, morreu.

Mesmo que saia do seio da sociedade em que foi inserido, não encontrará lugar e quanto mais grite sua voz não é ouvida, e se é ouvida não o é por aqueles a quem sua vida valeria ser vivida.

Por eras e eras, séculos e séculos, os apátridas em seus mundos possuem perfis similares e sofrem as barbáries mais inomináveis que se pode imaginar. Com o passar dos tempos muita coisa muda, menos a discriminação o preconceito, a falta de empatia.

Desde os primórdios aqueles que não se encaixam no sistema político e social dominante são usados como bodes expiatórios para tornar as exceções uma confirmação da regra, exemplos para as futuras gerações.

Não importa a cor da pele, o status social, o gênero, todo aquele que não seguir os termos impostos não por si, mas pelo “todo” sofrerá as consequências. E isso não vem de longe, vem de dentro, vem do meio, vem de cima!

O pior dos piores sentimentos que se pode ter é o de não se sentir parte de nada, é olhar para o lado e não ver ninguém em quem se espelhar pois os que deveriam ser seu espelho refletem uma verdade que não é a sua verdade, não refletem sequer a verdade que eles mesmos pregam, não dá para entender e é assim mesmo, ficamos sem entender, sem entender como viver nesse meio, como sobreviver nesse medo.

Há aqueles que ainda tentam te fazer se sentir parte do meio, te dizem que não importa como seja, como viva, é bem-vindo, é amado, te fazem se sentir, momentaneamente, inteiro, completo, mas essas mesmas pessoas, por suas atitudes, falas, expressões no que se refere a outros, que são exatamente como você, te faz se perguntar o que está fazendo ali, como podem te aceitar e não aceitar um igual a você? Te fazem se perguntar qual a verdade por trás de tudo aquilo.

Como dizem: “Amamos o ser, não o pecado. ” Se amam o ser, amem todos os seres, independente do pecado, apesar dele, não dá para amar, respeitar, acolher um e debochar, relegar, criticar, intimidar outro igual.

As falácias usadas para justificar esse posicionamento são injustificadas.

Vendo o quadro político atual, diante de tantos questionamentos de como pode, nos dias de hoje, que pessoas com uma dialética radical, cristãos fervorosos, fiéis defensores da família e dos bons costumes, do armamento da população, que para validarem seus argumentos inócuos utilizam as mesmas estratégias de marketing utilizada pelo nazismo, ganhem força e ganhem voz.

Eu respondo: se eles ganham voz é porque há ouvidos para ouvi-los e se há ouvidos eles ganham voz por retratarem a verdade que esses ouvidos querem ouvir, a validação de seus argumentos que há muito estavam enfraquecidos ou apenas adormecidos.

Reflete a verdade de um pai/mãe que diz amar incondicionalmente o filho gay, mas não tolera a homossexualidade.

O irmão/irmã (seja da igreja ou de sangue) que se diz empático com a forma de viver do outro, mas em seus quartos esbravejam que estes irão para o inferno e se benzem para que não sejam corrompidos pelo mesmo destino.

O amigo/amiga que bate no seu ombro e pede paciência em um momento de irritação, mas no trânsito esbraveja para todos os santos que se tivesse uma arma a descarregaria no sujeito que o fechou.

O marido/mulher que são contra a violência, mas espancam seus parceiros em nome da família e dos bons costumes, que traem, mentem às escondidas, mas são um exemplo de bom menino/a.

Do/a namorado/a que cospe santidade e se diz adepto das regras sociais, mas frequenta saunas e boates gays para satisfazer seus inconfessos desejos.

Todos aqueles que por vergonha, medo do que vão pensar, por querer fazer parte de algo que nem sabem o que é, se escondem atrás de seus próprios argumentos, deixam de viver o que está dentro de si, para morrerem lentamente em vida com a esperança de ganhar os reinos dos céus.

As mesmas pessoas que me dizem que vou para o inferno ao final de minha vida.

As mesmas pessoas que crucificaram cristo para manter a forma social que conheciam e pensavam ser verdadeiras.

As mesmas pessoas que colocaram Hitler e seus asseclas no poder por estes defenderem as mesmas ideologias que eles, que deram voz ao que eles queriam ouvir.

Essas mesmas pessoas que querem que os que não pensam como eles sejam sim relegados da sociedade, que se incomodam tanto com o modo de vida do outro que temem serem afetados por ele (quanta confiança em seus argumentos) essas mesmas pessoas que covardes em si, precisam que outros digam o que eles não são homens ou mulheres para dizerem na nossa cara.

Essas pessoas são as mesmas que dizem que você está distante e que se vitimiza por tudo, que sempre te acolheram e estiveram a seu lado, que não há razão para se revoltar.

Não sei você, mas eu não sei viver assim, não sei me esconder e esconder o que sinto para ser aceito, não sei fingir que está tudo bem quando o caos está instalado em meu peito, não me reconheço nessa pátria amada e idolatrada que se dependesse dela eu estaria internada em um manicômio por ser doente mental, apenas por não ser igual.

A minha apatridia não se soluciona com mudanças de ares, até porque não importa onde eu esteja, estarei respirando o mesmo oxigênio.

A única coisa que eu tenho a dizer para essas pessoas é que se esse é o mundo onde a voz delas se sobressai e que ao final de minha vida eu vou para o inferno, eu não vejo a hora de chegar esse momento, pois só de saber que vou para um lugar onde elas não estejam e onde essa voz não tenha voz, para mim será o paraíso.

Quem sabe nesse momento eu me encontre, me repatrie, me sinta aceita e em paz.