ELOGIO DOS OLHOS

 

            Com este título Paulo Gustavo Galvão, nosso confrade de saudosa memória, editou um livro no ano de 1989. Paulo Galvão, como assim era mais conhecido, era membro da Academia de Letras de Campina Grande, tendo sido empossado na Cadeira n° 35, cujo Patrono é Silvino Olavo da Costa, sucedendo ao confrade Ivan Sodré e sendo sucedido pelo confrade Hasenclever Ferreira Costa (Rau).

            Paulo Galvão era professor universitário, oftalmologista e membro da Academia Mineira de Medicina, onde ocupava a Cadeira n° 97, cujo Patrono é José dos Reis Cotta e primeiro titular Alexandre Fonseca Filho. Em seu discurso de posse ele afirmou que “o médico tem por função curar, aliviar e consolar”, relembrando o que Hipócrates já havia ensinado. Era membro da Academia Paraibana de Letras, ocupando a Cadeira n° 15.

            O Elogio dos Olhos traz uma coletânea de trabalhos científicos, artísticos, culturais e literários. Culto, humanista, o autor associa a ciência à espiritualidade, a veia poética à filosofia, a abnegação pelo trabalho médico. Os olhos foram a sua vida, defendendo a retirada de córneas de cadáveres para prolongar a vida, com respaldo na ciência, no direito e na religião.

Ao estudar a obra de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738 – 1814) na Igreja do Bom Jesus do Matosinhos, em Congonhas do Campo, mais especificamente os Passos da Paixão de Jesus Cristo, Paulo Galvão destaca o estrabismo e o hipertelorismo ou aumento da distância entre as órbitas, bem como deformidades nas estátuas que esculpiu, tendo isso como “produto de um gênio arrebatado e impulsivo, a serviço de um talento invulgar”.

            Sua visão artística ao falar dos olhos se expressa na forma como esses traduzem um sentimento. Diz ele: “os olhos, rebolindo nas órbitas, são pantomímicos e tradutores. Por vezes divergem para espiritualizar, ou proeminam, exoftálmicos e dilatados, para agredir e atacar”.

              Em simpósio realizado pela Fundação Hilton Rocha, em Minas Gerais, ele disse: “Os olhos – espelhos da alma – são como fronteiras onde se cruzam os caminhos de múltiplos sentidos do verbo ver. A Oftalmologia, ao encará-los como objeto científico, quer vê-los também como espelho, para usufruir do privilégio de mais intimamente familiarizar-se com a essencialidade humana. Mesmo apagados pela cegueira, desprovidos de luz, os olhos são esse espelho e esses caminhos”.

            Ao dirigir-se aos seus paraninfados de uma turma de medicina ele afirmou: “Reconhecemos doentes a Medicina e o médico. A Medicina, amoldando-se às imposições casuísticas que lhe são estranhas; o médico, ausentando-se do seu magma ético”. Ressalta que o “o exercício profissional tem base triangular: trabalho, estudo, amor”. E posiciona-se no que respeita a diagnóstico, tratamento e cura de doenças, pela Medicina Oficial, combatendo qualquer outra modalidade do que seria uma Medicina Popular.

              Os acordes líricos trazidos no livro dão uma amostra da dimensão poética de Paulo Galvão. Vejamos: “Sendo homem de palavra/ Como é nossa tradição/ Só diga sim pra fazer/ Pra não fazer diga não”. Outra redondilha: “O amor nasce do peito/ Eis a minha explanação./ São chamas abrasadoras/  Que surgem do coração./ Perdemos o bom sentido/ Forçados pela paixão”.

             Recebendo a cidadania pessoense, Paulo Galvão falou que na versão mais corrente Paraíba significa “rio ruim”. Todavia, a versão do tupinólogo Affonso de Freitas indica que Paraíba significa “rio que deságua  no mar”, versão que desposa, porque agrada e afaga o coração. E então verseja: “Quando meu coração parar/ enterre-o na beira do mar./ A cabeça, não./ Esta nunca soube de si./ As mãos, não./ As mãos em par,/ como asas do pássaro/ voarão”.

              Campinense de nascimento, recebeu o título de cidadania mineira tendo ao final do seu discurso assim versejado: “Tudo passa./ O coração? Não é transitório./ O coração não sangra/ não se infarta/ não se extingue/ não se inflama./ Tudo passa/ mas o coração não é transitório./ O coração chama”.

                Paulo Galvão se foi no dia 8 de dezembro de 2015. Nas páginas do extinto Jornal da Paraíba, numa edição de fevereiro de 2016 publiquei a crônica de homenagem a esse acadêmico e médico campinense mencionando Elogio dos Olhos e O Mar de Mármara, este seu livro de poesias.

Ailton Elisiario
Enviado por Ailton Elisiario em 26/01/2024
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