O desejo do Léo

— Boa noite, vou para o meu quarto.

— Léo, são sete da noite, fica aqui comigo, o que fará sozinho?

— Ué, o de sempre, mãe: vou escutar o meu funk.

— Não vai. Você está proibido de ouvir essas músicas.

— Por quê? Todo mundo ouve.

— É recheada de palavrões e letras indecentes, coisas que ainda não entende.

— O que eu não entendo?

— As letras sexualizadas, vulgares. É muito novinho.

— Mas tenho 12 anos.

— Como disse, um pré-adolescente, sem malícia.

— Mãe, malícia? Quem fala assim? Saiba que eu já vi mulher pelada e pessoas transando. Sei de muita coisa.

— E onde você viu isso, menino?

— Na internet, lá aprendemos coisas que vocês velhos nunca saberão.

— Saberão o quê?

— Saberão!

— Mas o quê? Dê um exemplo?

— É, É, um exemplo, exemplo. Ah, sabia que mulheres chegam a gritar fazendo sexo?

— Esta é a sua sabedoria?

— E você, sabia disso? Duvido. Mãe não sabe dessas coisas. Todas são velhas.

— Sou velha, mas mulher.

— Não vai me dizer que é a mulher que grita? Oh, meu Deus, não.

— Leo, a conversa é que você não vai mais ouvir funk e pronto.

— Mas todo mundo ouve, só eu que não.

— Você não é todo mundo.

— Vou ouvir, sim, o ouvido é meu e você não manda nele.

— A casa é minha, você está na minha casa, quando tiver dezoito anos, pagar as suas contas e tiver a sua, pode fazer o que quiser.

— O Paulo, a Sheila, a Isadora, o Pedro, a mãe deles não liga para o funk.

— Eu não sou a mãe deles, sou a sua e você não vai ouvir.

— Vou sim.

— Não me responda. E não vai.

— Vou.

— Quer ficar de castigo?

— Ditadora. Quer acabar com a minha liberdade, de ouvir ou não ouvir. Isso é crime.

— Onde está escrita essa lei, de ouvir e não ouvir?

— Na polícia.

— A polícia não faz lei, Léo. Ela cumpre. E cala boca, já passou dos limites da malcriação.

— Cala boca já morreu, quem manda na minha boca sou eu.

— Está de castigo. Me dá o celular.

— Não dou.

— ME DÁ O CE-LU-LAR A-GO-RÁ!

— Não.

— Está de castigo, cortarei a internet do seu quarto, não vai na festa da Sheila, sem televisão e nem escolinha de futebol terá. Feliz agora?

— Por quê! Eu não fiz nada, só quero escutar uma música que gosto e você acaba com a minha vida. A festa da Sheila vai todo mundo da minha classe.

— Quem mandou ser respondão? Se acha o “Bonzão”, desrespeitando a sua mãe, quem você pensa que é?

— Buáááááá;

— Trabalho o dia inteiro para dar o melhor para você e quando paro, ansiosa para ficar contigo, o que faz? Quer subir para escutar uma música horrível. Pode subir, cortarei tudo.

— Mãe?

— O que é?

— Desculpa, não queria fazer isso. Me desculpa?

— Desculpo, meu filho. Sua mãe te ama, eu só quero o melhor para você. Fica aqui comigo, faço pipoca e a gente assiste um filme juntos. O que você acha?

— Tá bom, posso escolher o filme?

— Olha o que vai escolher, hein?

— A Senhora vai gostar.

— Segura a pipoca para mamãe, vou pegar o suco.

— Mãe?

— O que é meu amor?

— Posso ir ouvir funk?