Fim de Uma Era

Mais uma era se foi e aqui estamos no alto da mesma montanha

Uma noite entre cigarros e taças, um sonho de verão esquecido na eternidade de um momento

A lua que banhava nossas noites de delírio agora chora o momento fatal da partida

A inocência se foi, mas algo ainda lampeja nesses corações naufragados e aflitos

Folhas em branco lançadas num oceano de imensidões e incertezas

O tempo parece uma orquídea agonizante que resiste ao temporal da vida

Mesmo assim somos jovens ainda, senão na carne, pelo menos nesse coração que insiste em pulsar sem razão

Ainda lembro daquelas tardes ensolaradas, o crepúsculo no horizonte e um sorriso amigo contra o céu azul

Um final de tarde qualquer, uma conversa qualquer e apenas as árvores e a mansidão da relva como testemunhas de nosso feliz abandono

De nosso triste descontentamento e de nossa incompreensível sede de viver

Éramos eternos na nossa lamentável finitude

Quantas noites ficamos ali deitados na pedra fria e acolhedora!

Sob um céu escuro e pontilhado de estrelas que pareciam ser as únicas a compartilhar a nossa solidão e a ouvir nossas canções

Encontrávamos alguns companheiros na estrada, que íam e vinham como pobres sombras errantes, e que bebiam do nosso vinho e dançavam a nossa música, ignorados e alheiros ao mundo atrás de nós

O tempo passou e hoje uma relva escura e rasteira tomou conta do que antes era o nosso refúgio

Dizem que no silêncio do final da tarde, bem na hora do crepúsculo, se ouve ainda risadas ao longe e um murmúrio vago de vozes jovens e alegres lá no fundo da velha clareira.

Ecos do passado que o vento trás e leva embora como um sonho que se esquece ao acordar

Além da lagoa transparente, que já não existe mais, ainda resta umas garrafas vazias e um verso triste que ficou para trás, marcado na pedra dura e fria onde costumávamos sentar para descansar e sonhar

Versos que a chuva apagou e palavras que o temporal da vida sepultou no silêncio do esquecimento

Mas uma discreta canção ainda persiste levada pelo vento,

a noite cai e as estrelas cantam no infinito, numa linguagem misteriosa, mas inteligível no silêncio de nossos corações

Tínhamos tudo, embora nada soubéssemos sobre nós mesmos

Éramos crianças chorando para o eclipse de uma vida que estávamos deixando para trás

É estranho olhar para si mesmo no passado

É como rever uma fotografia em preto e branco e não se reconhecer naquela imobilidade morta e muda

Chega um momento em que não sabemos mais quem somos e nos perdemos nessa estranha singularidade que é a vida

Os caminhos se desencontram e cada um persegue sua solidão sem olhar para trás

Sem desejar nada mais que uma fonte de água fresca e uma sombra para descansar no final dessa longa jornada...

(Dedico este texto aos meus queridos amigos, irmãos que a biologia não me deu, mas que a vida e o acaso colocou no meu caminho, Michael Waslley e Alanderson Joseph.)

Janielson Alves
Enviado por Janielson Alves em 18/02/2024
Reeditado em 18/02/2024
Código do texto: T8001403
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