Ser forte pra que?

Amo música e as letras são a parte que mais me interessa (professora de português viciada em interpretação de textos). Reflito sobre o que dizem, o que se aplica à vida, relaciono conteúdos, lembro-me de pessoas ou de outras histórias (e lá vem o meu conhecimento de mundo interferindo na minha leitura), enfim leio e penso.

Tenho reparado que, não é de hoje, há uma infinidade de letras que falam sobre ser forte, dura, firme, não se permitir cair. Algumas me chamam mais atenção pois falam em ser guerreira com armadura impenetrável, ser feita de titânio, ter coração de elástico... e assim vai. Fazem convites ao "ataque inimigo" alegando não serem mais derrubadas de jeito nenhum...

É fato que algumas dessas canções trazem por trás histórias dramáticas de vida que dirigiram os compositores a esse estado de busca por escudos impenetráveis, mas é fato também que, até bem pouco tempo, isso era só o que eu queria: ser forte o suficiente para não permitir que nada, nem ninguém, fosse capaz de me derrubar, de me ferir... E assim fui nessa busca por ser a pessoa mais dura e firme que eu pudesse.

No entanto, aos poucos, venho me perguntado se é realmente esse o caminho. Será que preciso realmente viver como um boxeador num ringue, com minha guarda erguida para não receber nenhum golpe? Será que a melhor forma de viver é erguer um forte em torno de nós mesmos para não permitir que o inimigo nos atinja de jeito nenhum?

A vida tem me levado a pensar que não... A guarda alta ou a muralha da China ao meu redor não são solução...Elas não me protegem da queda.

Será que o nosso foco não deveria ser aprender a lidar com os tombos? Aprender a levantar e não a evitar a queda?

Sabe por quê? Porque na ânsia de evitar os tombos vamos nos tornando frios, excessivamente racionais e racionalizar sentimentos (experiência própria) é a pior coisa que podemos fazer, aos poucos você vai perdendo a sensibilidade externa e se torna inábil para demonstrar o que sente e qualquer tentativa de fazê-lo é sempre algo estranho e atrapalhado (para não dizer desastroso e cômico).

E no fim de nada adianta, O sofrimento, a dor, a mágoa são como fantasmas capazes de atravessar qualquer obstáculo - paredes, armaduras, peles grossas... - e quando te acertam, te derrubam mais forte do que nunca porque os seus muros te deixaram sozinho escondido atrás deles... Você não tem pra onde fugir.

Hoje penso que mais forte é aquele que soube aprender a cair, aquele que não permitiu que os erros dos outros transformassem seu coração em pedra, em gelo. Não se ganha luta nenhuma na defensiva e para "atacar" a vida é preciso baixar a guarda. Demonstrar fragilidade, vontades, desejos, não é sinal de fraqueza.

Já ouvi muitas vezes pessoas me dizerem que admiram minha força, dureza, praticidade. O que me vem à cabeça? "Parabéns! Escudos ativados com sucesso."

Pensei na Elsa (Isso mesmo! "Let it go! Let it go"). Sabe o lance do "encobrir, não sentir, nunca saberão"? Agimos da mesma forma, vamos numa corrida para proteger nosso eu do mundo. E o que acontece? Nossos bloqueios vão nos dirigindo a um "reino de isolamento" - e eu não quero ser a Rainha.

Mas o que fazer então? Como viver entre tantos espinhos sem ser o trouxa por excelência (ainda que nesse caso o erro esteja em quem te faz de trouxa e não em você) ou sem ser o coração de pedra, o insensível? Como "endurecer sem perder a ternura"?

Achar o equilíbrio não é simples - juro que estou procurando, até o momento sem sucesso - mas deve ser a meta. Aprender a cair.

Quem me conhece de fato, de forma bem próxima e com olhos de ver - lembrei de uma amiga com a qual converso sem dizer uma palavra, basta eu olhar pra ela e ela já diz "qual é a treta?"... Enfim, quem me conhece com todas as letras sabe o que os meus maravilhosos escudos são capazes de fazer (em alguns momentos pra me proteger sou tão delicada e gentil quanto um javali selvagem numa lojinha de cristais, tipo Shrek), sabe que dureza, firmeza não são qualidades que possam ser atribuídas com tanta propriedade a minha pessoa, sabe o quanto de menina boba e sonhadora ainda vive em mim escondido atrás dos meus muros. Quantos problemas o excesso de proteção e a habilidade incrível de me entrincheirar no primeiro obstáculo, esperando atentamente o inimigo e seu golpe por trás, já me causaram...

Então não! Não desejemos mais sermos ícones de força, rigidez, dureza! Desejemos ser a sabedoria de dar a volta por cima. Tenhamos portas abertas e o coração mais ainda. Queiramos ser a sensibilidade e doçura. Busquemos aprender a cair e levantar sem medo de cair novamente.

Um coração excessivamente protegido é um coração vazio!

Josiane Vieira
Enviado por Josiane Vieira em 22/03/2024
Código do texto: T8025433
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