Meu amigo João

Andando pela calçada de um prédio abandonado, deparei com um amigo, que me surpreendeu por está ali, sob as vestes do alpendre deitado no chão a se proteger do sol. O que incomodado, ousei perguntar:

- O que fazes ai ?

Ele, em trajes degradantes, assentado no chão, que lhes parecia conhecido, apenas rio.

Ao redor isopor e fiapos de roupa, garrafas plásticas de bebida alcoólica, carteiras vazias de cigarro barato, um par de sapatos incrustecido de sujeira, com papelões e poeira faziam a sua companhia.

Compadecido tornei a perguntar:

- Meu amigo o que fazes ai?

Sem muita saida, sem conseguir se por de pé, pois acredite, ainda estava sob efeito do álcool. Ergueu-se buscando apoio das paredes e num equilíbrio tremulo verbou qualquer coisa, que a priori não deu pra entender.

Segundo depois, eu ainda parado diante dele como um soldado da ditadura, ouvi ele dizer:

- Meu Amigo Vilela, tô morando aqui.

Tomado de aflição interroguei:

- Como assim?... Você tinha uma casa. E a sua família?... E o seu emprego?

Sob o firmamento da inconsciência ele leiloou um momento de seriedade com lágrimas, como se a pane da bebida pausasse ali mesmo. Em seguida, se escorando em mim falou como confessando:

- Meu amigo Vilela, eu conheci o Martini, que me apresentou Skol, que me apresentou

a buchudinha.

Atônito, sem entender direito, me atrevi a perguntar ainda:

- E o cigarro?.. Tu nem fumavas, como é isso?

Calado me olhando com os olhos vermelhos e marejados, sob a sombra da marquise ele falou:

- Foram as camaradagens, que me permitiram fazer tanto em pouco tempo. Meu amigo acho que acabei comigo.

Nem precisei perguntar mais pela sua casa e família, o estado de miséria daquele ambiente tornava nítido a enfermidade.

Todavia, ele era meu amigo, por isso insistir e propus ajuda dizendo:

- João vem comigo e vamos a casa de um amigo meu, que conhece hospitais pra te tirar dessa situação.

Como, quando o encontrei, ele ironicamente consigo e comigo, apenas rio. Fez um gesto de negativa, que eu não aceitei.

E tornei a falar:

- ei João, se eu não te ajudar você morrerá aqui. Vem comigo, que eu prometo, que tudo vai mudar.

Ele me olhou, como a se despedir e disse:

- Vai em paz amigo. Volte depois com o seu amigo, que eu vou esperar.

Confiante e alegre, agradecido a Deus pelos argumentos da hora, fui em busca de ajuda.

Quando cheguei e contei para o meu amigo médico, ele sentiu a boa nova e nós fomos com uma equipe ao local.

Lá chegando, sob um deserto da rua a noite veio nos encontrar, dizendo qualquer coisa com a voz da lua , que repousava intensa no seu imenso clarear. A iluminar todas as portas e janelas abandonadas daquele prédio, que assemelhava-se a um rio sem mar.

Procuramos em cada canto, conversamos e perguntamos, pra quem passava, mas ele não estava mais lá.

Decepcionado e me sentindo entristecido, meu amigo me confortava.

Voltamos pra nossas casas e várias vezes, eu e o meu amigo passamos por lá. No entanto, nunca mais ele foi visto. Era com se a terra tivesse tragado.

Procurei a casa da família dele, até encontrar. Mas eles também nada sabiam.

Depois de algum tempo, assentado no chão de minha casa, com os olhos em lágrimas fiquei a me perguntar se tudo aquilo aconteceu. E se aconteceu, ficou a pergunta num imenso vazio:

- Por que ele ao invés de viver, preferiu morrer?

Esbravejei ao mesmo que perguntei:

- Ah esse maldito vício. O que devemos fazer, pra não incorrer na insanidade dos prazeres da carne?