Houve mudanças e não foram boas

Creio que era 1987, eu acho que tinha uns 11 anos. Lembro que morava eu, minha mãe, minha avó e uma das minhas tias. A gente residia em uma rua bem legal, tranquila, chamada Catucicaba, fica no bairro Nossa Senhora da Conceição, aqui na cidade de Itabuna.

Às vezes, nas tardes de sábado, uns meninos jogavam bola e claro que a casa que estivesse com as portas abertas, com certeza a bola seria uma visitante indesejada. Aquelas crianças eram uns "pernas de pau" e não sabiam chutar nada direito.

Algumas vezes a bola entrava dentro de casa, minha avó, tranquilamente, pegava-a e jogava-a para os "craques" festivos.

Eu, como não gostava de jogar bola, ficava em casa mesmo, desenhando ou assistindo TV.

Certa vez, minha tia, que era muito nervosa com tudo e com todos, raramente, era uma mulher pacífica. Estava sentada no sofá perto da porta costurando. E lembro que minha avó, sentara-se perto dela numa poltrona ao lado. Era uma tarde de sábado com um céu bem azul, porém, uma tarde fresca nos idílios anos oitenta, que não era para os fracos, mas era um tempo de uma certa respeitabilidade e elegância em muitas ações humanas, eu lembro disso, eu vivi isso.

A gente, quando criança, aprendia a respeitar a todos. O olhar firme de nossas mães, avós e tias, quando fazíamos uma malcriação, era de doer a alma.

E nesse sábado, os meninos estavam jogando sua "pelada" na rua e de repente a bola adentrou em casa e bateu nas pernas de minha tia. Ela jogou a costura em cima do sofá, pegou a bola, entrou para dentro de casa, na cozinha tirou da gaveta do armário uma peixeira e rasgou a bola em mil pedaços. E jogou no meio da rua. Nada disse, apenas fez uma cara de " toma moleques, e vê se vão jogar bola agora nos infernos". Claro que ela não disse isso, mas tenho a convicção de que pensou.

O que aconteceu, então?

Os meninos pegaram o resto da falecida bola, cada um foi para a sua casa e nunca mais houve de se jogar bola na rua, principalmente em frente da minha casa.

E penso, hoje, em que eu estando com meus 48 anos, se acaso acontecesse isso comigo. Realmente, eu pensaria mil vezes antes de destroçar a bola, porque creio que ou um deles iria pegar uma faca, uma arma de fogo, uma pedra e com certeza me atingir e nos piores das hipóteses eu seria assassinado ou pelo pai, ou pela mãe, ou pelo irmão ou pelos garotos que parecem estarem em sua essência com o mal sempre encarnado no corpo.

Houve bastantes mudanças em nossas vidas, em nosso modo de pensar e de viver, mesmo. E não foi mudanças boas.

Luciano Cordier Hirs
Enviado por Luciano Cordier Hirs em 03/04/2024
Reeditado em 03/04/2024
Código do texto: T8033819
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