A Redenção Da Academia Brasileira De Letras

Eric do Vale

As posses de Ailton Krenack e Conceição Evaristo na Academia Brasileira de Letras nos leva a crer que isso é um resultado da mudança de tempos. Provavelmente, uma evolução na sociedade, por que não?

Cultivar a língua portuguesa e, especialmente, a literatura brasileira são os objetivos dessa instituição, no momento em que foi fundada, em 1897, por uma plêiade de literários e intelectuais como Machadxo de Assis, Olavo Bilac, Joaquim Nabuco, Ruy Barbosa e dentre outros.

Os quarenta membros, conhecidos como "imortais", que compõem essa instituição são escolhidos mediante voto secreto, na condição de que tenham escrito alguma obra de valor literário. Contudo não é o que se vê na prática: a grande maioria desses imortais além de apresentarem um viés político, jamais escreveram uma virgula sequer para ser considerada uma "obra literária".

Essa mesma instituição que, com tanta frequência, costuma eleger figuras que, sob hipótese alguma, escreveram nada que pudesse ser considerada uma obra de valor literário é a mesma que, por três ocasiões, optou por não escolher Mario Quintana como Imortal. Fardo esse que a ABL terá de carregar, durante a eternidade.

Tal peso, diga-se de passagem, também se estende a Monteiro Lobato, Lima Barreto e outros literatos que foram recusados pela Academia Brasileira de Letras. No entanto, essa mesma instituição conquistou a proeza de quebrar certos paradigmas, como, por exemplo, eleger Rachel de Queiroz a primeira mulher "Imortal".Desde então, uma cadeira da Academia Brasileira de Letras passou a contar com alguém do sexo oposto.

O paradoxo predominante na ABL remete a trajetória do nosso país, onde, na concepção de Machado de Assis, vive-se o Brasil oficial e o real, predominando, é claro, o primeiro. E por falar em Machado de Assis: é preciso lembrar que além de ter sido um dos fundadores da instituição, ele também foi o seu primeiro presidente. Sendo assim, quem, naquela época, imaginaria alguém feito ele, um mulato e de origem humilde, ocupando uma posição dessa?

Essa indagação adquire mais ênfase no momento presente, quando a Casa Machado de Assis, como também é conhecida a ABL, elegeu e empossou um índio e uma mulher negra como membros dessa instituição.

Tal feito é, sem sombra de dúvida, um reflexo do que estamos vivendo, na contemporaneidade: assumir a nossa essência, buscando viver um Brasil real, apesar de ainda existirem resquícios desse "Brasil oficial".