CRACOLÂNDIA

 

     No ano de 1989, a pedra do crack já rolava solta nas mãos de alguns garotos na Praça da Sé aqui em São Paulo, eu desconfiava da presença dela pelos cachimbos descartados nas calçadas, a polícia pouco podia fazer, pois se mantinha algemada no Estatuto da Criança e do Adolescente, e os menores delinquentes continuavam intocáveis, roubando e consumindo drogas a céu aberto.

     Durante o ano de 1990, transitei várias vezes a negócios na região da Luz, passando ao lado da estação de trem que leva o mesmo nome, e sempre me deparava com aquela aglomeração de oito a dez usuários de drogas, reunidos em círculos. Não eram agressivos, mas por precaução eu mantinha certa distância. Sem saber, eu presenciei a formação dos primeiros núcleos da Cracolândia aqui na capital de São Paulo.

     Num passe de mágica, a Cracolândia foi se instalando nas imediações das Avenidas Duque de Caxias, Ipiranga, Rio Branco, na Praça Princesa Isabel, na esquina da Rua Helvétia com a Alameda Cleveland, havia até a Praça do Cachimbo, assim denominada por ser um dos locais de permanência dos usuários do crack.

     De lá pra cá, trinta e cinco anos depois, já passaram nove prefeitos. Todos eles usaram a Cracolândia como palanque eleitoral. Luiza Erundina, essa escancarou as portas da capital para a entrada do crack, depois vieram: Paulo Maluf, Celso Pitta, Marta Suplicy, José Serra, Gilberto Kassab, Fernando Haddad, João Dória, Bruno Covas. Todo eles se elegeram prometendo acabar com a Cracolândia em seis meses de gestão. E, por último, o prefeito atual, Ricardo Nunes, que também vem prometendo solucionar o problema, mas até agora nada resolveu.

     Não precisa ser inteligente para concluir que a Cracolândia é um bom negócio para os políticos da situação, da oposição e para a imprensa de plantão, gerando milhões de votos e altos índices de audiência em cima dessa tragédia anunciada. Enquanto isso, moradores e comerciantes vêm pagando um alto preço pela bancarrota do comércio, desvalorização dos imóveis e o aumento da criminalidade na região, e a polícia se mantém atada diante dos trâmites burocráticos e das exigências dos direitos humanos, desempenhando, apenas, o papel de babá de luxo dos dependentes químicos que povoam a Cracolândia. Como a droga entra, ninguém sabe, como o dinheiro da venda sai e para onde vai, também ninguém sabe. Manter o viciado no gueto imundo das drogas é um excelente negócio para os governantes, não investem um centavo. A quem interessa em manter essa Zumbilândia confinada? Ninguém sabe. Existe vontade real, ou uma data determinada para acabar com a Cracolândia? Nem Deus sabe.

 

Autor Benedito Morais de Carvalho (Benê)