“O DENTE DE DANTE CAIU, MÃE”

Por que ficamos alegres quando perdemos o primeiro dente?

Por que não nos envergonhamos de mostrar (para algumas pessoas, em especial) a fenda do ligar daquele que mordeu tantos alimentos conosco, até àquele momento?

Estava sentada a ler um texto revisado recentemente, quando minha filha telefonou. A cara do meu neto sorridente, com uma falha no sorriso bem grande na tela da chamada e minha filha a contar: “ mãe, o dente de Dante caiu”!

Comecei a sorrir e Dante também e minha filha igualmente. Minha filha ao mesmo tempo que sorria, contava como sucedeu. Em seguida, meu neto também narrou o especial acontecimento; a dizer que não sentiu dor, apenas uma pequena pontadinha.

Eu e Flora contamos para ele, como foi com a queda do primeiro dente de sua mãe, e como foi que uma vez fizemos igualzinho ao que ele e ela fizeram, para auxiliar seu dente a deixar o espaço, já que estava molenga e não decidia ausentar-se.

Dante alegremente a dizer que pensava que doía mais, mas que agora já não vai ficar inseguro; ao mesmo tempo que minha filha lembrou os três colegas que recentemente chegaram à escola mostrando seus dentes faltantes, como costumamos nomear: a janelinha.

Perder o primeiro dente é um acontecimento e tanto. Na minha meninice, a gente jogava no telhado a dizer: “ratinho ratão, leva esse dente fraco e traz um fortão”. Os dizeres variavam segundo o que a mãe da gente indicava para mantralizar. A gente muito orgulhoso, igual ao meu neto, supondo que aquilo era um marco especial. Uma espécie de mudança importante, uma fronteira de algum lugar, para outro.

Fato é que não tínhamos vergonha de mostrar a janelinha, na escola. Parece que esse ritual permanece parecido, hoje em dia. Na sala de aula, também verifico que é assim que se faz aqui. Meninos e meninas com idade de 6 anos, começam a chegar com suas janelas à mostra, de maneira geral sorridentes.

Na idade adulta devia ser assim também. Não sei em que idade isso começa a ser problema. Infelizmente. Porque sabemos que dentes dão problema com a passagem da idade, sabemos que muitos de nós usamos dentes comprados, não mais os gratuitos da Fábrica Divina. Adultos… gente estúpida não é?

A gente aprende a não confiar. Acho que é um pouco isso. Claro, o outro dente quando somos crianças, vai nascer, o dente fixo. Mas não é assim quando o dente do adulto cai? A gente sabe que uma hora vai dar para comprar um, quer seja o modelo antigo ou o mais atual. A gente dá um jeito.

A gente aprende também que vai ser ridicularizado. Mas o que tem demais saberem que estou sem dentes? Quem está sofrendo para arrancar nacos sou eu…

É que a gente se torna preconceituoso. Um bando de gente idiotizada e preconceituosa, que dá valor à estética em detrimento da alegria, da leveza, do riso do outro (ou mesmo nosso, quando somos nós a nos esconder).

Dante falou os nomes dos colegas que estavam de janelinha, minha filha expôs que vai perguntar se pode tirar uma foto para marcar a história dos três, nesse momento especial. Eu disse que poderia nomear a fotografia de “a turma da janela”: sorrimos, nós três. Nesse momento o avô Rafael (meu marido muito amigo), chegou do trabalho e Dante mostrou-lhe, também, sua inédita janela. Rafael e eu, minha filha e nosso neto, sorrimos juntos. Dentes antigos e dentes jovens, saudando esse marco, uma maneira de identificar que sorrir é para dentes que vão e dentes que ficam.

Solineide Maria

Para meu amado neto Dante.

Para minha filha, uma mãe muito dedicada, amorosa, professora de música pessoal etc de seu filho Dante.

Luanda, 11 de Abril de 2024

Solineide Maria
Enviado por Solineide Maria em 12/04/2024
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