O piolho perdido

Quem achar que já viu ou já ouviu de tudo, com certeza nunca foi professora da educação básica. Entre as quatro paredes de uma escola acontecem coisas que me deixam com uma pulga atrás da orelha. Mas o que mais contribuiu para os cabelos embranquecerem precocemente e permanecerem de pé, foram as contribuições maternas, das amigas da escola.

Esse fato ocorreu numa escola chamada Rede Pedagógica, na qual eu sou professora de literatura, e juro de pés juntos, sou vítima. Estou aqui só para defender a integridade moral e capilar da minha filhinha. Vocês acreditam que minha linda boneca Valentine apareceu com um piolho? Gente!!! Piolho, aquele bichinho nojento corredor, querendo fazer da cabeça da minha Valentine uma trilha para seus amiguinhos passarem.

Educadora que sou, sempre a ensinei a não levar para casa nada dos outros. Quando avistei o danado, peguei uma lupa para ter certeza se era dela ou um piolho intruso. Como mãe, conheço todos os piolhos invasores. Olhei, aquele não era o piolho de Valentine.

-'Valentine, minha filha, onde você conseguiu esse piolho?'

-'Mamãe, não sei. Estava brincando com as colegas...'

Insisto, porque sei que minha filha não mente:

-'Filhinha, esse piolho não é seu! Não tem pintinhas brancas...'"

Valentine coça a cabeça e, curiosa, pergunta:

-'É igual à galinha pintadinha?!!!'

Claro, eu não poderia deixar a linda cabeleira de Valentine passar por aquela situação. Tranquilamente, arranquei o danado à força, coloquei-o num envelope e pedi a Valentine para entregar à sua professora, com um recadinho:

-'Pró, veja quem perdeu esse piolho. que encontrei na cabeça de Valentine...'

Minha atitude de mãe zelosa gerou polêmica. Cada colega tinha uma história para contar. Sandra disse que recebeu um piolho numa caixa de fósforo. Acho que confundiram piolho com vaga-lume... Outra colega recebeu foi um potinho cheio de piolho. Todos falavam ao mesmo tempo, aula suspensa, e uma reunião extraordinária foi marcada. Afinal, um piolho não poderia alterar a rotina de uma REDE PEDAGÓGICA!

A professora Cristiane falou:

-'Gente!!! Se estava na cabeça dela, então é dela!!!'

Queria defender minha Valentine, mas a reunião estava pegando fogo. Fiquei em silêncio. A diretora da Escola Rede Pedagógica foi cirúrgica ao concordar com Cristiane:

-'Mãe é quem cria!'

De repente entra a professora Sonia, com um livro de Ana Maria Machado “A poltrona do piolho”, indicando a leitura, mas àquela altura, ninguém queria saber de literatura. Resolveram chamar a psicopedagoga. Com certeza, Poly teria a solução, e ela tranquilamente diz apontando para mim:

-'Ela tá certa! Errado foi o psiquiatra que deu alta.'

Os risos foram transformados em gargalhadas. Mas minha colega Brunna tentou amenizar para o meu lado:

-'Ela tá certa, mesmo. Errado é o piolho intrometido.'

Ninguém se entendia, a Assistente Social foi chamada, e Márcia foi taxativa, ouvindo toda a discussão:

-'Nossa, é sério? Temos que chamar a polícia militar para registrar um Boletim de Ocorrência e o Conselho Tutelar, pois há criança neste episódio. Ah, não podemos esquecer da polícia civil para fazer a investigação minuciosa... Afinal, precisamos descobrir quem perdeu esse piolho relaxado...'

Enquanto isso... O piolho acordou da soneca, fez um alongamento, devagarinho foi saindo do envelope e de um salto já estava percorrendo outra cabeça. Meu olhar atento viu o danado fugindo, cutuquei minha amiga:

-'E agora, como vou provar que não é da Valentine? Não sei se choro ou escrevo.'

-'Escreve. Mais tarde iremos na seção de Perdidos e Achados...

Elisabeth Amorim
Enviado por Elisabeth Amorim em 20/05/2024
Código do texto: T8066923
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