AFOGAMENTO

Este fato aconteceu quando eu tinha entre nove e dez anos de idade, provavelmente. Estávamos eu, meu irmão e amigos nossos, filhos de conhecidos de meus pais, no Beach Park. Eles tinham entre onze e doze anos, um pouco mais velhos que eu.

Nós, quase sempre longe dos pais, fomos a várias partes do parque. Até que fomos ao “maremoto”, uma piscina com ondas artificiais. Na qual eu nunca havia ido.

Bom, as ondas tinham hora marcada para começar a ser produzidas. Enquanto não acontecia, era uma piscina normal. Fomos todos para o meio da piscina, em cima das próprias bóias do parque. Após um certo tempo, meus amigos e meu irmão decidiram sair dali e ir em direção a uma bóia vazia que estava na parte mais funda da piscina. Havia muita gente, então entre uma bóia e outra não passava outra bóia, por isso era preciso ir nadando até as bóias. Eles foram e eu fiquei um pouco mais ali. Provavelmente eu hesitei um pouco, sem entender qual seria o motivo de ir para outro lugar.

Mas alguns minutos depois, vi que ficar no meio da piscina cheio de desconhecidos em minha volta não teria a menor graça. Então saí da bóia para ir até onde eles se encontravam. Comecei a nadar entre as bóias, até que, para minha surpresa, soou uma sirene e começaram a produzir as ondas.

No começo a água apenas balançava, então não afetava tanto o nado. Só que as ondas começaram a bater em mim, e eu era o único solto na piscina, sem bóia.

Num ponto em que já conseguia ver meus amigos, as ondas chegaram ao tamanho máximo. Aí começou o desespero. A cada onda, eu afundava cerca de dois metros. Quando retornava à superfície, já estava quase sem fôlego. Nas primeiras vezes, provavelmente achei que daria para controlar a situação. Mas as ondas não paravam.

Eu tentava nadar em direção a meus amigos, mas eu não saia do lugar. Só tinha forças para nadar para a superfície, depois da onda. A esta altura, meus amigos já haviam me visto. Só que, supreendentemente, não recebi ajuda deles. Nem de ninguém dos que estavam próximo. Eu pensei “Não ficou claro que eu estou me afogando??”. Meu irmão e meus amigos, na verdade, estavam rindo de minha cara. Talvez por pura infantilidade ou porque achavam que eu estava dominando a situação. Mas acredito fielmente que tenha sido a primeira.

Imagine agora minha situação. Eu ficava mais tempo dentro do que fora d´água. A cada onda, eu afundava. Quando subia, não respirava o tanto necessário. A falta de fôlego aumentava e começava a me corroer. As forças iam acabando. Ainda tentei, inutilmente, várias e várias vezes gritar “SOCORRO!”, ao retornar à superfície. Mas na sua última sílaba eu sempre engolia água.

As imagens que tenho guardadas, nos momentos em que olhava fora d´água: meus amigos rindo de mim, os banhistas se divertindo em suas bóias e o salva-vidas de óculos escuros sorrindo enquanto conversava com duas pessoas.

Com o movimento das ondas, eu não conseguia me segurar em nenhuma bóia alheia. Não sabia se era pior olhar o “salva-vidas” indiferente ou os amigos e, o próprio irmão, me gozando.

Acho que houve um momento que parei de gritar. Não tinha mais forças. Já estava com falta de ar há muito tempo. A esperança também já havia sido levada várias ondas atrás. Apenas persistia no instinto de respirar. Era angustiante tentar subir, sabendo que quando chegasse, não conseguiria respirar o suficiente.Assim que subia já sentia a outra onda perto e eu só pensava “Ah, de novo não...”, “Pára com isso, não agüento mais”.

Creio que eu já pensava em morrer, talvez até desejando que morresse, mas que, pelo menos, acabasse logo. Foi quando senti alguém pegando em meu braço. Era Israel, um dos amigos que estavam lá, que acabou vindo me ajudar. Começou a me levar. Ele foi forte o suficiente para nadar e me puxar atravessar das ondas ao mesmo tempo! Eu ainda batia um pouco na água, mas quem fez todo o trabalho foi ele. Parecia um peixe, juro!

Me ajudou a subir na bóia onde estavam. Finalmente pude respirar em paz.

Eu devo ter questionado a meu irmão e os outros amigos “por que vocês não foram me ajudar, hein?”, mas acho que não recebi nenhuma resposta satisfatória. Dali onde eu estava, enquanto meus músculos descansavam, pude ver, à beira da piscina, o salva-vidas inútil, que não tinha coragem nem de mostrar os olhos. Eu olhei bem o sorriso dele e não senti outra coisa além de ódio. Mas o pessoal acabou levando na brincadeira e não houve muito tempo para me concentrar na raiva.

Mas o trauma ficou. Quando lembro, ainda posso sentir a falta de ar, a água entrando em minha boca. Me emociono sim.

No fim de tudo, ao menos houve oportunidade para meu amigo mostrar seu lado herói. Talvez ele nem lembre mas disso, mas eu lembro. E para sempre meu grande herói será.

Sei que se eu dependesse de qualquer outra pessoa no mundo naquele momento, não estaria mais vivo. Vou tentar mudar o mundo e, se conseguir ajudar apenas uma pessoa, de certa forma já estarei satisfeito. Mas não quero ser só mais um. Pretendo um dia mostrar que valeu a pena, Israel, teres salvo minha vida.

PS: Encerro, com algumas lágrimas, o maior drama de minha vida.

Cláudio Theron
Enviado por Cláudio Theron em 14/01/2008
Reeditado em 14/01/2008
Código do texto: T816611
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