Ode aos Fractais

No cerne da análise estatística existe um elemento-chave para o estudo de qualquer associação: chama-se Teste de Hipóteses. Não basta demonstrar que uma associação é factível (hipótese alternativa), mas também provar que esta associação não ocorreu ao acaso, por mera coincidência (hipótese nula).

Encontrar pessoas, por exemplo, é apostar na veracidade do sentimento que elas porventura nos ocasionam. Em conseqüência, iniciamos relações julgando que “os outros” sentem o mesmo que nós, ou pelo menos sentimentos correlatos. Cada nova relação é novo remédio, tentativa de provar que, à parte escolhas erradas anteriores, podemos acertar. E por isso sonhamos, queremos, fazemos. Cremos ter nas mãos o Livro do Destino, com maiúsculas; cremos escrevê-lo, quando na verdade talvez sejamos apenas personagens, ou, se muito, leitores esforçados. Mas colocamos nossas vidas nas mãos desta hipótese alternativa, acreditamos piamente que “tudo está interligado”, que “o acaso não existe”, que “nem um fio de cabelo jamais cairá de nossas cabeças se Deus Pai não o permitir” e quetais.

Digressiono: e se tudo for por acaso? Se em vez de Destino, formos governados pelo Caos puro e simples? Seria assim tão ruim? Ou, por outro lado, será que não haveria nada de bom e aproveitável? Por exemplo, quantos esforços seriam economizados, quanto sofrimento minimizado, quantos desencontros evitados?

Se em vez de sermos, pontualmente, um para o outro, “a pessoa certa na hora errada”, ou “a pessoa errada na hora certa” – como tantas vezes em nossa vida pensamos a respeito de alguém - fossemos todos e em cada momento, tão somente átomos conscientes, humildemente governados por abstrações físicas (“leis”?) que jamais chegaremos a entender? Seremos nós, unidades humanas, tão diferentes assim do restante do Universo? Por que ansiamos tanto por explicações, soluções, respostas, interações e despedidas? Será que não perdemos nesta eterna busca de sentido, quando o Universo inteiro ao nosso redor é uma estonteante ode à diversidade e ao caos?

Munidos então por um “novo” empirismo, talvez enxergássemos fractais coloridos invadindo nosso planeta, deixando marcas definitivas em nossas vidas, em nosso habitat e em nossa cultura. A hipótese nula venceria. Livres enfim, poderíamos esperar dos outros o nada que é sensato esperar, recebendo com ainda mais fervor cada bem-querer, cada apreço, cada gostar – como elétrons que se chocam na periferia de nossa estruturas atômicas.

Tudo poderia ser diferente.

Renato van Wilpe Bach
Enviado por Renato van Wilpe Bach em 09/12/2005
Reeditado em 10/12/2005
Código do texto: T83205