Cantilena

screvi, no papel, o teu nome. Letras grandes preencheram toda uma folha, grossas, escrita à nanquim e pena. Deixei que secasse e preguei-o na parede, pondo-me a observá-lo e lembrando de todas as promessas vãs.

Parei de sentir dor mas não senti raiva ou mágoa, apenas ouvi o silêncio que era rompido pelos pássaros a cantar no quintal. Revi as flores que havia te atribuido representação, vi a pequena árvore que pretendia plantar frente a tua casa e tive ímpeto de arrancá-las para que não me lembrassem mais de ti.

Mas porque? Não seriam apenas as árvores, árvores e as flores, flores? Quem deu-lhes significado estranho e indevido é quem deve silenciar em sutil penitência. Devolvi-lhes, portanto, a identidade perdida, não te representavam mais, eram apenas flor e árvore.

A chuva que cai sem cessar prenuncia um novo tempo, tempo em que meus pés não desenharão mais marcas no chão acompanhadas de outros pés, tudo em construção. Basta! Já não quero mais ser abandonado no meio do caminho entre vãs promessas e declarações de admiração que não correspondem ao desejo de construir.

Silêncio! O meu coração construirá mil moradas mas sempre será morador provisório. Do mesmo modo, as flores serão apenas flores e as árvores apenas árvores.

André Vieira
Enviado por André Vieira em 31/01/2008
Código do texto: T840571