ECOS DE FELICIDADE

Num final de tarde fazia meu trajeto caminhando apressadamente pelo calçadão da João Pessoa quando ouvi soar uma bela voz. Cantava uma música num inglês inventado e arrumado pela sua dona. Diminuí um pouco meus passos deixando adentrar em meus ouvidos aquela voz invejável, forte e bem trabalhada, apesar, pelo que se deve supor, de a sua dona não ter nenhum trabalho de técnica vocal.

A mulher trabalhava recolhendo o lixo e pelos poucos segundos que a olhei vi rapidamente seu perfil. Negra, robusta, manifestando uma alegria que saia junto com a música que ela entoava. É claro que sua voz chamou a atenção de todos que por ali passavam e, nos meus passos reduzidos, pude ouvir e observar várias reações. Alguém relatou como poderia sair tão bela voz de uma mulher que recolhe o lixo, um se admirou: “Que bela voz!”, alguns riam e zombavam do inglês improvisado por ela, outros com gestos diziam: “Louca!”. Ri por dentro da loucura daquelas pessoas que se admiravam e se espantavam com a voz daquela mulher. Loucura deles sim, porque sei que muita gente estava a se perguntar o por que de tanta alegria em alguém que recolhe o lixo. Ela conseguiu, com a exposição do seu gesto de felicidade, confundir e fazer com que algumas pessoas parassem para olhar. Eu não parei de caminhar, mas, como sempre, parei para refletir. E durante aquele percurso vi o quanto espanta as pessoas verem alguém humilde dar demonstração de felicidade. Aquela mulher não ocultou sua alegria, pelo contraio, gritou para todos ouvirem. Por trás da língua estrangeira, inventada e embolada que ela deixava sair das suas cordas vocais estava a significação: “Estou feliz!”, “Estou aqui dando um duro danado, cansada, suada, mas meu corpo está transbordando de alegria”. “Não vou parar pra me lamentar, só quero aproveitar este momento que me sinto feliz, independente de transtornos, problemas, dificuldades. Quero desfrutar do momento que estou me sentindo feliz”. Ousadia minha traduzir assim o que a mulher cantava, mas é claro que ela também me chamou atenção, assim como as outras pessoas não pude deixar de notar sua presença.

Segui meu caminho pensando no quanto agente esquece de dar valor aos pequenos momentos de felicidades por causa das coisas desagradáveis que nos cercam e ri por dentro. Deixei ecoar em meus ouvidos a alegria daquele som até que a distância me impossibilitasse de não mais o ouvir.

Silvia Pina
Enviado por Silvia Pina em 02/02/2008
Código do texto: T843471
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