Rosa Maria

Quando eu era criança, o terreiro da nossa casa na fazenda vivia repleto de galinhas, patos, perus, gatos, cachorros e outros bichos - e eu era muito afeiçoado a eles, especialmente aos galináceos.

Eu me divertia muito com suas estrepulias e como tinha bom jeito para lidar com bichos fiz grandes amizades. Tive a grande satisfação

de conhecer a capacidade deles de dar e receber carinho. Isto me acompanhou por toda a vida! Eles comiam na minha mão, subiam no meu colo, ‘conversavam’ comigo, demonstravam ciúme, me defendiam de supostos agressores e simplesmente ficavam felizes em minha companhia. Eu fazia trilhas de milho pelo quintal e me divertia em ver a galinhada atropelando-se na disputa pelos preciosos grãos!

Também fechava a mão cheia de arroz ou milho para que elas ficassem tentando abrí-la com o bico. Era muito legal! Muitas vezes eu ‘adotava’ pintinhos órfãos, doentes ou aleijados.

Eles recebiam cuidados especiais e muito carinho, e assim passavam a fazer parte da nossa família. Uma dessas criaturas especiais foi a Rosa Maria. Era um pintinho órfão que com o tempo tornou-se uma das galinhas mais lindas que eu conheci.

Tinha traços bem definidos. Suas penas amarelo-ouro distribuíam-se fartamente por todo o corpo numa camada homogênea e bem compactada. Sua crista de um vermelho vivo era bem feita, ligeiramente dobrada na frente, o que lhe conferia um charme especial. Tinha também “brincos” meia-lua, muito bonitos, vermeho-rosa-acetinados. Eu achava seu ‘rosto’ expressivo, transmitia ternura e meiguice. Mas o que tornava Rosa Maria especial não eram as suas características físicas e sim as suas boas qualidades. Era uma poedeira e tanto - mais de 20 ovos em cada período!

Totalmente dedicada ao ninho, quando chocava, o aproveitamento era de 100%.

Rosa Maria tinha uma virtude especial. Ela fazia de bom grado uma coisa que as galinhas em geral não gostam de fazer: cuidar dos filhos dos outros! Quem sabe por ela mesma também ter sido órfã e adotada... Quando de outras ninhadas poucos pintinhos vingavam, para que as mães não gastassem meses cuidando de poucos

filhotes, deixando assim de por ovos, a idéia era integrá-los à prole de outra mãe. Quase todas as outras rejeitavam a tarefa imposta de criar filho alheio, menos a Rosa Maria!

E como a gente abusava da bondade dela nesse respeito! Era comum

vê-la cuidando de uma filharada bem diversificada, que incluía tipos, cores e até tamanhos bem diferentes! Dispensava o mesmo carinho a todos, desde recém nascidos até alguns marmanjos que relutavam em assumir o papel que a natureza lhes ditou de se cuidarem sozinhos, o que é perfeitamente compreensível, tendo por mãe Rosa Maria!

Certa vez papai encontrou no mato um ovo azul-esverdeado, bem

menor que de uma galinha. Decidimos colocá-lo entre os da Rosa Maria para ver se chocava e de que bicho era. Mas será que ela aceitaria chocar um ovo tão diferente?

É o que se perguntavam todos da casa. E você o que acha? Claro que ela aceitou a tarefa! O filhotinho nasceu bem antes dos pintinhos e por isso foi criado por nós - um lindo macuquinho que se tornou de estimação de toda a família! Por muitos anos Rosa Maria fez parte marcante de nossas vidas. Morreu de velhice, sempre estimada

por todos. Até hoje, quando a família se reúne e relembra velhas histórias, Rosa Maria é sempre lembrada - a galinha mais bonita e prendada que eu já conheci!