ENTÃO DEUS PECA TAMBÉM?

Há muitos anos, quando os meninos eram incentivados pelos pais

a seguirem a carreira eclesiástica, o início de tudo, o grand iniciale

era ser “coroinha”.

Fantástico! A inveja dos amigos. Os olhares cândidos das

Mariazinhas e Lourdinhas. A cara bolachuda de orgulho dos pais

fervorosamente católicos.

E o saco de ter que ir todo domingo à igreja, participar de várias

missas, quando os amiguinhos jogavam futebol e brincavam nas

imensas balanças existentes no pátio da Igreja Dom Bosco.

Os avós, principalmente “as”, cantavam aos quatro cantos que o

netinho era um ser predestinado.

-com certeza vou morrer muito antes, dizia a avó com voz embargada,

mas que esse guri vai ser papa, ah! Isso vai.

-que talento, tem ele, hein dona Genoveva?

-nossa mãe. Não tem cara de santo?

-nossa. É um menino tão bom. Faz a lição de casa, ajuda a mãe,

ajuda o pai, ajuda os irmãos....nem vou falar mais nada. Vai ser papa e pronto!

-eco, diziam as velhas italianas amigas da avó do mini padre prodígio.

E o pequeno Michel nem imaginava o que tramavam em nome dele.

Nem sabia se era coisa contra ou a favor.

Sabia que queria jogar futebol no horário da missa.

Isso, definitivamente, ninguém entendia.

Um belo dia, Michel resolveu tirar a limpo umas dúvidas que tinha

a respeito de Deus.

Então procurou o Padre José, que era o responsável pela paróquia

e, digamos assim, um jesuíta de plantão.

Como Michel era muito respeitado, tanto pela sua postura como pelo

seu nome de anjo, não lhe foi difícil abordar o padre.

-Padre José, quando o Senhor virou padre, virou porque virou ou

tinha alguma dúvida?

-Como assim, meu filho, que tipo de dúvida?

-Assim... tipo... dúvida sobre Deus?

-Filho, se eu tivesse alguma dúvida sobre Deus, nem teria entrado

na Igreja.

-E se algum dia o senhor tiver, padre José?

-Bem, então eu saio da Igreja. Arrumo uma mulher. Caso e vou ter um monte de filhos.

-Larga o celibato?

-Largo.

-Pois eu tenho uma dúvida.

-Tem? Duvido.Com essa idade....será que já não aprendeu tudo?

-Veja bem, padre José.

-Deus é como?

-Ora, Deus é onipotente...onipresente.

-É?

-É!

-Então ele está....dentro da porta?

-Sim.

-Dentro da sopa?

-Sim.

-Dentro da goiaba?

-Sim, meu filho ele é onipresente, quer dizer, está em todo lugar.

-Então ele está em meu pensamento?

-Claro!

-Então quando eu peco ele peca comigo?

Faz muito tempo isso. Sei que o Sr. José tem três filhas lindas.