OLHO GRANDE

As terras de um homem rico produziram abundantemente.

Ele, então, discorria consigo: Que hei de fazer, pois não tenho onde recolher os meus frutos?

Finalmente disse: farei isto: derrubarei os meus celeiros, construirei outros maiores, e neles guardarei toda a colheita e os meus bens.

E direi à minha alma: tens muitos bens em depósito para largos anos; descansa, come, bebe e regala-te. Deus, porém, disse a esse homem: "Insensato, nesta noite mesmo virão demandar tua alma; e as coisas que ajuntaste, para quem serão? Assim acontece aquele que entesoura para si, e não é rico em Deus”.

É determinação divina que o homem deva conquistar o pão com o suor do próprio rosto. Isso equivale a dizer que, para atender as necessidades da vida física, ele é obrigado a trabalhar, pois a natureza não lhe oferece de mão beijada, quanto baste para saciar-lhe à fome e a sede; nem tampouco os recursos com que se proteger contra as intempéries.

Através dessa luta pela existência, que é uma bênção - e não maldição, como alguns erroneamente supõem - o homem vai-se desenvolvendo em todos os sentidos, ganha ciência, aptidão e sensibilidade, resultando daí sua evolução e o progresso do meio em que exerce suas atividades.

Infelizmente, porém, muitos se preocupam em demasia com esse problema, em detrimento das questões de ordem moral e espiritual, deixando-se levar pela ambição, pelo desejo insaciável de acumular bens de fortuna, o que não raro se transforma em verdadeira obsessão.

A avareza, a sórdida e feroz avareza, passa a comandar-lhes as ações, sufocando todo e qualquer sentimento nobre e altruísta e até mesmo religioso que se contraponha à idéia fixa de aumentar o patrimônio, aumentar continuamente, esses tesouros.

Para tanto não medem esforços e passam por cima das pessoas corno um trator desgovernado, O avaro é logo conhecido pelo gládio nos processos de inventário.

Perdem o sono, o humor e, de herdeiro, transforma-se em litigante no tramite processual, chegando a tomar os demais sucessores como verdadeiros inimigos.

Não se resguardam de ferir pessoas, amigos e parentes com gestos e palavras, enxergam somente a vantagem e o proveito. Muitas vezes a avareza é tamanha que a pessoa passa a ter um estranho comportamento social. Torna-se totalmente inseguro ao entabular qualquer negociação, adquire a sensação de estar sendo ludibriado, desconfia de qualquer pessoa, até dos mais íntimos.

A estranha sensação de logro de que é possuído o avaro, fica muito próxima da esquizofrenia, urna linha bastante tênue divide as duas classes.

O comportamento doentio estriba-se no seu próprio caráter recalcado em virtude do conflito que trava consigo mesmo no âmago da consciência. Passa a enxergar nas outras pessoas as atitudes torpes de que é capaz de praticar.

Esquecem-se de que, a qualquer instante serão arrebatados pela morte, tendo que deixar aqui toda a fortuna adquirida durante a vida, para que outros a desfrutem ou esbanjem a seu bel-prazer. Se se compenetrassem dessa verdade, certamente não teriam tanto empenho em juntar riquezas para uma vida efêmera, cuja duração não vai além de uns poucos anos.

Buscariam, antes, tornarem-se ricos em Deus, pela prática constante da caridade, do amor ao próximo, e pelo esforço diuturno no sentido de libertar-se daquilo que mais os amesquinha e mais fortemente os agrilhoa à prisão terrestre: a cupidez, a usura, o apego às coisas materiais.

Há poucos dias, munidos de uma autorização judicial, oficiais de justiça acompanhado de policiais, arromabaram o apartamento da senhora Arlete Magalhães de 78 anos, viuva do senador baiano Antonio Carlos Magalhães, a procura de quadros e jóais que deveriam e não constavam do inventário.

O pedido foi feito a justiça pela própria filha Tereza Magalhães. Como se vê, a filha acionou na justiça, a mãe. Não se discute a razão, mas o sentimento, o laço afetivo de mãe e filha. A filha perdeu a sensatez quando notou a ausência de alguns bens no rol de inventário.

“Ajuntai para vós tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem os consomem, e onde os ladrões não penetram nem roubam.” disse o Mestre de outra feita. Esses tesouros são as virtudes cristãs, são as boas qualidades do coração, que devemos cultivar, se quisermos de fato assegurar-nos a vida eterna nos páramos celestiais.

As obras de benemerência e os esforços que se façam para formar um caráter reto e puro constituem a grande colheita da vida.

Todo ato nosso em benefício de outrem, assim como todo cuidado em vencer nossas imperfeições, suscita um impulso para cima, equivalente a um depósito de tesouro no céu.

Este sim, é o verdadeiro tesouro, portanto, abençoado por Deus!

Atualizado para republicação.

RONALDO JOSÉ DE ALMEIDA
Enviado por RONALDO JOSÉ DE ALMEIDA em 31/03/2008
Código do texto: T925060
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