"Impedido de Trabalhar" = Crônica com reminiscências=

Parece brincadeira...Cheio de trabalho a fazer, cheio de livros a inserir em meu sebo virtual, e o site em manutenção desde ontem, impedindo-me de aumentar lá o meu acervo. Mas, como tudo nesta vida tem seu lado bom, esse impedimento também tem. E o lado bom é que estou podendo ler muitas coisas que despertaram minha curiosidade entre as centenas de livros que acabo de adquirir de alguns vizinhos, escolher para esconder dos clientes alguns dos livros que quero ler ou reler, conviver um pouco mais com tanta coisa boa que comprei nos últimos dias para revender.

Às vezes penso em mim como um traficante que é ao mesmo tempo viciado. Apaixonado por literatura, curioso de nascença, muito eclético no gosto, sempre vivi às voltas com os livros.

Diz minha mãe que comecei a ler aos cinco anos de idade e que não tem a menor idéia de quem me ensinou. Aos seis anos ganhei meu primeiro livro, que foi “Oliver Twist”, de Charles Dickens, dado por meu pai que, vendo o entusiasmo com que o li, deu-me logo a seguir “Coração”, de D’Amici. Depois desses dois, li praticamente todos os dias de minha vida, com raríssimas exceções, e nem por isso deixei de aproveitar a infância, de brincar na rua, de fazer meus carrinhos de rolemã, de jogar bola de gude, rodar pião, brigar em turmas, quebrar vidraças, caçar rãs nos “córguinhos” que ainda existiam na Vila Mariana dos meus tempos de moleque. Curti intensamente a infância, mas li todos os acho que sessenta livros de Júlio Verne, todos os cinqüenta e um de Karl May, tudo de Monteiro Lobato, e outras dezenas de outros autores infanto-juvenis.

Até que lá pelos dez anos descobri que era muito mais interessante ler Jorge Amado e outros autores “desaconselháveis para menores”. Li tudo que havia na estante de minha casa em uma posição bastante desconfortável, mas que me permitia privacidade: debaixo de minha cama, com uma boa lanterna acesa e a cabeça em meu travesseiro. Em meu lugar na cama, para fingir que estava dormindo todo coberto, eu colocava alguns cobertores e travesseiros. Meu pai sempre se levantava durante a madrugada, dava algumas tossidas de fumante, ia ao banheiro, e depois verificava os quartos dos filhos e das filhas. Nessa hora eu apagava a lanterna e me fingia de morto embaixo da cama. Nunca fui pego em flagrante.

No dia seguinte era um inferno agüentar as aulas na escola. Os olhos queriam fechar e eu lutava contra o sono durante horas. Resultado: péssimo aluno em quase todas as matérias, mas bom em português e em conhecimentos gerais.

Ganhei alguns livros e coleções durante meu período escolar inicial por obter as melhores notas em redação e dissertação.

Aos dezoito anos, servindo o Exército, conheci uns poucos superiores apaixonados por literatura e isso me valeu muito. Batíamos longos papos sobre o assunto, trocávamos idéias e livros, acabávamos por nos tornar amigos, e lá se ia a superioridade hierárquica. Fiz muitas farras boas com um sargento, um capitão e um tenente que conheciam muito de literatura e da boemia de Belo Horizonte. O único recruta da turma era eu.

Terminados meus onze meses e vinte e um dias de Exército, no dia seguinte eu estava em São Paulo. Exatamente no dia 6 de janeiro de 1967. E nesse mesmo dia fiz minha primeira grande venda de uma enorme coleção de livros. Mas isso fica para amanhã. Agora eu vou ver se o site www.estantevirtual.com.br - que reúne mais de 800 sebos, inclusive o meu, claro - voltou a funcionar ou se ainda está em manutenção para melhorias.

Até amanhã.

Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 17/04/2008
Código do texto: T949596
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