Amor Panorâmico - Parte II

Clara morava no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro. Assim como outrora na capital paulista, adorava passear pelas ruas, ver os pontos turísticos da cidade, conhecer as surpresas a serem desvendadas na nova metrópole. Não raro dirigia-se à zona oeste, nas proximidades de Campo Grande, para visitar sua amiga Sheila. As amigas, que eram próximas mesmo à distância, agora eram inseparáveis. Caíam na night carioca, se encontravam perdidas nas noites da Via Show e West Show, casas noturnas que conheciam bem. Depois que conheceu o Saara, no centro da cidade, não saía mais de lá. Adorava ir às compras, atravessava as ruas do entorno da Alfândega com a mesma destreza com que se aventurava pelas vias do Brás e da 25 de março, na capital paulista. Isso sem contar quando se punha a flanar pelas alamedas do Campo de Sant´anna, ao lado da estação da Central do Brasil. Aquele pedaço de paraíso, com enormes e imponentes árvores esculpidas pela natureza e os pequenos animais residentes do local sempre a fizeram se sentir muito bem .Era de seu costume esticar seus passeios até Copacabana, e ao avistar aviões chegando e partindo do Aeroporto Santos Dumont, sempre se lembrava de sua querida família e amigos do outro lado da Ponte Aérea. Sorria enquanto se lembrava das inúmeras vezes em que tirou fotos ao lado da amiga e do busto do Pai da Aviação, no saguão do aeroporto, como marco de suas visitas ao Rio. Agora, não mais como simples turista, e sim como moradora da Cidade Maravilhosa. Quando tinha suas tardes livres, adorava descer bem no início da orla, no Posto 2 e ir caminhando lentamente até o Posto 6, alternando entre as areias e o famoso calçadão com suas formas sinuosas em preto e branco, estampadas em uma camisa que dera à irmã na visita mais recente. Seus pés iam flutuando pelas areias brancas, e ao chegar às águas, as suaves ondas acariciavam seus pés. Ao se aproximar da estátua de Carlos Drummond sentada naquele banco, pernas cruzadas, de óculos, se lembrava dos poemas do grande poeta. Tentava imaginar o motivo pelo qual fora colocada a estátua de costas para a bela praia. "Talvez inspirado apenas pelos sons do mar, o poeta utilizaria seus sentidos, e com isso, em vez de escrever, conversaria com algum interlocutor de ocasião", considerou. No trabalho, tudo ia de vento em popa. A mudança de ares lhe dera nova motivação, e sua inspiração por novas idéias era atribuída ao seu envolvimento pela beleza acumulada por metro quadrado na paisagem carioca. Tinha mais uma razão especial para apreciar aquele lugar, e esta razão atendia pelo nome de André. Conhecera o jovem numa de suas incursões com sua amiga Sheila durante um espetáculo que assistiram na casa de shows Circo Voador, aos pés dos Arcos da Lapa. Ambos conversavam animadamente, pois André conhecia São Paulo, já que viajava a negócios com certa freqüência para lá. Trocaram telefone e mantinham contato por meio de correio eletrônico. Em virtude de compromissos profissionais, raramente se viam. Clara começava a desconfiar que sentia algo maior do que simples amizade por André - gostava mesmo da companhia dele, dos longos papos no telefone. Sua caixa de mensagens sempre tinha algum recado do jovem, e toda a vez que ele ia a São Paulo, a avisava.

Coincidiu que certa vez, André avisara que teria o fim-de-semana livre no Rio, e se ela se interessasse, poderiam se encontrar. Seu coração palpitava feliz. Aquele rapaz já significava mais que simples amizade, era algo além disso. Era um belo domingo de sol, com temperatura agradável, leve brisa. Combinaram então o encontro em um lugar que até o momento, ela só conhecia por cartões postais e novelas: o Cristo Redentor. À tarde, saiu da Tijuca em direção ao Corcovado. Saía da Rua do Catete, entrou nas Laranjeiras, e enquanto passava por suas curvas sinuosas e arborizadas, murmurava a música "All Star", de Nando Reis e Cássia Eller. Ao chegar ao Cosme Velho, tomou o trenzinho que leva direto ao Cristo. Teve a sensação de estar a caminho da Torre de Babel, ante os mais diferentes idiomas que ouvia - identificou o inglês, o alemão, francês, espanhol e mais uns três que não conseguia afirmar com certeza quais seriam. Ao percorrer aquele trecho preservado de Mata Atlântica, Clara sorria, enquanto sentia um friozinho típicamente adolescente, suor nas mãos, o coração a pulsar mais forte. Ao chegar, no topo, subia lentamente as escadas, e admirava a beleza natural daquele lugar. Avistava o Marcanã, a enseada de Botafogo, Copacabana, o Morro da Urca, o Jardim de Alá, o Jóquei Clube. Debruçou-se no parapeito. Não se cansava de admirar o Rio de Janeiro, e mais uma vez sua paixão pela cidade se manifestava. Levemente, sentiu-se abraçada, enquanto seus olhos eram vendados. Seu sorriso iluminava seu rosto, e ao volver-se, viu André, que também sorria, e acariciando a face macia de Clara, calou qualquer palavra com o primeiro beijo apaixonado, enquanto o Cristo Redentor os abençoava com o mais belo entardecer que ela jamais se esqueceria....

Marcio Roque
Enviado por Marcio Roque em 20/04/2008
Reeditado em 20/04/2008
Código do texto: T954205