Insoniar-se!

É a insônia. Desde que me entendo por gente – o que não faz muito tempo – que a tenho como companheira. Quantas madrugadas passamos juntos, ela e eu, em silêncio, deixando que o som do meu rádio, toque mais ao fundo, enquanto olhamos juntos as estrelas pela janela.

Já ouvi muitos que reclamam sua presença; dizem que ela traz olheiras e que faz envelhecer anos em alguns meses.

Sem falar nos que tem ela como uma doença, e tratam dela como tal: com remédios, chás, rezas ao pé da cama...rituais para o sono.Ontem mesmo, li um texto onde o autor praguejava com fervor suas noites mal-dormidas.Descrevia sua decepção amorosa, seu fracasso no emprego, seus planos já desfeitos, sua vida sem sentido algum, e como resultado de tudo isso, ela: a insônia!

Eu, podem até dizer que por mero conformismo, nunca entendi por que as histórias escritas nas madrugadas em que o sono só vem junto com o amanhecer, e às vezes até depois dele, na grande maioria são relatos de acontecimentos tristes ou uma reflexão melancólica.

Não quero aqui, recomendar uma boa noite de “não-sono” pra ninguém, não é essa minha intenção, mas é que trago em mim tantas boas lembranças de algumas noites em claro, como por exemplo, aquela em que eu, mais jovem e apaixonado, porém sem coragem de expressar o que sentia em bom som, passei a madrugada escrevendo uma poesia, dessas carregadas de frases clichês, mas que no desenrolar dos dias, essas mesmas frases me renderam alguns beijos escondidos entre uma aula e outra.

Lembro também, de quando minha irmã e eu viramos a noite relembrando as estórias engraçadas de nossa família, com suas loucuras que fazem tão bem quando são relembradas.

Teve ainda, uma vez que, como o sono não vinha, resolvi arrumar meu quarto, o que me fez descobrir algumas cartas de pessoas queridas e que o tempo levou para longe; amigos que hoje já tem filhos, outros que foram tentar uma condição financeira melhor em outros estados, alguns que já são anjos no céu, e confesso que, sozinho no meu quarto lendo aquelas linhas, ri com o coração. Uma paz dessas mais raras me invadiu e permaneceu no meu peito por algumas semanas.

Provavelmente, somos todos frutos de uma insônia: ela fez nossos pais conversarem mais demoradamente, rirem juntos até mais tarde, se amarem um pouco mais, e no amanhecer do dia, já estávamos guardados no ventre sagrado de nossa mãe.

Penso na vida e até que ponto vale à pena fechar os olhos e dormir, preferindo o escuro às estrelas que vejo quando meus olhos estão abertos. O que mais vejo são sonâmbulos arrastando seus corpos e seguindo a grande massa insossa de homens. Pessoas que vivem de olhos fechados para o amor, amigos, família e outros nem tão próximos, enquanto o mundo se faz de um sonho do qual não se quer acordar.

O Sol clareia o quintal.

Um galo canta, me dizendo que na vida é preciso insoniar-se.

Insoniar-se...