O menino e o videogame

Ao nascer, deve ter se encantado por algum daqueles aparelhos de hospital, que mais tarde fizeram-no apaixonar pelos videogames.

Nem bem saiu das fraldas, começou a atormentar seu pai nas vésperas de aniversário, dia das crianças e Natal, querendo um videogame, pois todos os seus amigos já tinham um.

Não logrou êxito, mas isso não fez com que ele desistisse de seu sonho e dias a fio batia de porta em porta pedindo a seus amigos para jogar. No afã de satisfazer-se, muitas vezes, era encontrado na casa dos seus amigos, até mesmo sozinho. Ficava lá jogando, jogando... Talvez gostasse mais desses momentos em que não tinha que dividir o maior prazer da sua vida com ninguém.

Seus olhos se transformavam diante da tela. Suas mãos acomodavam-se tão bem ao controle, que pareciam ter sido feitas para manuseá-lo. Quanta emoção sentia!

Algum tempo depois, seu pai cedeu aos seus apelos e comprou-lhe um videogame. Daí pra frente era muito difícil vê-lo na rua. Passava dias e noites na frente da televisão e se incomodava em ter de parar para se alimentar. Aí começaram os seus problemas na escola.

Embora a adolescência fosse ficando para trás, sua devoção pelo aparelho não diminuiu. Ao contrário de seus amigos que abandonaram a brincadeira, continuou sempre se atualizando e depois do primeiro outros videogames vieram.

Logo que começou a namorar, o videogame continuou trazendo-lhe problemas. As namoradas não entendiam a sua paixão pelo jogo e sentiam-se incomodadas em disputar a sua atenção com aquele aparelho. Sempre perdiam, coitadas!

Depois que rompeu seu último relacionamento, ficou contente em ter os finais de semana inteiros para jogar sem se preocupar com ninguém.

Hoje possui um videogame de última geração e, com certeza, esse é o seu maior tesouro. Mais que sua moto, seu apartamento, mais que tudo.

Costuma se referir ao videogame como se este fosse uma pessoa, assegurando que em momentos difíceis da sua vida o aparelho estava ali garantindo-lhe companhia e diversão.

Às vezes, fala que, se tivesse de perder alguma parte do seu corpo, não gostaria que fossem as mãos para nunca se distanciar daquilo que mais gosta.

Também nunca se incomodou com as críticas feitas contra seu hobby, nem se deixou abater pelas dificuldades financeiras ao cultuá-lo.

Tais atitudes, em meio a tanta volubilidade, demonstra a firmeza de alguém que faz de tudo para aproveitar ao máximo daquilo que sempre estará presente na sua vida: o videogame.

(homenagem a Evandro, o menino deste texto)