"Estou Traindo a Rainha das Bebidas" = Crônica de um neo-enólogo com bom humor=

Estou traindo a Rainha das Bebidas.

Depois de vários anos consumindo minhas latinhas de cerveja às sextas-feiras e aos sábados, resolvi dar um tempo. Claro que não virei abstêmio. Isso, parar assim de repente, pode até fazer mal à saúde. E saúde é uma coisa que preservo sempre. Tanto é que só fumo cigarros com filtro há décadas.

Estou tomando uns vinhozinhos caprichados. Coisa fina mesmo. Tudo na faixa de quatro e noventa a seis e noventa a garrafa de setecentos e cinqüenta mls.

Nestes cinco dias da fase inicial creio que já estou me tornando um profundo conhecedor. Um verdadeiro enólogo. No primeiro dia esparramei vinho na cozinha, mas agora já tiro a rolha suavemente e com uns poucos goles identifico logo se é vinho seco, suave, branco ou tinto. Paladar apurado é outra coisa.

Sou bom também pra ler rótulos. E etiquetas de preços. Se na etiqueta o preço é de dois dígitos, desdenho. Vinho pra ser bom tem que ser barato. Custo sacrifício, digo, custo-benefício é uma coisa que levo muito em conta.

Não tive coragem, ainda, de tomar meu vinho em meu velho companheiro, o copo de plástico amarelo, mas assim que tivermos mais intimidade, eu e extrato de uva concentrado, chegarei lá. Por enquanto fico mesmo no copo vazio de requeijão.

Uma das vantagens que encontrei no vinho é que ele é mais discreto. Minha mulher não ouve quando tiro lentamente a rolha e encho outro copo. Antes, com a cerveja, a latinha dava aquela espirradinha, fazia aquele “tichim”, discreto, mas que minha mulher ouvia de qualquer lugar da casa e logo perguntava: “Outra, bem?”. Geralmente eu respondia que não. Que era a mesma de antes que eu estava abrindo outra vez. Detesto perguntas cretin...digo, desse tipo.

Minha barriga cervejística anda me incomodando. É duro andar por aqui, pela praia, com jeito de quem leva meia melancia debaixo da camiseta. Difícil portar uma “barriga de memória”, aquela que quando a gente lembra que tem, encolhe. Isso prende a respiração e a gente não agüenta por muito tempo.

À medida em que vou consumindo meu vinho, devagarzinho, volta e meia me lembro de uma cervejinha gelada e suspiro de saudade, mas me consolo logo lembrando que ela é como o sexo sem camisinha pra mulher jovem e descuidada: dá barriga.

Cada um tem as suas vantagens: a cerveja, pelo menos pra mim, demora mais a acabar, dá pra ler um bom tempo enquanto consumo cada latinha, não me alteram umas poucas latinhas, tem aquele sabor incomparável, desce redondo não importando a marca (desde que seja a que gostamos), e não me dá ressaca. O inconveniente é que até a latinha urina perto de onde a gente está.

O vinho, ao natural, fica quieto no copo, não faz marcas na mesa, não sua pra fora do copo, não faz a gente correr para o banheiro com a bexiga parecendo que vai estourar e, espero eu, não dá barriga. Vamos ver. Qualquer inconveniente eu volto pra cervejinha.

"A RAINHA DAS BEBIDAS" é um artigo que

escrevi aqui no Recanto há meses atrás.

Claro que era em louvor à cerveja. Que

saudade!

Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 25/04/2008
Código do texto: T962192
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