Grilo verde

No lugar onde passei minha infância era comum encontrar grilos verdes pousados tranquilamente em vários locais; encontrava-os pendurados na cortina da sala, do quarto, no chão, no quintal... Mesmo que estivessem mimetizados entre folhas de limoeiro eu os pressentia. Impassíveis, deixavam-se pegar pelas longas asas. Eu, pequenino, tinha com eles uma relação típica infantil: curiosidade... uma verde curiosidade. Tamanho era variado. Cheguei a encontrar alguns que não caberiam em minhas pequeninas mãos. Pegava-os suavemente levando-os até próximo aos meus olhos. Suas patinhas patinavam lentamente no ar sem medo, sem receios; parecia que pressentiam minha amistosa intenção para admirar todo seu verdume. Um recíproco diálogo coordenado pelo silêncio. Colóquio seguido de catapultados saltos. A liberdade era verde.

Minha mãe dizia que encontrar um grilo era um bom sinal. Algo assim como uma esperança para bons acontecimentos. Isso me encheu de iniciática reverência pelos saltitantes amigos do bom augúrio.

Décadas passadas, infância distante, hoje não há mais grilos em meu caminho. Há um mundo cinzento lá fora carente de grilos que saltitem aos nossos olhos tão cegos de esperança; de esperança verde. Um mundo que restringiu a esperança a uma digitalizada intenção de dois sentidos. Não há como tocar a esperança, apenas vê-la e ouvi-la.

Restou-me grilos internos; amistosos como reminiscências saltando os dias que passam; um coração verde que trina e pulsa silenciosamente. Restou-me desprender-me e saltar livre dos dedos que, curiosos querem me fazer crer na bondade de uma curta existência por mais longa que seja.