UM POR TODOS E TODOS POR UM (I.N).

Por onde começar?, me perguntei várias vezes. Será que escrevo algo a respeito? Será que me manifesto? Sim, conclui. Está em todos os jornais e noticiários e internet, em cartazes nas ruas, nos rostos dos concidadãos. Repercute internamente, sonhamos com o assunto, faz parte do imaginário coletivo, do caos e da barbárie dos dias atuais, ou desde de sempre, desde de que o homem deixou de ser um girino saído de águas lamacentas e passou a povoar os quatro cantos do planeta.

Uma menina, uma criança... Nada pode justificar o que foi feito com aquela indefesa criatura. Nada! Me perguntei diversas vezes a razão ou justificativa que este animal (ais) teria para tirar a vida daquela menina de maneira tão violenta, impiedosa, bestial e premeditada. Não há justificativa. Existe uma explicação, mas não confundi-la com justificativa. Pois não há. Raiva? Ciúmes? Insegurança? O quê? Não me importa o agente. Pouco me interessa se foi o pai e a madrasta, se foi uma terceira pessoa. Não é isso que me chama atenção. De modo algum. Chama minha atenção o desrespeito pela vida, a banalização à vida, a arbitrariedade. A ação. Que seja feita a Justiça dos Homens.

Me chama muito atenção a comoção popular. Entendo a gravidade do assunto. Mas não compreendo populares que viajaram de Estados longínquos para aparecer na televisão. Também fiquei aterrorizado com o acontecido. A casa da família mas parece a pré-produção de um show de horror. Camelôs descobriram um novo point para vender suas bugigangas, salgadinhos, algodão-doce, cachorro-quente, cerveja, batida, etc. Os populares de pés fincados no asfalto anseiam por justiça, flashes das câmeras, luzes dos refletores, querem com todo o direito de quem viajou por horas e horas, que ali mesmo, em frente aquela casa, seja feita justiça. Que os culpados mostrem a cara. Querem justiça! Lembrei-me das fogueiras da Inquisição. Não seria justo queimá-los ali mesmo? Vale lembrar a Lei de talião: o criminoso é punido taliter, de maneira igual ao dano causado a outrem. É uma lei antiga o “Olho por olho, dente por dente”. Os populares sitiam o lugar. Armam barracas, não tomam banho, fazem ligações para parentes de outros Estados na esperança de terem sido vistos na televisão, no programa do Datena, ou noutro programa vulgar e sensacionalista. Comem cachorro-quente, bebem cerveja e batida, comemoram a sua participação no “grande evento”. São solidários. São pais, mães, filhos... São brasileiros.

Mas este movimento popular me chama atenção. Me perguntei o que pode ser exatamente. Tive a sensação de que não estão em busca de justiça. Ou será que estão e de que justiça estamos falando? Será o quê? Um mártir? Isabela Nardoni representaria o sofrimento de todas as crianças brasileiras abandonadas e carentes, destituídas de lar e esperança, impossibilitadas de sonhar com um futuro melhor, com uma vida mais digna? Será este o motivo? Não sei. Mas sei que existem milhares de crianças brasileiras e anônimas e geralmente pobres, que diariamente são punidas severamente por uma sociedade ou Governo ou sistema que insiste em fingir que o problema não existe. Deletamos a informação. Extraímos do banco de dados, do nosso HD humano, da mesma maneira que um dentista extrai um dente podre. Não sabemos por onde começar. Eu não sei. Ou sei e acho que meu movimento não surtirá efeito algum. Que o ali não está a raiz do problema. Responsabilizamos os outros, os políticos, as classes sociais, o sistema... Mas este é um assunto complexo. Um tema delicado, atual e urgente.

Me chama atenção a exploração da mídia. Um mês se passou. O assunto dá Ibope. Mas sinceramente mais parece um Big Brother de mal gosto. Sensacionalismo dantesco, infernal, grotesco e desrespeitoso. Pessoas realmente interessadas na resolução desta tragédia estão sofrendo. O que é que o Datena e outros do mesmo “calibre” tem haver com isso além de querer se auto promover com o sofrimento alheio? É aviltante assistir e ouvir as palavras desses agentes do sensacionalismo. Pois tornou-se uma questão de honra para eles que a justiça seja feita? Não acredito. Não acredito que outras crianças que sofrem abusos sexuais, que são vítimas das maiores e inimagináveis atrocidades não devam ser também mencionadas, que a causa delas não desperte tanta atenção e interesse da mídia. Massificam o caso Isabela Nardoni como se absurdos da mesma natureza ou piores deixaram de existir. O falecido ex-governador do Estado do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, disse certa vez quando intensamente perseguido pela mídia: “Todas as atenções da mídia estão voltadas para mim, e este é o momento que outros políticos adoram, pois podem roubar sem serem notados”. Semelhante ao que está acontecendo? Acho que sim. Queixamo-nos que o Brasil é um país sem memória, mas justifica-se então o ataque diário da nossa mídia, a exploração ignorante feita por ignorantes, a falta de respeito? Acho que não.

Que seja feita a Justiça dos Homens o mais rápido possível. Que este (s) monstro responda por sua atrocidade. Que Isabela Nardoni possa descansar em paz e que outras crianças vítimas de tantas outras atrocidades sejam também lembradas diariamente e respeitadas diariamente. Que passemos a ser mais severos com a abordagem desrespeitosa da nossa mídia. Que essas crianças possam ter um futuro digno. Que a degradante abordagem e conduta de nossos apresentadores seja uma péssima lembrança do passado.