Crônicas que Elevam a Alma - 2ª - Uma Prova de Amor, O Esposo dedicado

Ele, um homem ainda jovem, casado há apenas quatro anos, mesmo antes de saber o que era juventude, era pacato, e não gostava de sair. Ela, uma mulher praticamente feita, que viu em Cid a oportunidade de recomeçar, foi seu segundo casamento, mesmo com mais idade do que o Cid, a Dona, nunca deu atenção aos comentários dos outros, seria isso o amor. O amor pode ser demonstrado de varias maneiras, mas a forma como conheci este casal que aparentemente normal, não foi assim como se encontra todos os dias. Para se ter uma idéia, o Cid, realmente era jovem, e ainda é, quando se casou com a Dona, que já vinha de um casamento sofrido, ela já tinha um filho de dois anos, mas o Cid não ligou, se casou com ela mesmo assim, e teve que tomar responsabilidades de um adulto, de um homem. Logo tiveram mais dois filhos nos três primeiros anos, porém o ultimo a nascer já fora nesta nova condição, Dona estava paraplégica.

Eu estava debruçado ao pára-peito e notei que o Cid também assim estava, porem ele estava distante, nossa comunicação até aquele momento nunca tinha passado de um olá, como vai, e ai ta gostando do hospital, ta com saudades dos filhos,,, Coisas assim. Ele estava realmente distante, estava só, algo estava errado, ou fora da rotina, pois no dia a dia, naquele horário, ele sempre estava ao lado dela, era horário de almoço, e sempre os acompanhantes ficavam com seus pacientes, para auxiliar na alimentação, a Dona era esperta, dominava a cadeira de rodas, mas o Cid sempre estava com ela, levando a bandeja das refeições ou pegando um lenço, sim, algo estava diferente, porem não tive a iniciativa de procurar saber, preferi apenas ficar ali observando. Mais tarde eu saberia mesmo sem perguntar nada.

No hospital S. todos os acompanhantes dormem separados dos seus pacientes com exceção dos que ficam em apartamentos, como era um fim de semana, só tinha eu e o Cid no alojamento masculino, minha beliche ao lado da dele, e eu calado, deitado olhado a parte inferior da cama superior, quando o Cid volta do banho, estende a toalha na grade cama de cima, e se deita emborcado, notei que ele deu uma olhada pra mim, na verdade deu para ver que ele ficou me fitando por um bom tempo antes de falar:

__Então, Evandro, você é casado há bastante tempo?

__Não, apenas dois anos, e você?

Assim, fiquei sabendo de sua historia, de seu casamento precoce, com uma mulher já experiente e com um filho. Fiquei surpreso ao saber que ele só tinha 21 anos, e ela tinha 26, mas o que mais me comoveu foi ele ter falado que no perto de fazer três anos de casados, Dona sofreu uma infelicidade, suas pernas deixaram de se moverem, em poucos dias, e mesmo depois de vários exames, os médicos e especialistas ainda não tinham descobertos a causa de tal lesão na medula. Neste ultimo ano, eles já tinham percorridos vários hospitais antes de chegarem ao S. depois dele narrar os acontecimentos, ele desabafou:

__A Dona acha que eu não gosto mais dela, não entendo, dar até raiva em escutar isso dela.

__Olha, eu notei você diferente hoje, calado e distante.

__Você notou? É verdade, nós tínhamos brigado, ela disse que eu fico distante, e que eu não estou mais gostando dela, que estou cansando dela. Como é que ela diz uma coisa dessa?

__Bem, eu entendo o que você está passando, é compreensível.

E realmente era, o Cid estava magoado por que sua esposa estava reclamando de algo que não era verdade. Sim existia uma diferença neles, a idade e a experiência, ela era uma mulher vivida, e ele um homem que não teve uma juventude como os outros. Naquela noite ao fim da conversa eu lhe disse, que tivesse calma, pois a situação dela não era fácil, afinal ser casada com um homem bonito, jovem e não poder sair com ele andando de mãos dadas desfilando pelas ruas, era muito difícil e talvez ela estivesse se sentindo menor e talvez tenha se expressada da maneira errada. Bem, não entendo muito, mas parece que minhas palavras tenham acalmado mais ele.

Em diferente ao meu contato com o Cid, eu e a Dona tínhamos um contato maior, sempre jogávamos nas tardes de sábado e domingo, no outro dia após minha conversa com o Cid, estava eu e a Dona a sós na sala de refeições, quando ela me chama para irmos para o solar, uma área descoberta no terceiro andar, e me confidencia que está brigada com o Cid, eu já sabendo, deixei ela falar, me disse que estava chateada com ele, pois ele estava mais distante, e que assim, poderia ele não esta mais gostando dela. Eu fui direto, talvez não devesse ter falado daquele jeito, lhe disse que ela estava sendo egoísta, pois eu tinha observado o Cid, e ela há dia, o que era verdade, e notara que eles eram um casal muito harmonioso claro que só por base em minhas observações, e disse que para um cara jovem como ele ficar preso num hospital de reabilitação, e sempre dedicado como ele era, só gostando muito. Ela refletiu e confirmou que eu tinha razão, realmente tinha sido injusta com ele, ele era muito bom para os filhos e tinha seu primeiro filho como filho dele, ela me disse. Mas o que foi mais revelador foi o que ela diria depois:

__Evandro, olha pra mim, sou feia, estou gorda, meu cabelo ta feio, e eu depois desta cadeira de rodas não tenho mais vontade de sair com minha família, é complicado e dar muito trabalho.

Realmente é difícil, entendo ela, afinal a situação do meu irmão é bem parecida com a dela, e andar com uma cadeira de rodas pelas ruas alem de chamar muito a atenção dos outros depende de uma força a mais. Olhei pra ela, e disse:

__Dona, você não é feia...

__Sou...

__ Veja, você apenas não está mais se arrumando, mas você é uma morena muito bonita, alegre, sempre que conversamos você sempre deixa escapar um sorriso, uma gargalhada, agora eu acho que você está se trancando, se culpa, você deve conversa mais com o Cid, mas primeiro você tem que começar a se gostar novamente, você tem que se amar.

Ela olhava para mim, calada, mas notei uma lagrima no canto olho, era o sinal de que eu queria. E disse:

__Veja o Cid, um rapaz bom, que gosta dos filhos que ama você, e vocês vão vencer este desafio, e você vai ficar boa, eu acredito. Vá, seja carinhosa com ele e retribua o afeto que ele tem por você.

No outro dia, eles estavam juntos numa mesa no corredor, ela olhou pra mim e sorriu, retribui com outro sorriso.

Antes de eles receberem alta do S. fiquei sabendo por outra acompanhante, a Sol, que já tinha colocado a Dona em pé no andador, um ótimo sinal de que uma recuperação não tardaria.

Não tive mais notícias deles.