Os aliados do Capetalismo

A sociedade muitas vezes não vê as máscaras que fazem parte do dia-a-dia. Uma camada de pasta colorida com retoques brilhantes cobrem as preocupações, o cansaço e o estress das pessoas que pontualmente irão atender ao público. O comércio é abstrato, depende das pessoas mas se esquece que também são pessoas que os fazem crescer internamente.

Todo dia no mesmo horário a cena se repete, primeiro a maquiagem, depois as recomendações e por ultimo um grito de bom-dia simbólico, só para não deixar que o desânimo caia de vez sobre os funcionários. Ao iniciar a jornada não se deve esperar muito mais do que um ou outro bom-dia bem apressado da parte de seus clientes, infelizmente as pessoas já começam o dia supondo que o você não é adequado para sua função e que ela não pode aguardar tanto tempo para ser atendida. Mais uma vez devemos usar a máscara que nos acompanha, sorrindo e fingindo que as palavras lançadas nos fazem crescer profissionalmente.

O tempo decorre em seu normal, ao longo do dia reclamações sobre mercadorias, gritos devido a falta de um centavo no troco, expressões descontentes por ter que esperar o atendimento preferencial entre outros detalhes cotidianos. Mesmo depois de tudo isso, ainda assim as pessoas lhe olham como se você não fosse uma pessoa e sim um atendente, uma espécie de robô ou outro tipo de geração criada apenas para aquela função, não percebem que você também sente cansaço, também possui família e também respira.

As sacolas não param de circular, todas cheias de roupas e adereços. O mais interessante são as expressões na hora em que o consumidor está comprando, tem um olhar de imponência, superioridade,diferente. As regras não param de saltar aos ouvidos, os chefes estão atentos para as vendas e você é ponto-chave da situação, palavras como metas não saem nem de seu subconsciente, uma pressão subliminar da qual convive com você sem avisar. A sociedade pede: comprem, comprem, comprem. E você ali parado reflete nas inconseqüências que decorrem. O mercado usa de uma psicologia tão feroz que leva as pessoas a comprarem incondicionalmente.Aproveitam cada época do ano para determinados produtos e fazem sua propaganda em cima disso, como por exemplo no inicio do outono diminuir bruscamente a temperatura do ar condicionado da loja para que seus clientes tenham a sensação térmica de frio e aproveitem as promoções da nova coleção de inverno comprando os casacos e blusões da nova estação.E caso não tenham condições para isso, muitas vezes elas furtam só para fazerem parte do circulo capitalista envolvente.

No fim do dia, muitas vezes dobrado devido ao movimento e às vezes efetuado doze horas de trabalho, a porta principal da loja é baixada até o centro, não pode ser fechada para o encerramento do sistema e a dispensa dos funcionários, pois ainda há clientes escolhendo suas mercadorias e circulando com as sacolas. Os passos são vagarosos, a tranqüilidade bem transparente, eles circulam olhando cada detalhe, inclusive o fechamento de alguns caixas, a limpeza do chão, o recolhimento das peças caídas, cena de final de festa. E mais uma vez lhe olham e não enxergam as quase doze horas que você esteve de pé dizendo que ele era bem-vindo na loja e atendendo-o com o mesmo sorriso das dez da manhã.

O expediente termina, e termina mesmo. Não há mais possibilidades de diversão aos finais de semana, sábado é riscado de qualquer calendário para quem trabalha em comércio. Natal, Ano-Novo, feriados, aniversários, casamentos... tudo fica em segundo plano. Isso é injusto com seus funcionários, a empresa deveria possuir um quadro suficiente para disponibilizar folgas intercaladas entre finais de semana e datas comemorativas a seus trabalhadores. O cansaço por vezes é tão nítido que mal pode ser escondido para o próximo dia, muitas vezes passa de mental para físico, e muitas vezes resulta em doenças, depressões e conseqüentemente demissões.

No outro dia a máscara se renova e tudo volta a mesma rotina, e as mesmas pessoas entram e as mesmas não lhe notam e as mesmas ainda usam o pensamento de que sua única função na sociedade é aquela, “de que você está ali para isso”. Uma frase completamente infeliz mas que virou bordão de qualquer consumidor arrogante. Já dizia Charles Chaplin, “Vós sois homens e não máquinas”. Será tão difícil de compreender que somos iguais a vocês?

Obs: Este texto refere-se ao comércio em geral, não é direcionado ou contém nome de qualquer empresa do ramo.

Li Porfirio
Enviado por Li Porfirio em 06/05/2008
Código do texto: T977686