Indo...
Tarde. Voltei para casa em uma hora que sabia que ela não ia gostar, mas já estava acostumada. Entrei rápido em casa, sem prestar a mínima atenção na rua. Abri a porta sem querer fazer barulho, pois talvez ela estivesse dormindo. Estranhei que tivera deixado a porta aberta.
Subi as escadas com uma sutileza sem igual. Fui pensando no dia seguinte. Havia encomendado flores e um vinho, não pretendia sair à noite. Mais um ano juntos! Havia quase uma eternidade que minha alma havia se juntado à dela.
Iria presenteá-la com sonetos. Sonetos que retratavam nossos sonhos! Devo dizer que tive que fazer um esforço tremendo para lembrar, mas escrevi sobre cada um deles. Ai, o amor... Meu amor! Ela ia ficar tão feliz...
Nas escadas, não fiz nenhum ruído. Abri a porta querendo vê-la na cama, me esperando. Havia, porém, apenas uma carta. Ainda quente, ainda cruel, ainda amarga, mas sem nenhuma lágrima. Li as primeiras palavras, mesmo já sabendo tudo o que estava escrito.
Não consegui continuar lendo. Fui espiar a lua e a rua, vazias, mas não tão solitárias quanto a minha alma. Olhei para a última parte mezzo-iluminada da rua e a vi. Dura. Seca. Longe. Indo.