CONFERÊNCIA CULTURAL DOS AFRO-DESCENDENTES... UMA NOITE SEM DÚVIDA INESQUECÍVEL....

Conferência Cultural dos Afro-Descendentes.

A abertura...

Uma noite sem dúvida inesquecível...

De Abilio Machado.

Estava saindo de um de meus trabalhos quando me deparei com um antigo amigo, alegre meu guri veio com aqueles dentes brancos aflorados e foi logo dizendo:

__ Que vai fazer sábado? Eu estou organizando o 1º Seminário sobre Afrodescendentes, você tem alguma coisa? Quer fazer alguma coisa?

__ Tenho algo escrito de algumas pesquisas, pois pretendo junto com o professor de capoeira realizar um espetáculo no fim do ano sobre a consciência negra, ele me convidou e eu estou correndo atrás... Posso te mandar o material da pesquisa. - repliquei.

__Ah, mas não quer apresentar nada? – falou ele.

__Eu posso levar alguma poesia, algo de lúdico e útil aos presentes, qual vai ser o público?-curioso.

__Vai ter convidados lá dos palmitais. -indaguei.

__Nossa, vai ser bom, tenho compromisso, mas vou ao seu para dar uma força a teu trabalho. - meus olhos avivaram, pois adoro público.

__Fechado?- disse ele.

__Eu estarei lá, não falte. – disse e corri, pois tinha outro compromisso naquele momento.

Chegamos, depois de convencer minha esposa que havia dado minha palavra e por isso não iríamos no compromisso dela e sim ao meu. Quase perdemos o ônibus, mas as sete e quinze subíamos as escadas da Casa de Cultura.

Já no hall encontramos um grupo de amigos, um deles Mordezin, do partido verde., que por duas vezes fez colocações sobre a necessidade de um político representativo na câmara de vereadores ou na dos deputados para apresentar leis aos negros, por isso e aquilo, em um dos momentos falávamos de algo longe do assunto, mas passou...

Iniciam o processo de apresentação da mesa, que eu sempre me pergunto por que mesa? Sempre mesa, gastam mais tempo falando eu ganhei isso ou eu ganhei aquilo ou eu farei aquele outro do que a direção correta ao que está sendo apresentado.

O Sr. prefeito começou sua apresentação dizendo de sua felicidade por estar ali, que não falaria muito, pois já tinha outro compromisso, mas estava ali com apreço para participar do movimento e... Ixi acho que foi só isso.

O próximo a falar foi o Sr. Cônsul do Senegal delegado para o PR, SC. e RS. Dr. Oziel Moura dos Santos, que iniciou sua apresentação com o tratado sobre Filosofia Empresarial e Entidade Vencedora. Que apresenta algumas metas: parceria, informação, visão macro, profissional, empreendorismo, visão de futuro, preço competitivo?(eu também estranhei, mas, depois vim a saber que é Diretor Geral Nacional de Comércio Exterior do Corpo Consular do Brasil), qualidade, transparência, lealdade, visão humanista, velocidade nas decisões. Concordo também parecia que estava frente a uma gama de empresários e fazia uma reformulação de atitudes e fez quando começou a fazer suas referências à comunidade presente. Aconselhou aos afrodescendentes presentes à busca de organização, de parceiros para conseguir e conquistar; para que busquem uma maior integração entre eles, na comunidade.

Comentou sobre seu pai ter encerrado sua carreira de jogador de futebol no Internacional FC de Campo Largo.

Que só vão ter sucesso se estudarem, se esforçarem-se a aprender, pediu ao Sr. Prefeito mais atenção à Educação, à cultura e um trabalho voltado a auto estima da população negra. Que se faz necessário a busca da informação, a importância da informática nos dias de hoje. O aprendizado de línguas, tentar oportunizar (políticos adoram estas palavras atualmente).

O Sr. Oziel afirmou que o simpósio tinha por maior objetivo a sensibilização e foi quando inquiriu à comunidade presente suas necessidades que rolou a sai ajusta ao Sr. Prefeito, pois a primeira reclamação era sobre o moço motorista que dorme dentro da ambulância e se nega em fazer os translados que a população precisa, ou quando faz diz que só vai até determinado lugar e quem quiser faz o resto a pé ou de ônibus.

E quebrando o protocolo o Sr. Prefeito toma o microfone das mãos do Cônsul e começa a citar as futuras instalações do Hospital Infantil que ainda está em fase de conclusão há um ano e que na verdade é uma construção do governo, levantou a questão do asfaltamento da estrada do Serne e comentei a meia voz com minha esposa e aquela placa próximo à sua mãe diz que é o governo quem está construindo, não é?! Mas o caso do motorista dorminhoco não ficou esclarecido. O nosso amigo tentou remediar, mas ficou no ar o total desconhecimento dos seus funcionários.

Mas a maior gafe foi dar exemplo sobre os gêmeos, que o que reclamava sobreviveu e o que ficou calado morreu por não ganhar alimento, os comentários perto foram avessos a isto, pois está tão fora da atual realidade que não sabe ele que quem reclama é marginalizado, não é atendido, não é ouvido, o que se cala tem mais chance por ficar calado e aceitar as migalhas... Um casal a meu lado disse ser infame a colocação, pois foi total infelicidade de ato nervoso do homem, a tanto que ambos levantaram-se e foram embora, retornando só depois da despedida do mesmo com seu chefe de governo.

Citações lindas do Sr. Ozeil que ficarão gravadas foram que ‘a Alma não tem cor’ e não há preconceito que supere a força de vontade de querer crescer.

E passou slides sobre o Senegal, os pontos turísticos, hotéis cinco estrelas, o palácio do governo, dos deputados, do seu artesanato, imagens de seu litoral... E... Opa. Faltou mostrar o seu povo... Que pena... Não havia nem uma visão geral dos habitantes do Senegal.

Logo depois ganhou a palavra o Sr. Glauco, do Instituto Clóvis Moura, que salientou que até 2005 o governo não tinha dimensão da quantidade de núcleos de afrodescendentes que estavam espalhados pelo Paraná, que dos que já foram cadastrados e com reconhecimento de legalidade o Palmital dos Pretos de nossa cidade estava entre os 36, e que muitos ainda estavam em estudo. Tal desconhecimento destas comunidades fizeram que houvesse perda de identidade, de história, de material cultural, muito ficou perdido e que o estado está em atrazo ao atendimento a estas comunidades. Disse sobre as conquistas que chegam moradia, saneamento básico, horta comunitária, sua produção e que este quilombola necessita de um atendimento diferenciado.

Falou sobre o se olhar nos olhos e pedir, reinvidicar, sobre os direitos, falou da força do povo... Aí surgem perguntinhas inocentes colhidas na saída: querem que sejamos fortes, mas não existe muita comida em casa, querem que sejamos inteligentes e vai uma Kombi para levar as crianças quase uma hora para estudar, as crianças já chegam cansadas.

Sua citação marcante foi: Devem ser unidos para o essencial, e isso que fazem vai repercutir além.

Logo após foi chamado à apresentação o Sr. Antonio Carlos Gomes, famoso atleta brasileiro que contou parte de sua história desde sua infância até os dias de hoje na área que atua dentro do Clube Atlético paranaense, contou de seus sonhos, dos objetivos alcançados, de sua experiência de onze anos estudando em Moscou no período ainda da guerra fria, divagou suas aventuras como de sua visita a uma comunidade russa que nunca havia visto um negro de perto e o quanto isto causou pânico na cidadezinha. Anos em que rompeu barreiras e precisou de coragem para se manter firme em seus propósitos. Dr.Antonio conta com 30 livros escritos publicados em diversos países. Contou de sua recém experiência no aeroporto de um país vizinho onde o motorista da limusine o esperava com a famosa plaqueta com o seu nome e quando se aproximou e se identificou não foi acreditado e foi expulso sob ameaças de ser preso, e só mais tarde foi corrigida sua situação, pois fora convidado para fazer a abertura do Congresso neste país.

Suas citações: ‘Fazer o melhor sempre’. ‘ Quem quer algo não deve ficar esperando cair do céu. ’

O representante da Fundação Getúlio Vargas, devo-lhes o nome, falou sobre a responsabilidade social, que inúmeras empresas querem investir na comunidade negra, pois é hoje foco da atenção da chamada ação positiva de política pública. Indagou sobre o porquê só voltaram os olhos agora, (a resposta é obvio é que cada ação destas dá uma margem de desconto nos impostos aplicados, nada é feito por consciência), discorreu sobre que estas medidas sócio-ativas são frutos dos movimentos negros, e que a comunidade deve buscar respostas nela mesma e que deve ser empreendedora na busca de seus direitos, que este seria o primeiro passo para se auto aprender sobre o seu potencial, que na atualidade as dores são maiores do que a comunidade apresenta, que o mundo está preocupado com o aquecimento global, com a falta de grãos, com desmatamento e etc.

Foi trazido à mesa o professor Luciano Okraska, que falou sobre a inclusão social, sobre os projetos sociais e da importância ‘a ele’ das cotas. Pediu para que se eliminasse a palavra raça dos discursos feitos, que a denominação é etnia para a venda da hegemonia negra (isto me assustou). Que nas suas colocações não seria suave falaria a seco sobre um pouco de tudo, que o negro veio ao Brasil trazido para substituir o fracasso na escravatização dos índios. Falou sobre a diferença que sempre houve nas escolas sobre negros e brancos, que limpar o nariz de um era diferente do outro, que se na escola da comunidade não tiver brinquedo de cor é para denunciar, pois é lei ser oferecido este material personalizado (falar isto para quem nem mesmo tem caderno torna-se quase uma agressão). Lembrou das palavras segregativas como macaco, cheiroso, cabelo ruim, se não cagou na entrada faz na saída. Explicou sobre a composição de mais melanina no corpo de cor. Sobre as cotas falou sobre um artigo em que se afirmava sobre a necessidade da obrigatoriedade para cumprir uma deficiência que o estado tem com a população negra desde a abolição, que as cotas fariam uma proposta de conclusão à dissolução da escravidão (será?), que já que o sistema errou deve arcar com a conseqüência. E terminou com a indução de que um dia os remanescentes terão direito a uma indenização sobre os danos ocorridos ( confesso que isto começou a me assustar, pois tanto isto quanto as cotas me fazem perguntar não seriam mais fomentadores de pres - conceitos entre as variadas etnias?).

Logo depois meu velho amigo Luiz Adão, que já concorreu até a cargo de governador, hoje trabalha na área de educação com muitos projetos interessantes. Falou rapidamente sobre as oportunidades que as escolas comunitárias e associadas apresentam às comunidades em que estão presentes em todo o País. E que todos os homens são iguais perante Deus.

O assessor do Vice Governador Pessutti, o Sr. Valter Calunga falou para a comunidade não se acomodar, que deve aprender, pois o lá na frente depende da dedicação de cada um, que ficar de braços cruzados não lhe oferecerá nada de bom para colher no futuro. Que os valores estão na busca de conhecimento, atrás de seus desejos, com dedicação, que devem ser unidos, que devem gostar de aprender, não calar, fazer manifestações e reinvidicar. Que estará presente se for convocado, sempre e será cobrado por isso.

O organizador Valdemir das Neves Reis, fez o encerramento, falou sobre aqueles que trabalharam contra a sua vontade em realizar o seminário, que houve um propósito de Deus para que a mesa fosse formada daquela maneira, que alguns tinham falado que estava muito político (inclusive eu falei isto a ele), que ele trouxera políticos para ouvir os gritos de socorro, dos pedidos de ajuda, a necessidade de escola, saúde, que... O que vocês queriam que acontecesse?(perguntou e eu respondi)

___ Que os políticos parassem de politicagem seria um bom começo.

___Depois conversamos sobre isso... - Falou. - Levanta você aí, este homem mora numa tapera, feita de lascas de costaneira e barro e cozinha em lata de cera. – emocionado. - Como não trazer políticos para fazer isso? Aquela mocinha de vermelho queria dar aulas ela mesma, disse que precisava apenas dumas cadeiras ou uns bancos e faria isso.

___Poxa você me convidou a vir fazer uma apresentação (olha a indireta, ou ele estava bravo comigo ou havia esquecido) e até agora só fiz anotar e vi falarem sobre reinvidicações, o rapaz que o motorista dorme na ambulância e não os leva que precisam disto e daquilo, e inúmeras promessas, estamos aqui há três horas e duas delas foram perdidas com propaganda política. Você falou da mocinha ali, mas você precisa saber que ela pode ter vontade, mas a mesma política que você se agarra vai mandar aparecer um pedagogo dizer que ela está exercendo profissão sem qualificação.

___Peraí... Não foi perdido não, há um motivo. Mas já te cortando vamos encerrar agradecendo a presença de todos, mas antes vamos “dar um Certificado Presencial como lembrança desta noite”...

E assim um por um dos formadores da mesa ganharam um papelzinho escrito como lembrança, eu amarguei minha desolação, pois, vi nitidamente o rapaz do cerimonial ler algo e olhar para o meu lado e dizer um está de brincadeira e passar para baixo o reservado, que logo depois foi escondido lá nos fundos numa pilha a ser delegada a posteriore. Um cúmulo este treco de homenagem, sei que serve, para mim, por exemplo, me habilitaria para apresentar em anexo a um de meus projetos sociais, ficou o Valdemir me devendo esta, mas o que me deixa agoniado é que aquele povo que lá estava é quem merecia mais, mais que um cachorro quente e refrigerante, geralmente estes certificados são feitos e entregues na saída, às escondidas sem tomada de tempo, sem causar constrangimentos.

Aí escolheram três representantes para ganhar papelzinho também. O que dizer a aquele senhor que cozinha em lata e mora na tapera, leva aí um papelzinho que depois a gente resolve e troca sua latinha? O que dizer a todos que gastariam três horas para retornar às suas casas? Um certificado? O que dizer à menina que ‘faria’ isso o de lecionar? Caramba teria que já ter feito! Falaram em levar professores, nenhum educador vai assim do nada, quem vai longe quer ganhar mais. Falaram outras coisas que me pareceram tão sem nexo que não as anotei... Pois vejo por meus colegas, muitos deles nem mesmo atendem o telefone se estão de folga com medo que os chamem para cobrir faltas ou nem comparecem em reuniões que aconteçam fora do horário de expediente. E são fatos.

A demonstração do cunho político no seminário estava aí, não se organizou antes de se apresentar à política e sim os levaram para eles incitarem à organização. E ali estavam presentes PMDB, PV e PSDC, fora os obscuros que pleiteavam uma oportunidade e não foram chamados.

Quando fui convidado, fui induzido a pensar no objetivo, dado ao fato de me abster de envolvimento partidários:

__Faça algo que os incentive, que valorize, do seu trabalho. – disse ele.

Aí eu peguei minha materiazinha sobre minha amiga Dila- Odelair Rodrigues da Silva, uma atriz negra maravilhosa que como anjo passou pela minha vida em várias ocasiões, ganhadora de vários prêmios e ainda chamada de Primeira Dama do Teatro Paranaense. Falaria sobre ela, já que cultura, arte e poesia é minha área. Faria o ‘Cântico do Velho Joaquim’ que conta a história de seu pai e de seu avô, ambos escravos, Um texto maravilhoso que escrevi para uma palestra quando ainda estudava desenho industrial no Cefet.

Além de levar comigo gravado em CD-ROM as matérias sobre Zumbi e sobre o 13 de maio. E iria encerrar com o exercício grupal coração, trazendo todos para sua realização.

Cheguei a conversar com meu velho amigo Valdemir na saída, assim meio naquela de saber por que não havia me chamado e ele falou sobre esquecimento... Mas... Espero que não seja isso, vi um brilho da velha política naqueles olhos que conheço desde 1994. Fazem já quatorze anos que nos conhecemos, caramba!

Todo o planejamento falhou, deixei de ir a um compromisso voluntário à tarde onde auxiliaria com meu testemunho a dezenas de jovens para me dedicar em preparar material para algo a meu ver grandioso, deixei então de ir em companhia com minha esposa no compromisso que ela tinha à noite para fazê-la ir me ver, afinal como ator amo aparecer, para ela ver a aplicação de minha metodologia de grupo e putz...

Eu pensei que seria uma noite onde a comunidade faria apresentações da cultura remanescente, que haveria uma demonstração do que produzem, tipo contar ao mundo o quem sou, para aí reinvidicar o que quero, dado que a chamada esta assim:

‘Conferência CULTURAL dos Afro-descendentes para um novo milênio’.

Que o seminário seria o pontapé inicial para a organização da comunidade. Mas deveria ser chamado de conferência política sobre afro-descendentes para o novo milênio..

Cheguei em casa, pedi desculpas à minha esposa que a esta altura, 23horas e 40 minutos estava uma arara comigo, mais brava ainda pois para voltar tivemos que apanhar um táxi e estamos praticamente a zero no orçamento mensal.

Eu estou doidinho para ver neste domingo que amanhece o que vai rolar... Lembrando que na saída nem mesmo fui convidado a retornar, mas adorarei estar presente.

Pois esta noite foi:

Uma noite sem dúvida inesquecível.