AMAR O SEMELHANTE/DIFERENTE

A questão aqui não é acreditar em Deus. É saber crer Nele da nossa forma e agir com moderação com as pessoas que acreditam de uma forma diferente. Não se prega aqui o sincretismo religioso. Cada um pode e deve ter sua religião e segui-la. É bom que se tenha fé. A questão levantada é a capacidade ou não que se tem de respeitar que o outro é resultado de uma bagagem de aprendizagens e vivências diferentes da nossa.

O fanatismo é uma doença social, como outras tantas. Os acontecimentos na Irlanda do Norte, por exemplo, são motivos de vergonha no mundo todo para católicos e protestantes e têm causado repreensão e preocupação para líderes das duas religiões. Afinal, Cristo prega o amor, sem intolerância.

Mudar alguém é com o exemplo da nossa própria vida, do próprio agir (e isso só acontece com a vontade, colaboração do outro que nos vê e escuta), não com admoestações verbais ou agressões. "Sejam praticantes da palavra, e não apenas ouvintes, enganando-se a si mesmos" (Tiago 1:22).

Se alguém, por convicção própria, acha que o outro está no caminho errado, tenha cuidado! Cristo pregou repudiar o erro (você não tem que concordar com coisas que considere erradas), mas amar aquele que erra (você não tem que ser juiz do 'erro' alheio e pode aprender a gostar de pessoas que pensam diferente de você). O radicalismo deixa a dúvida se há uma verdadeira fé em quem o pratica.

Não seriam o ego e a vontade de poder, de domínio, de ser o certo, de ser o senhor da verdade, que estariam por trás desses atos humanos 'licenciados pela fé?', ao invés do amor a Deus e aos semelhantes? Afinal, quem ama, não maltrata, não destrói. Como um cristão pode estar certo se afastando do modelo que foi Cristo?

Graças a Deus, aqui no Brasil, os incidentes são bem mais moderados, mas achei por bem fazer este comentário porque, ainda assim, vê-se, mesmo que de forma reduzida, alguns movimentos bastante radicais, beirando ao desrespeito ao próximo e à violência física. Cristo mesmo disse: “Eu vim para que todos tenham vida” (Jo: 10, 10). Claro que, assim como o Pai, respeitou o livre arbítrio. Nunca obrigou ninguém a segui-lo. Apenas ensinava da forma melhor que ele podia, dada a dificuldade humana em entender essa sua mensagem.

Quando Cristo resumiu os Dez Mandamentos em um, que são dois (Mateus 22:37-40), "Ama o Senhor, o seu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o seu entendimento (...)" ou seja, principalmente, respeite a Deus, agrade-O com suas boas ações, não use seu Santo nome em vão, não coloque palavras suas nas intenções de Deus, que, com certeza, você desconhece! Além de inacessíveis, as intenções divinas estão muito acima da capacidade de interpretação humana, sempre confusa, até quando o homem reflete sobre si mesmo; e "(...)Ama o seu próximo como a ti mesmo." pode muito bem ser traduzido para respeite o outro como você gostaria de ser respeitado.

Na verdade, eu considero uma blasfêmia um homem se auto-declarar como porta-voz do Ser Supremo, a que chamamos Deus, para conseguir seus intentos, muitas vezes, tão pequenos de colocar sua 'verdade' (ponto de vista), vontade (de ser obedecido, de ser dono da verdade), necessidade (de atenção, de parecer ser maior do que é), cobiça (vontade de possuir poder, dinheiro e demais) e raiva (de não ser como gostaria, vinda da inveja, da ignorância) acima dos outros, seus semelhantes. Tudo isso é muito perigoso! Perde-se a sensibilidade, o temor, ao falar em Deus e de Deus. Hoje, não é raro ouvir alguém afirmando o que quer e dizer que é a Palavra de Deus.

Só Cristo pode dizer “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, a não ser por mim” (João 14:6). E Ele assim se definia: "(...) aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração (...)" (Mateus, 11:29). Ele era manso (misericordioso, bondoso com todos) e humilde de coração (tentava se colocar como um igual, embora pudesse ser Todo Poderoso entre os homens, tinha simplicidade na forma de ser ao estar entre nós e generosidade, boa vontade no trato com os que convivia).

No entanto, Jesus não gostava de coisas erradas, atos ou palavras, sempre que acontecia perto de Si, tentava ensinar, da melhor forma possível, tanto que usou parábolas, de modo a não ofender ninguém mas deixar o seu recado. Cada qual escutava e as interpretava tomando-as como lição para si ou reflexão sobre o que acontecia à sua volta. Também não gostava que um homem se sentisse superior ao outro (usava o termo semelhante), pois aquele que assim se julga (cego, esquecendo-se de seus próprios erros), vai atirar a primeira pedra.

Cristo escolheu ficar entre os desacreditados, os perseguidos, os pobres e os doentes para dar-lhes atenção especial e esperança, numa época em que apenas quem era poderoso ou rico era valorizado como gente e o doente era marginalizado, pois considerava-se que tanto o fato de ser pobre quanto o de ser doente era castigo de Deus, pelos próprios pecados cometidos ou pelos dos pais. A ignorância reinava e servia aos ricos e poderosos. Os pobres e doentes sentiam-se indignos.

Ele também valorizou a mulher quando o ser humano mulher, na maioria das vezes, era visto como sendo de segunda importância, sendo tratada ou como empregada caseira ou como procriadora. Dentro da família foram valorizadas como mães e esposas que deveriam ser amadas, respeitadas e ouvidas. Muitas mulheres se tornaram discípulas.

É triste também ver as interpretações da humildade de Cristo como pobreza (de recursos materiais) ou como humilhação. Cristo nunca foi pobre, pois Deus é criador de todo o universo e os seres que nele habitam, não só da terra. Ele sempre teria os peixes que quisesse, poderia cobrar pelas curas, poderia transubstanciar matérias, mas nunca usou seus poderes para fazer dinheiro e acumular riqueza. Nunca foi humilhado, porque o que aconteceu com Ele estava nos planos divinos de modo a ser a única forma de comover e mudar tantas pessoas ignorantes, mas de bom coração, de salvar vidas e almas. Quando ainda não haviam jornais, as notícias sobre a vida de Cristo, correram o nosso mundo terrestre, foram globalizadas.

Nunca houve na humanidade revolução maior que a revolução cristã. Não houve, em tempo algum, líder religioso ou de tempos de guerra armada cuja conquista tivesse tal abrangência. Além da abrangência, a forma foi inédita. A revolução cristã foi uma interna, aconteceu no coração do homem e, a partir dele, mudou o mundo. Suas sementes foram o bom exemplo unido às boas palavras; seu estopim foi uma 'morte' na cruz (Ele tinha que passar pela morte humana), coroada com uma ressurreição (Ele provou que era diferente, antes de se despedir) e com uma assenção aos Céus (Ele provou que era diferente, ao se despedir), porque o ser humano precisava acreditar para mudar. Cristo, entre nós, foi O Inigualável.

Para quem não atribui valor aos seus ensinamentos, o que posso dizer? Fiquem atentos! Até mesmo muitas seitas e religiões que não O acreditam como filho de Deus, valorizam os seus ensinamentos como um grande profeta, dada a inquestionalidade de que Ele era Iluminado de luz Divina, como acontece no Islamismo dos mulçumanos, por exemplo, que o considera um de seus profetas mais perfeitos.

CRUZ, Ana da. Respeitar o Semelhante/Diferente (Discurso Religioso). Recanto das Letras, 2008. Disponível em URL: [http://www.recantodasletras.com.br/autores/anadacruz]

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Ana da Cruz
Enviado por Ana da Cruz em 01/11/2008
Reeditado em 09/11/2008
Código do texto: T1259451
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