Homilia na Missa do Crisma 2010 - Mozarlândia - Goiás

Homilia na missa do Crisma 2010, em Mozarlândia – Go.

Dom Adair José Guimarães, Bispo de Rubiataba/Mozarlândia

Amados sacerdotes, religiosas, consagrados e consagrados, seminaristas, irmãos e irmãs aqui presentes em nossa Co-Catedral de Mozarlândia.

1.Já é do conhecimento de todos a realização desta concelebração eucarística do bispo com o seu clero na quinta feira santa. Um momento profundo de unidade e louvor a Deus pelo sacerdócio ministerial e pelo trabalho de cada padre no seu específico apostolado. Esta celebração é de grande significado para nossa Igreja. Hoje os padres renovam diante do bispo as promessas da sua ordenação sacerdotal.

2.Terei a imensa alegria de poder abençoar, durante esta celebração, os óleos do batismo, do crisma e dos catecúmenos e entregá-los aos padres para que possam usá-los nos momentos importantes da vida paroquial quando se administra os sacramentos. Qual o significado de cada um desses óleos? O óleo do crisma significa o dom do Espírito Santo nos sacramentos do batismo, da crisma e da ordem; o óleo para o batismo e o óleo para os enfermos são sinais da força que liberta do mal e sustenta na provação da doença. Através do óleo e da unção, exprime-se a riqueza da nova existência em Jesus Cristo, que o Espírito Santo continua a transmitir à Igreja até o fim dos tempos.

3.Hoje é um dia de importante relevo para nossa liturgia. Dentro da Semana Santa, a quinta feira tem um significado teológico e espiritual específicos para nós católicos, pois neste dia celebramos a instituição do sacerdócio católico e da sagrada Eucaristia. Pela manhã os bispos do mundo inteiro celebram com seus presbitérios, tendo em volta de si seus colaboradores imediatos: os padres, ministros do altar, presbíteros da esperança e do amor. À noite, em todas as igrejas do mundo, findo o espírito quaresmal, celebra-se o início do Tríduo Pascal com a celebração da Instituição da Eucaristia, alimento de amor para a Igreja que caminha rumo ao Reino Definitivo.

4.Em pleno Ano Sacerdotal, conscientes da grandeza do ministério a que fomos chamados e, ao mesmo tempo, de nossa fragilidade, recordemos, inicialmente, a palavra do grande “Doutor das Nações”, na segunda carta aos coríntios: “Esse tesouro nós levamos em vasos de argila, para que todos reconheçam que esse incomparável poder pertence a Deus e não é propriedade nossa. Somos atribulados por todos os lados, mas não desanimamos; somos postos em extrema dificuldade, mas não somos vencidos por nenhum obstáculo; somos perseguidos, mas não abandonados, prostrados por terra, mas não aniquilados” (4,7s). Em Fil.4,8-9 o mesmo Apostolo apresenta a receita para manter a fidelidade: “ocupem-se com tudo o que é verdadeiro, nobre, justo, puro, amável, honroso, virtuoso, ou que de algum modo mereça louvor. Pratiquem tudo o que vocês aprenderam e receberam como herança”.

5.O Evangelho que a Divina Liturgia nos oferece nesta celebração nos transporta para a sinagoga de Nazaré, terra natal de Jesus, onde Ele inicia sua missão e assume seu projeto messiânico: Tomando o livro do Profeta Isaías, texto da 1ª leitura, Jesus afirma: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar a remissão aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano da graça do Senhor” (Lc 4,18-19). Diz o versículo seguinte: “Todos na sinagoga o olhavam atentos” (Lc 4, 20b). Convido-os, então, caros presbíteros e demais irmãos e irmãs a, igualmente, olharmos atentamente para Jesus e, “inclinando o ouvido do coração”, como sugere São Bento no Prólogo de sua Regra, escutar e acolher a Palavra e, sobretudo, ter coragem de fazer da Sua a nossa missão.

6.Olhar atentamente para Jesus nos conduz, primeiramente, a uma atitude de contemplação. Gesto fundamental e indispensável para o verdadeiro discípulo. Sem buscar uma intensa vida de oração poderíamos cair no superficialismo e esvaziamento. Unidos ao Senhor nunca vamos nos sentir sozinhos, abandonados ou fragilizados. A contemplação vai nos ensinar que necessitamos de momentos de solidão que nos ajudarão a construir comunhão e participação. Sem vida de oração, o padre não passa de mero propagandista de doutrinas ou negociante de coisas sagradas. Os que possuem mais tempo de ministério lembram muito bem do nosso contato com os escritos do saudoso Teólogo Jesuíta Alemão, Karl Rahner, falecido em 1985 que ensinou a nós padres o seguinte: “Só ao rezar, está o homem inteiro imediatamente presente diante de Deus. A fé do Presbítero de hoje é a fé de um Presbítero que reza, de um Presbítero misticamente contemplativo, ou não é fé nenhuma. O Presbítero há de ser orante, se quiser ser crente e profeta da Boa Nova. Temos que ser Presbíteros que rezam. Que suportam rezando as trevas da vida. Mesmo se sua prece for participação na agonia do Horto ou no grito do abandonado pelo Pai na cruz”.

7.Quinta-feira Santa é o dia do nosso sacerdócio, dia em que, especialmente os presbíteros, são convidados a entrar no cenáculo e participar, com Jesus, da refeição pascal. Ele que se deu como alimento para fortalecer nossa fraqueza, mandou que repetíssemos aquele gesto para celebrar sua memória. Que cada Missa que, indignamente, celebramos “in persona Christi” nos anime a, incansavelmente, edificar e testemunhar o “Reino” neste nosso chão marcado pela dor e sofrimento de tantos irmãos e irmãs, vítimas da injustiça e da desigualdade social e nos comprometa sempre mais com sua caminhada e seus desafios. São as ovelhas do nosso rebanho. Vivemos numa Diocese em que as marcas da injustiça e da falta de gestão se faz ver: a chaga do desemprego; a dor dos pais que vêem suas filhas migrarem para a Europa para se prostituirem; o flagelo das drogas que dizima o futuro dos jovens e espeta uma flecha de dor no coração de tantas famílias; famílias acampadas a espera de uma pedaço de chão que a incompetência e a inércia do Governo Federal não deixa acontecer; assentamentos que caminham para a favelização rural porque o mesmo governo não coloca em prática objetivamente o Plano da Reforma agrária; uma natureza exuberante com a nossa que fenece a olhos vistos porque os órgãos de defesa do meio ambiente são ineficazes e corruptos, favorecendo o desmatamento irracional, a pesca predatória e tantos outros desmandos como muito bem foi recentemente denunciado no Jornal O Popular.

8.O padre, antes de tudo, deve amar os pequenos e injustiçados, pois neles podemos contemplar a face do Cristo Crucificado. Não podemos ficar alheios ao dever profético de denunciar com a Palavra de Deus as estruturas de pecado que temos em nossas paróquias. Uma evangelização bem feita, concreta, que na prática transcende a proposta teórica que está no papel de tantos documentos e estudos fecundará os caminhos da esperança da Igreja como nos assinalou o Documento de Aparecida. Como nós estamos evangelizando? Como o senhor, caro se padre, está anunciando o Evangelho e fazendo Jesus acontecer no coração dos fiéis a ti confiados? O caminho para o saneamento de tantas injustiças advinda do pecado passa pela evangelização concreta e coerente que leva as pessoas à experiência pessoal de Deus. O maior excluído do mundo atual é o próprio Deus. Nós, seus ministros, O traímos como Judas quando não importamos em anunciá-lo e torná-lo amado e adorado pelas pessoas de nosso tempo. O padre que não evangeliza e não ensina os leigos a fazê-lo emperra o processo da Redenção Divina. As chagas do mundo precisam ser curadas com as chagas de Cristo. As injustiças decorrem da falta de conversão e aceitação da fé cristã. Onde Cristo se faz conhecido, amado e acolhido. Será que a emergência do neopaganismo que assola o mundo com a busca dos prazeres e com a pseudo cultura do relativismo não nos incomoda? Será que não estamos nos acovardamos ao fugir da responsabilidade de promover a evangelização de maneira coerente e profunda a partir da experiência do Espírito Santo em nós?

9.Dos sacerdotes a Igreja espera a fidelidade, como Cristo o foi ao Pai. Ao renovar as promessas sacerdotais neste dia solene, que o nosso coração seja cada vez mais indiviso. Sejamos discípulos do amor profundo de Jesus. É belo ser padre, é relevante viver este ministério na fidelidade, como Cristo nos testemunhou na sua comunhão de fidelidade ao Pai. O sacerdote integro, respeitável, afetivamente integrado e despojado faz um bem inestimável às almas. Não há uma crise do celibato em nossos dias como vocifera tantos inimigos da Igreja; existe sim, uma crise do humano, uma crise do amor. Viver coerentemente o celibato é viver um carisma, um carisma dado por Deus. O sacerdote, os religiosos e demais celibatários acolhem este carisma que vem do Senhor como estado de vida por amor e para melhor amar e servir.

10.“O celibato é um carisma, intervenção de Deus. Então, o celibatário não é alguém que abomina a sexualidade, mas alguém que ao celebrar o afeto e perceber que o sexo é algo tão maravilhoso e tão bonito, é capaz de entregá-lo para Deus. Entregar a sexualidade bela para Deus. E como vamos entregar? Isto é carisma, é dom de Deus. Pois é ele que nos dá a capacidade de amar. Se existe alguém que ama na face da terra é por que o Espírito Santo nos deu este presente.

11.Cada um de nós é um dom recebido, feito para ser doado. Isto quer dizer que somos filhos. O filho é aquele que se recebe. Eu não me fiz. Não sou um cogumelo que brota na grama sem pai nem mãe. Me recebi como dom e como presente. Desta verdade tenho a lei fundamental de capacitação para a castidade cristã e para o celibato. A lei fundamental é a seguinte: só é celibatário quem sabe que é amado e sabe que é capaz de amar. Dizer que somos amados significa que alguém se entregou por mim, alguém se destruiu para que eu fosse. Alguém entregou algo de si ou todo o seu ser para que eu fosse. E a grande verdade é esta: nós somos amados primeiramente, especialmente, por Deus! Deus se entregou por mim, portanto, se não há esta verdade em minha vida, eu não serei celibatário. Um religioso que carrega frustração consigo é porque não se sente amado. Ele pode ser casto como um anjo, mas isto não é verdadeira castidade. Pode ser puro, sem sexo, mas não é celibatário se não for amado. O celibato é uma realidade de amor: Eu sou amado e por isso também amo! Que coisa extraordinária que eu exista! Que coisa extraordinária que Deus tenha me escolhido, que eu tenha nascido! Deus tem predileção por cada um dos seus filhos presbíteros e os quer verdadeiramente sacerdotes da entrega e da oblação em favor do Reino de Deus” (Pe. Paulo Ricardo).

12.Acolho nesta manhã nossos amados sacerdotes, dedicados presbíteros da Seara de Nosso Senhor. Agradeço aos senhores por todos os trabalhos realizados, pelo testemunho e pela comunhão com o bispo e uns com os outros. Particularmente desejo acolher o Pe. Alfredo Borges, nosso colaborador em Mozarlândia, cedido generosamente pela Diocese de Campos, através do seu Bispo Dom Roberto para nos auxiliar neste ano. Acolho também o Pe. Josenilson Antonio, da Comunidade Obra de Maria, cedido pelo seu fundador e por Dom Alberto, então arcebispo de Palmas, para atuar como Pároco em Nova Crixás. Acolho o Pe. José Fábio, Reitor do Seminário propedêutico de Uruaçu, cedido por Dom Messias para celebrar a Semana Santa com a Paróquia Nossa Senhora da Guia de Araguapaz. Acolho o Pe. Rafael da Comunidade Nova Aliança que nos ajuda na Paróquia do Faina. Sejam bem vindos à nossa Diocese. Agradeço a presença das irmãs e consagradas, dos nossos seminaristas diocesanos Messias e Carlos, do seminarista Agripino da Obra de Maria e dos leigos e leigas de vida consagrada das comunidades de vida presentes na Diocese. Obrigado às lideranças de Mozarlândia que juntamente com o Pe. Alfredo preparam esta bela liturgia.

13.Que a celebração da Páscoa de Jesus possibilite a todos nós uma verdadeira “passagem” para uma vida nova, sempre mais comprometida com uma Igreja servidora, acolhedora e solidária com os mais humildes e necessitados. Amém!

Adair José Guimarães
Enviado por Adair José Guimarães em 01/04/2010
Código do texto: T2171301