Discurso de Posse na Sociedade Paternon Literária (P.Alegre-RS)

Senhor Nadir Silveira Dias

Presidente da Sociedade Paternon Literária

Em nome de quem cumprimento todos os presentes neste sodalício

Como o caminhante que segue, com humildade, carinho e respeito, pelas jornadas e difíceis caminhos, que o conduziram ao Templo da Sabedoria, assim hoje eu chego.

Me encaminho ao encontro desta Casa de tantas glórias e tradições.

Orgulha-me o fato de ombrear-me com homens e mulheres da mais alta estirpe das letras rio-grandense. De ontem e de hoje.

Chegar à casa de Apolinário Porto Alegre - casa esta que se originou de uma realidade tão distante - um templo grego – construído para Minerva – deusa da mitologia grega – filha de Júpiter e encarnação da sabedoria divina.

Era 18 de junho de 1868 quando Apolinário José Gomes Porto Alegre (O Vaqueano, 1872), os irmãos Apeles e Aquiles, Antonio Vale Caldre Fião (A Divina Pastora, 1847, e o Corsário, 1851), João Damasceno Vieira Fernandes, Arthur de Carvalho Candal, Múcio Scevola Lopes Teixeira, Bernardo Taveira Júnior, dentre inúmeros outros se reuniram para fundar a maior organização de intelectuais do Rio Grande do Sul.

O Partenon lutou pela República, pela abolição da escravatura, pela libertação da mulher e pela emancipação literária do Rio Grande do Sul. Promoviam saraus, recitais, debates, teatros e declamações.

A Sociedade esta atualíssima. Porque se a escravatura foi abolida – sobraram outras escravidões dos quais devemos nos libertar quebrando os grilhões e as amarras. A mulher continua num patamar abaixo – ainda que as conquistas havidas fossem enormes. Mas ainda necessitam de uma lei especial – vide a Lei Maria da Penha que entrou em vigor no dia 22 de setembro próximo passado. Existem vários tipos de segregações, de aviltamento das minorias: falo do índio – dono destas terras e ignorado por todos os governos. Falo do negro – que ainda amarga derrotas e servidões. Falo da lei da igualdade racial – que ao contrario do apregoado irá criar em nosso país a divisão de raças – efetivamente.Falo da distribuição desigual de nossas riquezas – que a cada dia se torna mais cruel – e sagra pelo País – a desigualdade nua e crua. Falo da impunidade que campeia em todos os segmentos, principalmente o político. Falo da corrupção que tornou-se lugar comum em nosso dia-a-dia. Falo da falta de expectativa dos jovens que saem das faculdades. Falo do nosso ensino que se tornou medíocre.

Por tudo isso a Casa de Apolinário Porto Alegre não pode parar. Ela tem de seguir o seu curso e a sua história. E, é o que tem sido feito. É o que se continuará a fazer. É de louvar que a Sociedade Paternon Literária preserva a exata orientação a que se filiaram seus fundadores originários, ou seja, é ecumênica por excelência. Transitam livremente pelas suas hostes juristas, poetas, prosadores, jornalistas, músicos, atores, artistas plásticos. A entidade não se subordina a qualquer estereótipo. É uma casa onde a liberdade voa como suave perfume!

Aceita abriga em seu seio pessoas de outro Estado. Tenho com o Rio Grande do Sul uma relação de amor e de sangue. Minha família é originária da bela São Borja. Sou descendente da Família Miranda.

E, chego assim.

Fazendo o caminho de volta.

Em 1878 a 1880 saíram de São Borja –rumo a Mato Grosso. Foram parar em Bela Vista, passando antes por Argentina e Paraguai. Plantando, criando gados, casando, criando cidades, e etc.

Foram colonizando. Alguns retornaram. Outros subiram para o norte. O certo é que – quando venho ao Rio Grande do Sul – é como se estivesse em minha terra – pois que a forma de criação e os costumes foram e são os mesmos.

De amor – porque daqui de Porto Alegre – em 1973 – chegou em Mato Grosso do Sul - o meu esposo – Nelson Vieira de Souza com quem tenho dois filhos o Marcel e o Werner.

Não nos despojamos dos bens que aqui temos – porque sempre escolhemos voltar ao Rio Grande do Sul.

Fito ao longe – retorno no tempo – nada me faria supor que um dia – os caminhos de minha vida me trariam a esta Casa.

Faz-se o caminho ao andar – escreveu o poeta espanhol Antonio Machado.

E no meu andar retorno em 1955 quando começam minhas lembranças... Revejo-me tocando o gado, recolhendo bezerros, na lida normal de fazenda... E a noite, à luz do lampião de querosene, – meu pai lia e contava-me os causos da época.

Tínhamos bons livros e muito cedo comecei a viajar nos sonhos que os livros nos proporcionam. Segui adiante. Vim para a cidade grande. Fiz tudo que era permitido aos jovens contestadores de minha época. Dourados anos dourados. Anos de ingenuidade. Anos de chumbo.

O jovem de antes era interessado nas coisas de seu País. Não fugi à regra. Sempre olhei o Brasil dentro de um contexto global, isso me movia, me comovia... e fui fazendo meu caminho, participando ativamente de tudo e sonhando sempre – em versos!

E assim, fatalista como todo poeta, chego a este momento. É praxe que cada acadêmico ao tomar posse fale do seu antecessor, até mesmo para manter vivo – na memória da sociedade de que, esta é uma, – senão a mais antiga instituição cultural do Rio Grande do Sul. Ela é mais antiga que a própria ABL.

Mas eu não vou falar de uma pessoa apenas – mas da instituição – já que começa comigo, honra suprema, o patronato.

Esta casa foi e continua sendo fortemente impregnada de romantismo , do erudito, de republicanos militantes, de democratas, de homens vibrantes, envolvidos com política e com as causas sociais.

De homens que sonham a PAZ.

Que querem e que vão construir a Paz.

Machado de Assis nos deixou o legado de que “As academias são como as armas. Só devem ser utilizadas em defesa. Em defesa, antes de tudo, do patrimônio cultural de um povo. Devem representar a memória estética, histórica e intelectual da nacionalidade. A oposição entre gerações faz parte essencial do dinamismo mais sadio dos povos. O choque entre gostos e escolas estéticas , por sua vez, é que alimenta a força criadora das vocações intelectuais. Daí ser o sarcasmo antiacadêmico um dos sinais mais sadios da Inteligentzia Nacional. (...) É bom que assim seja, pois não há nada mais estimulante do que o epigrama para punir a mediocridade e a vaidade, que são sempre os demônios mais insidiosos das instituições acadêmicas. Ai de nós, porém, se não houver quem preserve os tesouros intelectuais do passado contra a fúria iconoclasta do presente”.

E abro espaço para incluir tantos outros nomes no meu coração, que me ajudaram a estar aqui agora, a começar por meus confrades nesta casa, que hoje abrem as portas para me acolher. Meus pais: Silvia e Abraham seres humanos íntegros. Edelmira, minha irmã. Marcel e Werner, meus filhos, Nelson, meu marido - que pela vida tem me ajudado a continuar , pois que mesmo sendo eu a filha, a irmã, a mãe, a companheira, sempre desligada, exigente, independente... são cúmplices de meus sonhos.

Meus amigos – não vou nominá-los. Mas preciso dizer que é muito bom tê-los hoje, ao meu lado.

Este é um momento inimaginado.

Estar nesta casa consagrada pelo tempo, estar com vocês, pois raras são as palavras que podem resumir a emoção de uma menina do interior, persistente, que, contradiz o destino. Sou uma privilegiada.

Não posso dizer: herdei esse dom de algum parente. Não sou de uma família de intelectuais, sou de uma família simples, dedicada ao cultivo da terra e a lida do gado, todavia, as lições de vida, de coragem, o exemplo dado por meus pais, são os norteadores da ética como um todo.

Seus conselhos ainda ecoam: ser honesta, trabalhadora e procurar “ser gente”.

Com a alma exposta trago minhas idéias e sentimentos.

Isso para o escritor é desnudar-se, é entregar-se de pleno e de plano, lembrando a efemeridade do tempo que tudo transforma, e, agradecendo,

Agradeço...

Delasnieve Daspet

Agradeço, o amor infinito;

Agradeço, o amor incomparável;

Agradeço, por que pensastes em mim;

Agradeço, porque sei que não me deixastes a própria sorte,

Porque sei que estas comigo,

Não só por hoje,

Mas por todo o sempre!

Toda vez que eu sorrir,

Toda vez que eu chorar,

Toda vez que eu me recolher,

Toda vez que eu me doar, agradeço!

Agradeço!

Agradeço a vida, a dignidade,

E a certeza de que tudo é possivel...

Podemos, sim, conviver sem medo,

Sem rancor,

Em harmonia.

Agradeço pelo sol, pela lua,

Pelas estrelas, pelo vento, pela chuva,

Pelo calor, - que é a vida que transborda!

Agradeço, porque creio.

Creio na rua chamada Esperança

Pela qual caminhamos há tanto tempo!

Agradeço, porque acredito no ser humano,

Imagem e semelhança do amor...

Agradeço, porque acredito na vida,

Que célere e quente

Circula por minhas veias!

Agradeço, pela margarida branca

Em céu de sol dourado,

Perfume da mata que viceja,

Em meus rubros lábios sedentos...

Agradeço, pois que surges no final da tarde,

Tal qual andorinha sem ninho,

Em busca do ramo orvalhado...

Assim, nada melhor do que ombrear-me a esta plêiade de ilustres confrades que engalanam os quadros da Sociedade Paternon Literária, a quem, muito justa e oportunamente, rendo as minhas homenagens e os meus agradecimentos, conclamando-os para buscarmos a conquista da paz. A paz só é possível com as ferramentas da paz, e não com as armas da guerra, que, em vez de pacificar os povos, disseminam mais ódios e ressentimentos. Quando a paz, e não a guerra, for valorizada, teremos um mundo de paz, amor e união entre as criaturas. A paz do mundo começa em cada um de nós. A paz é dever e é direito . Que as nossas vibrações sejam expandidas por todo o planeta, estendendo-se mais ainda por todos os outros astros, contaminando todo o Universo com a nossa vontade de ver este mundo se transformar em uma terra mais humana e justa.

MAKTUB!

Delasnieve Miranda Daspet de Souza

Titular da Cadeira nº 120 da

Sociedade Paternon Literária

**

Delasnieve Daspet

08.11.06 – 20,30 hs – Porto Alegre- RS

Casa da Cultura Mário Quintana

Delasnieve Daspet
Enviado por Delasnieve Daspet em 07/12/2006
Código do texto: T312407
Classificação de conteúdo: seguro