Discurso de posse na Associação Riobranquense de Letras

Boa noite.

Gostaria de saudar aos membros da mesa diretora da Academia Rio-branquense de Letras, e aos agora confrades, bem como aos demais presentes nessa solenidade. Gostaria também de fazer aqui um agradecimento especial ao meu amigo Romero Franco, por me indicar para a ARL, bem como ao Orador da noite, Cleber Lima, que muito meu honrou em seu discurso ao me apresentar de forma tão elogiosa. Fico muito grato, apesar de saber que os elogios ultrapassam minha real estatura.

Ao me ter sido feito o convite para a ARL, me senti muito honrado, mas também um pouco confuso, sem saber ao certo se era merecedor, ou, se o era, em que medida. Além disso, por oficio da docência, me acostumei a preparar textos que na prática, não consigo ler. Sempre invento algo novo na hora e abandono os textos previamente preparados. Falarei então sem seguir um texto, embora tenha meditado sobre o que falaria aqui. Com isso, espero poder, em um segundo momento , entender melhor o que quis dizer, entender como me sinto, e qual o sentido, para mim, de participar da ARL.

Propuseram-me que em meu discurso de posse falasse sobre meu patrono, Eugênio de Mello. Procurei então me informar sobre quem fora essa figura histórica, e o que lhe deu a importância de figurar entre os patronos da ARL. Das informações que consegui apurar, vi sua trajetória como homem público e das funções que exerceu, mas pouco sobre o homem e sua personalidade. Procurava algo, já que agora ocupo a cadeira que simbolicamente lhe pertence, que a ele me irmanasse, algum indício de identidade entre nós dois. Lembrei então das palavras de um grande filósofo da atualidade, a quem admiro, e que nos faz a seguinte questão: E se aquilo que realmente somos, aquele espaço onde somos mais nós mesmos, não for nossa intimidade, como apregoa nossa época? E se, ao contrário, nossa síntese, nossa mais verdadeira expressão, for nossa obra, aquilo que fazemos publicamente e que legamos para além de nós?

Seguindo essa dica me saltaram aos olhos duas realizações de Eugênio de Mello em sua vida pública, destacadas não por mim, mas pelos textos que o apresentavam, principalmente no que diz respeito à sua vinculação com nossa cidade. Ele foi o responsável pela construção tanto da Praça Vinte e Oito de Setembro, quanto da iluminação pública em Visconde do Rio Branco. Tais informações me possibilitaram então um vislumbre do homem que meu patrono pode ter sido.

Sempre ouvi dizer, e deixo aos historiadores de Visconde do Rio Branco a comprovação ou não da veracidade dessa informação, que nossa praça é a réplica de uma praça francesa, tendo seu projeto sido dado à nossa cidade, em função da amizade do arquiteto que a desenhou com nosso prefeito à época. Como esse prefeito (presidente da câmara com funções de poder executivo municipal), era Eugênio de Mello, imagino que fosse um homem que se relacionasse com artistas, e tivesse, ele também, sensibilidade para as questões estéticas, ou pelo menos, capacidade de aprecia-las. Da mesma forma, a preocupação, na primeira década do século vinte, em estabelecer iluminação pública elétrica, nos mostra um homem conectado com as possibilidades que as ciências poderiam fornecer para a melhoria da vida humana. Adotei então a intuição de que Eugênio de Mello era um homem que transitava entre as artes e as ciências.

Expresso essa intuição em função de que procurava algo com o que pudesse me identificar com o patrono e com cadeira que ora ocupo na ARL, e me compreendesse como a ela pertencente. Sou uma pessoa que por necessidades, profissionais e de minha alma, preciso escrever constantemente. Essa escrita, no entanto, é uma escrita dúbia, que também transita entre a escrita literária, em busca da beleza e de me expressar para entender melhor o que sinto, e a escrita técnica, em busca de fornecer, dentro de minhas possibilidades, contribuições para a melhoria da vida humana. Nesse transitar, busco ao mesmo tempo, compreender a escrita literária, também a partir de sua técnica, com suas métricas, rimas e ritmos, e com as possibilidades de expressão que tais técnicas permitem. Da mesma forma, busco estruturar a comunicação científica a partir da inserção do sentimento, que, para além da aridez muitas vezes desejada nesse tipo de escrita, possibilita uma melhor compreensão dos fenômenos que se pretende descrever, principalmente em psicologia.

No entanto, esse transitar entre dois mundos, principalmente quando se propõe tal transito objetivado em letra, é um enorme desafio. Sinto que, ao ser acolhido pela ARL, na cadeira que representa esse transitar, não preciso mais enfrentar tal desafio sozinho. E espero poder, a partir do contato e da convivência com os confrades acadêmicos, e do meu esforço, ser merecedor de receber orientações e contribuir com essa tradição legada por tantos que antes de mim também se dispuseram à tarefa da escrita.

Sanyo
Enviado por Sanyo em 12/03/2019
Código do texto: T6596413
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