Canção da Noite

A noite cai e as veias ocas clamam por sangue

Antigas preces humanas não restaurarão a essência que te tomei

Aprendiz de coração sensível levanta de tua cama

A luz se foi, escuridão governa tua trama

Abre tuas asas e te entrega ao abismo, tua rainha te chama

Levantar-me-ei embora ainda fraca

Seguirei teus rastros rabiscados no horizonte

Levarei minh’alma escura e agonizante

Até a morte presentear-me com uma estaca

Não temas a noite, estas horas a nós pertencem,

Insegurança não nos cabe, são os humanos que nos temem

Ergue teu cálice rubro, vamos brindar

A mais sangrenta noite de luar

Brindarei contigo, rainha do gelo

Meu corpo frio tem sede de sangue

Abandonarei toda ilusão em um mangue

Saciarei meu desejo ávido num gamelo

Teu novo ânimo me enche de orgulho

Recebendo com êxtase da vida eterna fagulha

Nascemos do impossível, para unir inferno e céu

Deixa teus olhos de ébano abertos, da ilusão se foi o véu

Emaranhada ao sofrimento carnal

Procuro um rumo que me leve a distração

O teu convite despertou minha razão

Me vejo esquálida neste mundo infernal

Do sofrimento te liberto com minha destra

Para orgias de sangue sem limite foste feita, diz tua mestra

Há tempo corrompeu-se o que chamavam humanidade

De tua essência vampírica brota sedutora raridade

Meu sangue raro necessita renovar-se

Para curar o achacado órgão pútrido

Corpo gelado misturado a homens hórridos

Se atira a noite aliviando as metástases

A noite é palco de nossa brincadeira

Nossas presas entalham a arte derradeira

E quando o sol raiar, voltamos ao caixão

Essa é a regra da nossa maldição

Maldição que soa bendita

Levando minhas dores e fome

Agora só a sede de sangue consome

Eternas parceiras ambulantes parasitas

A luz chegando no horizonte o fim da diversão anuncia

As gotas rubras escorrendo dos lábios, satisfação denunciam

Pega minha mão, pequena, é hora de repousar

Amanhã novamente todos os prazeres vamos ousar

Sim, vamos voltar para o nosso gélido caixão

O festim rendeu-me glórias e me regenerou

Agradeço o convite que minh’alma dominou

Recolhemo-nos como a noite adentrando a escuridão.

(Sua parceria e versatilidade sempre me fascinam. Obrigada por aceitar o desafio!)