Aula 13 - Crítica nos Estudos Organizacionais

In: MALANOVICZ, Aline Vieira. "Safári de T.O: o Percurso de uma Estudante Exploradora pela Diversidade das Teorias Organizacionais". Revista Pró-Discente: Caderno de Produções Acadêmico-Científicas do Programa de Pós-Graduação em Educação - UFES, v.27, n.1, 2021. Disponível em: https://portaldepublicacoes.ufes.br/prodiscente/article/view/28547 Acesso em: 31 ago. 2021.

A acepção moderna de dialética significa o modo de compreender a realidade como essencialmente contraditória e em permanente transformação. No contexto das organizações, encontra-se uma realidade formada de situações plenas de contradições, conflitos e constante mudança. Ao mesmo tempo em que existe uma hegemonia de determinados temas, olhares e métodos de pesquisa organizacional, há também crítica e resistência concretizadas em práticas criativas que produzem conhecimento novo. Nesse sentido, a teoria, o pensamento crítico, e a própria dialética, ajudam a compreender a essência das atividades, da prática social, relacionar conceitos e compreensões, validados por essa mesma prática social, e assim ampliam as possibilidades de aprendizagem.

Assim como a concepção metafísica, o enfoque sistêmico estrutural prevaleceu, ao longo da história, porque corresponde, nas sociedades divididas em classes, aos interesses das classes dominantes, sempre preocupadas em organizar duradouramente o que já está funcionando e interessadas em firmar os valores, os conceitos e as instituições existentes, para impedir que as pessoas tentem mudar o regime social vigente. Isso difunde visões do mundo, dos indivíduos e das organizações, que hoje evidenciam um falso pensamento crítico, pois são pesquisas policiadoras, tecnocráticas, até mesmo “comerciais”, encomendadas, baseadas na presunção da obrigação da submissão às leis do mercado e na conseqüente naturalidade da desigualdade social, mas perversamente disfarçadas de “esquerdismo”. Barbaridade! Era só o que faltava!

Mas os pesquisadores de estudos organizacionais não precisam entender seu tema de estudo, a organização, estritamente a partir da crença doutrinadora de um enfoque sistêmico estrutural como objeto formalizado, e podem até partir de uma abordagem da organização como processo, ou mesmo de abordagens produzidas em conjunto com outros campos disciplinares, como já estudamos nesta disciplina. Assim, é metodologicamente recomendável abrir o entendimento e as interrogações à realidade, ter coragem para questionar a autoridade dos formadores do mainstream constituído, do mesmo modo que ela interroga e desafia os pesquisadores no seu dia-a-dia, ao considerar dialeticamente que mudança e a permanência são categorias reflexivas, que não podem ser pensadas uma sem a outra, pois todas as coisas estão sujeitas a passar de uma mudança a outra e o todo está sempre mudando.

Então, como tanto a crítica kantiana como a marxista oferecem meios para o pesquisador examinar e compreender as categorias de estudo, identificando as implicações epistemológicas e sociais que estão “escondidas” dentro dos discursos, é necessário incluir entre os métodos de pesquisa a prática de revisar as suposições de “saber fazer” e “saber a resposta”. Como no lema de Marx, “duvidar de tudo”: duvidar, incorporar a interpretação de suspeita frente ao que se mostra aparentemente ordenado e resolvido, unidirecional e linear. E além disso, também “desconfiar de quem quer impor a ordem”, sem ficar preso às técnicas de busca de legitimidade e de poder, lembrando que o pensamento crítico é o que dá o significado de pensar o mundo como ele é e como ele poderia ser. Nesse sentido, convém reafirmar que apenas criticar sem criar, limitar-se a contestar determinada escola ou corrente de pensamento nos estudos organizacionais não dispensa o pesquisador do seu “compromisso com o saber”, que exige a proposição de uma outra forma de olhar, que supere as limitações ou contradições apontadas na forma contestada.

Assim, a resistência pode ser entendida como um processo de apropriação do conhecimento que circula em um contexto e gera a emergência de práticas impensadas considerando a história até então produzida. Não é apenas uma oposição, mas inclui a defesa de saberes, posições, pontos de vista, e as realizações e criações decorrentes. E por outro lado, o pensamento crítico deve evidenciar as contradições lógicas e práticas de discursos de poder (como o neoliberal), para poder agir criticamente e questionar as regras que governam as ações e crenças vigentes, no sentido de pensar o mundo, e não ser pensado por ele. A realidade é sempre mais rica do que o conhecimento que se tem dela, e sempre existe algo que escapa às sínteses, pois cada totalidade tem sua maneira diferente de mudar, e as condições da mudança dependem do caráter da totalidade e do processo específico do qual ela é um momento. Por exemplo, realidades que não são contempladas pelo mainstream da pesquisa organizacional podem surpreender ao permitirem a produção de conhecimento novo em conjunto entre acadêmicos e não-acadêmicos.

Assim, a resistência que ocorre em um determinado espaço social pode ser vista como mais do que puramente crítica, mas dentro da característica essencial da dialética, o espírito crítico e autocrítico. Assim como o projeto de Kant procurou definir condições para o uso legítimo da razão, o pesquisador examina constantemente o mundo e deve estar sempre disposto a rever as interpretações em que se baseia para atuar. Desse modo, a resistência, sempre aliada ao pensamento crítico, é também uma busca de afirmação de outra visão, uma defesa de conhecimentos, de percepções e de construções diferentes, que trazem crescimento e desenvolvimento dos saberes do grupo social no qual se desenvolve.

Uma questão que poderia incentivar o debate sobre o tema seria:

Pode-se considerar que as grandes rupturas de paradigmas das ciências ditas exatas ou naturais resultaram também de um processo histórico de pensamento crítico que teve efeito sobre a epistemologia da época?

24/06/08

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Conceito: A :-)

Notas de Aula (27/06/08):

* Reflexivo: + Crítico: - Negativismo: --- :-}

* Postura malvada: pseudocrítica que na verdade só reforça o mainstream.

* Hegemonia: momentânea - com a contra-hegemonia há o processo (movimento contínuo)

* Dialética: perceber a contradição do mundo, não só substituir uma teoria por outra, mas estender os limites da realidade e viver com a incerteza - reconhecimento das múltiplas possibilidades

* Como combater o "jeito" da CAPES? "Tática de guerrilha": publicar dentro e fora (nos "deles" (a sério) e nos marginais (a sério também) até que fiquem validados)