A política na obra Intermitências da morte de José Saramago

A política na obra Intermitências da morte de José Saramago

Na obra, As intermitências da morte, de José Saramago, são relatadas com muita veemência os fatos sobrenaturais a respeito da morte e a postura política do chefe do governo, de ministros, da maphia (grafada com “ph” para se distinguir da clássica), dos republicanos. Essa obra nos mostra a morte, não de uma forma catastrófica como todos conhecem, mas mirabolante e surpreendente.

Logo no início da obra há os primeiros indícios de que a morte cessou as suas atividades em um país, acarretando diversos transtornos para uma grande parcela da sociedade. Podemos comprovar a greve de Tânatos na seguinte passagem:

“No dia seguinte ninguém morreu. O facto, por absolutamente contrário as normas da vida, causou nos espíritos uma perturbação enorme, efeito em todos os aspectos justificado, basta que nos lembremos que não havia notícia nos quatro volumes da história universal, nem ao menos um caso a amostra, de ter alguma vez ocorrido fenômeno semelhante, passar-se um dia completo, com todas as suas pródigas vinte e quatro horas, contadas entre diurnas e nocturnas, matutinas e vespertinas, sem que tivesse sucedido um falecimento por doença, uma queda mortal, um suicídio levado a bom fim, nada de nada, pela palavra nada... “

Com essa passagem constatamos a presença do fantástico no enredo, pois é inexplicável pelas leis da razão esse fato incrível. A finalização do hecatombe traz uma insatisfação para muitos que estão em estado terminal nos hospitais, nos quais acumulam inúmeras pessoas; ocasiona uma forte crise para as funerárias e para a igreja (pois sem a morte não haveria ressurreição e sem esta a espiritualidade entraria para o obscurantismo).

O chefe de estado não apresentou nenhuma prova cabal de quaisquer defunções em todo o país desde o início do ano, mas iria especular mais sucintamente se esse fenômeno se agravaria ou não. Ainda infere esta elucubração:

“...Não devia excluir-se a hipótese de se tratar de uma casualidade fortuita, de uma alteração cósmica altamente acidental e sem continuidade, de uma conjunção excepcional de coincidências intrusas na equação espaço – tempo, mas que, pelo sim pelo não, já se haviam iniciados contactos exploratórios com os organismos internacionais competentes em ordem a habilitar o governo a uma acção que seria tanto mais eficaz quanto mais concertada de ser.”

De acordo com esse comunicado de vaguidade pseudocientífica, destinado a tranqüilizar toda a população, não trouxe comprovações plausíveis que explicassem as causas das atividades da morte ao longo de um ano. Todavia, o primeiro - ministro fomenta que é indispensável o apoio da população e das demais esferas governamentais para enfrentar essa problemática, que assola o país.

Os ministros sempre preocupados com o destino do país se deparam com um problema inusitado, a transitoriedade de pessoas que levavam seus parentes em estados terminais através de mulas e falsas ambulâncias para países limítrofes, onde a morte estava em plena atividade. Esse episódio relatado na trama foi visto com muita

indignação pelos três países fronteiriços e pela oposição interna. Isto fez com que o chefe de governo, com o apoio dos ministros, anunciasse que as forças armadas tomassem posições pelas fronteiras para impedir a passagem de pessoas com problemas terminais. Na verdade foram colocados vigilantes nas fronteiras onde a morte vigorava. Outro fator relevante fomentado pelo primeiro – ministro ao rei foi no tocante às pensões das pessoas, podemos constatar em:

“(...) tudo está controlado, Menos à questão das pensões, Menos a questão da morte , senhor, se não voltarmos a morrer não temos futuro (...)”

Esse fragmento relata-nos que o país entrará em bancarrotas, pois ficará com um grande déficit na economia em comparação com outros países, nos quais não são assolados pela greve da morte. O primeiro – ministro então aconselha todos que façam logo os testamentos, evitando o disparate econômico no país.

A marphia aparece na trama com muita arbitrariedade, pois cobrava uma quantia exorbitante em remuneração para quem quisesse enterrar os corpos de moribundos além das fronteiras. Houve intervenções de certos vigilantes nesse ato criminoso, mas a Marphia entrou em contato com o diretor de serviço do ministro do interior:

“ Estabelecemos um acordo cavalheiros, o ministro manda tirar os vigilantes e nós encarregamo-nos de carregar discretamente os padecentes...”

E logo em seguida faz a severa ameaça:

“ O governo terá quarenta e oito horas para estudar a proposta, nem um minuto a mais, mas previna já a sua hierarquia de que haverá novos vigilantes em coma se a resposta não for a que esperamos.”

Depois desse alerta dado pela marphia, não houve outra solução pertinente para o governo, se não ceder aos caprichos desta organização criminosa. Acabou negociando e lançou uma espécie de numerus clausus, inferindo que vinte e cinco por cento do número total dos vigilantes em atividades iriam trabalhar para o outro lado. Isso trouxe uma grande insatisfação para os países vizinhos, que acusam o país de estar desenvolvendo trabalhos sujos ao se aliar inteiramente com a marphia. Essa organização criminosa, além de se achar infalível nas atividades ilícitas de levar os moribundos para a fronteira (“com o apoio político do estado”), também visava a implantação da eutanásia, com o acordo tácito entre as famílias dos padecentes.

No tocante aos republicanos podemos inferir que era oposição ao governo monárquico. Eles não tinham representatividade no parlamento, apesar de estarem organizados em partidos políticos, terem grande destaque na sociedade, sobretudo nos meios artísticos, literários e participarem de atos eleitorais. A ação dos republicanos perante o fenômeno foi de indignação perante o “rei”, pois queriam, por fina força, implantar a república, logo teriam um argumento pertinente para a sociedade. Podemos ratificá-lo na seguinte passagem:

“Diziam que ia contra a lógica mais comum haver no país um rei que nunca morreria e que, ainda que amanhã resolvesse abdicar por motivo de idade ou amolecimento das faculdades mentais, rei continuaria a ser, o primeiro de uma sucessão infinita de entronizações e abdicações, uma infinita seqüência de reis deitados nas camas á espera de uma morte que nunca chegaria , uma correnteza de reis meio vivos meio mortos que, a não ser que os não caber no panteão onde haviam sido recolhidos os seus antecessores mortais...”

Evidenciamos, com um clima bem jocoso, a postura na qual os monarcas são descritos de acordo com a concepção dos republicanos. A figura do rei seria imortalizada como vimos nesta passagem: “(...)rei continuaria a ser, o primeiro de uma sucessão infinita de entronizações e abdicações, uma infinita seqüência de reis deitados nas camas á espera de uma morte que nunca chegaria(...).” Com a insatisfação desse privilégio monárquico, os republicanos cogitam em implantar uma revolução que culminaria no obscurantismo desse governo soberano. Essa ação não surtiria nenhum efeito, devido ao forte apoio que o rei tinha da população e o forte apoio das forças armadas.

Enfim, constatamos que por trás dessa grandiosa obra de José Saramago, encontramos, com notoriedade, a temática da morte, sendo relatada de uma maneira intermitente, jocosa e irônica. Outro aspecto relevante na sociedade, como a visão política em diversas instâncias em um governo cujo sistema é a monarquia.

Referência Bibliográfica

SARAMAGO, José. 2005. As intermitências da morte. 1°Ed. São Paulo: Companhia das letras.

Raphael Arruda
Enviado por Raphael Arruda em 02/11/2008
Código do texto: T1261342
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