Mais um texto sobre a atualidade de Machado de Assis.

Como ler um conto de Machado e não refletir no que acontece conosco no nosso cotidiano? Afinal ele explora tão bem situações de nossa vida, que de tão humanas e tão capitalistas não mudaram em praticamente nada até hoje.

É verdade que nos tempo de machado a modernidade vinha de bonde, o carro é inventado pouco tempo depois, mas hoje em dia não é muito diferente, podemos viajar pelo mundo em pouquíssimas horas, ir de uma cidade a outra já não é nenhum transtorno. Mudaram-se os nomes, mas a rotina é a mesma. Daí que entra Machado, o que ele escreveu em seus dias, apesar de serem tempos diferentes, continua válido, basta só mudarmos de bonde para avião, de réis para real e de agiotas para financeiras.

Para avaliar a oportunidade desta carteira, é preciso saber que Honório tem de pagar amanhã uma dívida, quatrocentos e tantos mil-réis, e a carteira trazia o bojo recheado. A dívida não parece grande para um homem da posição de Honório, que advoga; mas todas as quantias são grandes ou pequenas, segundo as circunstâncias, e as dele não podiam ser piores. Gastos de família excessivos, a princípio por servir a parentes, e depois por agradar à mulher, que vivia aborrecida da solidão; baile daqui, jantar dali, chapéus, leques, tanta coisa mais, que não havia remédio senão ir descontando o futuro. Endividou-se. Começou pelas contas de lojas e armazéns; passou aos empréstimos, duzentos a um, trezentos a outro, quinhentos a outro, e tudo a crescer, e os bailes a darem-se, e os jantares a comerem-se, um turbilhão perpétuo, uma voragem.

(ASSIS, Machado de, A carteira, 1884)

Quem não lê esse trecho acima e não se identifica com algo? Essa situação descrita no conto A carteira é absurdamente comum nos dias de hoje, onde mundo capitalista engloba o mundo. “Mais atual do que nunca, a obra machadiana é uma crítica à futilidade, numa mistura de jornalismo e literatura” (29/09/2008 - Roberta Campos Babo -Tribuna da Imprensa).

Em toda sua visão de sociedade e mundo machado chegou a prever ferramentas que só se tornaram largamente acessíveis nos dias de hoje, início do século XXI, como a internet. "Quando se aperfeiçoar o vapor, quando unido ao telégrafo tiver feito desaparecer as distâncias, não hão de ser só as mercadorias que hão de viajar de um lado a outro do globo, com a rapidez do relâmpago; hão de ser também as idéias!"

É claro que a genialidade de Machado não está somente em ser atual, há muito mais do que isso, como vemos no fim do mesmo conto citado acima A carteira.

Então Gustavo sacou novamente a carteira, abriu-a, foi a um dos bolsos, tirou um dos bilhetinhos, que o outro não quis abrir nem ler, e estendeu-o a D. Amélia, que, ansiosa e trêmula, rasgou-o em trinta mil pedaços: era um bilhetinho de amor.

Texto feito para aula de Lit. Brasileira III

Fontes: http://g1.globo.com/jornaldaglobo/ - A atualidade de Machado de Assis (29/092008)