O mal atual: A Infantilização da Mente

20090126 'Idiotas úteis' e a doença mental

É típico de uma mente contaminada achar que não existe realidade. Este tipo de mente só é capaz de pensar que tudo o que existe é expressão de opinião e sentimento. Assim criam-se as situações mais díspares, e esdrúxulas de todas, quando alguém se pronuncia defendendo algo como verdadeiro, e logo um idiota se une a outros idiotas contaminados e proclamam em uníssono que aquela opinião está errada, simplesmente porque assim proclamam. Quanto maior o assunto, quanto mais grave ele for e tiver maior repercussão nos recônditos mentais, mais está sujeito à essa forma de deturpação.

Essa maneira de ver o mundo contamina principalmente nossos acadêmicos e jornalistas que pensam não existir mais nada que a narrativa. E simplesmente ganha o joguinho idiota quem fizer prevalecer sua narrativa independentemente dos fatos mesmos. Logicamente que qualquer idiota (o uso aqui da palavra idiota se dá no nível dos “idiotas úteis”, termo cunhado por Lênin) confrontado em sua narrativa esperneará juntamente com seus cupinchas e tentará fazer com que sua opinião prevaleça. Fica meio difícil fazer isso com uma realidade objetiva última. Não adianta o grupinho de idiotas espernear dizendo que o carro em que eles estão não exista, o carro vai continuar existindo.

Assim é bem mais fácil fazer isso no campo jornalístico ou acadêmico. Sentado atrás de uma mesa ou protegido atrás de um título acadêmico, qualquer esperneio em grupo é logo taxado de verdadeiro, por mais que seja a mentira última mais sem vergonha. Quando um grupo de “úteis” são designados para o trabalho do esperneio não se pode mais confiar neles para saber a verdade. Pode-se confiar neles para descobrir a moda da hora ou a lavagem cerebral corrente, mas nunca para saber a verdade. Assim enquanto Obama no seu primeiro dia de presidente assina o maior acordo para promover o aborto mundialmente, temos que ficar ouvido de sua cor, seu sorriso, seu carisma, as esperanças do mundo, as possibilidades do milagre desejado etc. Nunca somos confrontados ou nos confrontamos com a realidade. Pois os que esperneiam acham que sua narrativa inspiradora vale mais. Assim a realidade é transformada, nunca conhecida.

Através da aplicação do “método de esperneio” nossa classe média acredita piamente no “coitadismo”. Ela acredita irremediavelmente que os pobres são pobres por sua culpa, de ter dinheiro. Acredita-se no mito de que para uns terem um pouco outros não podem ter nada. Dá-lhe esmola, ajuda para ONGs, militantismo pelos direitos do homem, pela dignidade humana etc. Poderíamos ter pena do sujeito pobre, que não foi educado e ganha a vida mal e porcamente, porque de uma hora para outra plantar sua comida, serrar madeira ou varrer o chão são profissões que requerem certificados escolares? Talvez. Mas preferimos ter pena do bandido, do ladrão, do traficante, do malandro, da puta etc. Chegamos ao ápice da deformação mental ao dizer claramente que roubar dinheiro dentro de um gabinete é pior que matar uma pessoa. Sério! E as pessoas continuam discutindo isso mesmo depois de qualquer argumento do tipo: VIDA HUMANA. A perda da faculdade mental para avaliar coisas como: causa e conseqüência, as fazem relativizar toda a moral e toda a ética em prol de um desdobramento infinito que vai terminar em quem? No pobre, novamente. Antes de ver que o roubo de dinheiro por um político atenta contra suas vidas, sua saúde, sua educação, seu salário, seu transporte, seus serviços..., teimam em concluir que o dinheiro roubado vai matar milhares ou milhões de pobres que não tem nada a ver com a história, a não ser através de um encadeamento de causas e conseqüências das mais obtusas e implausíveis.

Quem teima em ver a realidade em prol do pobre, e somente do pobre, teima em fazer exatamente como os jornais e demais mídias procuram conduzir o pensamento. Tudo sempre se refere aos pobres, aos miseráveis, aos flagelados etc. A educação tem que ser limada na base para que os padrões caiam absurdamente a fim de uma inserção social. O dinheiro há de ser distribuído, da forma mais obtusa possível, pelo pensamento paternalista. Ninguém nunca vê que essas medidas não são tentativas de melhorar alguma coisa, consertar um pouquinho disso ou daquilo. Essas coisas servem somente para deixar o problema como está e criar outro, de profundidade muito maior. Toda vez que o preceito democrático é usado ao extremo..., tente a desmoronar. Se todos que possuímos direitos, seja a isso ou aquilo, reivindicarmos nossos direitos conjuntamente e da maneira máxima a máquina governamental quebra, se esfacela e enguiça. Agora imagine se todas as pessoas forem colocadas na balança e forem criados milhares de direitos específicos para elas? Mas a mente humana deformada cisma em bradar em alto e bom som: “É meu direito, eu o reivindico.” Seja para que coisa for.

A mente humana criada livremente é capaz das maiores proezas. Ela é capaz das associações mais óbvias e das conclusões diretas mais elementares. Vide a criança na rua ao presenciar um mendigo e perguntar ao pai porque aquela pessoa não trabalha, não estuda. A associação é básica, trabalhe e tenha dinheiro. Estude e tenha conhecimento. Mas ao invés disso a pessoa ali na rua, suja, indigente, pede trocados e rouba pão. Ou rouba trocados e pede pão. Uma mente sadia consegue fazer correlações diretas e imediatas, mesmo que não saiba disso. Mas adoecida ela peca em fazer as operações mentais mais simples. A doença de nosso tempo é exatamente essa: achar que não há verdade, só há opiniões e expressões. Baseados nessa falcatrua intelectual implantada na mente de bilhões de seres humanos tiramos a conclusão direta e inescapável: contaminados por essa doença mental toda a realidade desaparece, prevalecendo o discurso. Exatamente como a criança, que mesmo incapaz de verificar, seja de que forma for, a validade do que diz, consegue fazer as relações mais básicas, que quando fomentadas darão resultado, quando abandonadas adoecem e se decompõem.

Prevalecendo o discurso podem inventar qualquer realidade possível, basta que caiba dentro do discurso. Foi exatamente por esse meio que Obama, o homem, não foi eleito. Elegeram em seu lugar uma idéia de esperança milagrosa. Sua cor de pele significou uma quebra de paradigma (virtual) e uma promessa de tempos melhores, mais brandos e humanos, quando na verdade a realidade se impõe por si mesma. Basta que o povo desligue a televisão para em menos tempo do que imagina começar a perceber a verdade. Sua vida crua e dura é tudo que lhe resta, e tais tipos de governantes só farão piorar, assim como o fez logo no começo do mandato ao assinar a proposta de gastar bilhões de dólares em plena crise com o fomento do aborto no mundo. Para a esperança, Obama se mostra um perfeito traíra logo de cara. E o pior de tudo é que seus eleitores cristãos, protestantes, judeus, evangélicos e mulçumanos regozijam com seu salvador, o primeiro a ir contra suas crenças. Este é o tipo de reversão mental doentia a que as mentes estão condicionadas, esquecer a realidade e acreditar no discurso. Esquecendo que existe uma realidade que se impõe sobre cada discurso. Mas quando for perceber isso já será tarde demais.

20090127 Mais sobre a doença mental

Existe algo que sempre me inquietou e hoje tenho plena certeza do que seja. Para explicar minha inquietação tenho antes que explicar as impressões que sempre tive delas. Essas são poucas, mas como são constantes crescem em qualidade. Sempre me achei mais inteligente que a média das pessoas, pelo menos desde que me entendo por gente, coisa que acontece há uns 5 anos somente. Depois essa impressão caiu e hoje eu penso que eu sou como todo mundo deveria ser normalmente, se não sofressem do mal que sofrem. Esse mal pode ser creditado à televisão, à educação, ao capitalismo, ao comunismo, mas de qualquer forma isso só explicaria a origem do mal e não o mal em si. Esse é muito fácil de perceber depois que se passam anos e anos convivendo ao seu lado, e de repente se vê fora dele.

Mas se as pessoas sofrem de um mal e eu me considero normal, por que diabos eu não acho que isso pode ser um sinal de grandiloqüência? Pelo simples fato de que não acho que sou exemplo para ninguém, não devem seguir o meu caminho, não quero que ninguém seja como eu sou e acho que se alguém se espelhar em mim para se desenvolver só pode ser um burro. Depois que percebi isso em meu íntimo é que tive a certeza de que não sou egocêntrico nem megalomaníaco. E consequentemente consegui enxergar mais claramente a realidade. Quando eu consegui enxergar mais claramente a realidade é que por tabela eu descobri o mal dos outros. Eles são incapazes de enxergar mais claramente a realidade.

O que me levou a perceber isso? Desde que passei a estudar alguns assuntos de maneira sistemática senti que tinha limitações. E fui sempre em busca dos conhecimentos que iriam sanar minhas limitações, ou pelo menos as que me inquietavam. Nessa jornada, depois de cinco anos mais ou menos, tirei uma conclusão sobre minha condição: saí da escola e entrei na faculdade ignorante, de tudo. Após cinco anos, tendo noção, e inquietado com algumas limitações que agora sabia que tinha, me considero mais preparado e mais confiante para buscar alguns conhecimentos. E realmente busco o conhecimento. Entusiasmado com essas descobertas, primeira a de saber-me limitado e segunda da absorção de conhecimento, fui a ter com amigos e familiares. Minha surpresa então foi estonteante. Não era eu que era limitado, são todos que são. E por alguma razão estranha eu saí dessa condição.

De fato a ignorância não tem começo, ela é infinita e persistente. Todos os homens nascem ignorantes, igualmente ignorantes. Essa condição é natural e não precisa ter início, pois é a própria condição manifestada na realidade. Assim o bebê passa anos e anos para aprender a separar e dividir a realidade em pedaços, pedaços reconhecíveis, pedaços reconhecíveis que possuem ligações, pedaços reconhecíveis que possuem ligações e se repetem e são capazes de identificação. Isso em relação a todos os sentidos, a sensação ao tocar uma árvore vai se repetir, a resposta ao chorar vai se repetir, e assim por diante. Anos é o tempo que leva para que uma criança ganhe noção de profundidade, tridimensionalidade e capacidade de abstração. Basta ver qualquer bebê em sua plena forma desengonçada e destrambelhada para saber o que é isso instantaneamente.

Graças aos erros próprios, e à condução dos adultos, a criança passa por essa fase incólume. E quando possui um sendo mais estável do mundo, em um processo paralelo ao outro, ela começa a falar. A fala é a conquista por natureza da criança, que vai aprender na marra a separação da realidade e sua nomeação. Se começa com papi e mami, ela em pouco tempo vai saber que existe ventilador, cama, garfo, papinha, e com o tempo vai ganhar a noção de amor, morte, doença, perigo etc. A criança aprende tudo isso na terapia de choque, ou ela aprende ou perece. E esquecemos rapidamente que ela demora anos e anos, no mínimo uns 6 anos para aprender e dominar completamente o idioma e conseguir captar grande parte da realidade. Mas mesmo assim ainda nessa idade a criança não sabe o que é morte.

Eis que continuando nessa descrição vamos terminar o crescimento de um novo ser humano apenas lá pelos 15 anos. E teremos um novo ser formado completamente aos 20. Essa era minha idéia básica, aos 20 anos mais ou menos foi quando tomei consciência da vida mesma e comecei a trilhar meu caminho particular de aprendizagem, busca e desenvolvimento. Quando passei, anos depois, a ver a realidade mais claramente percebi que nossos jovens de 20 anos estão infantilizados. Eles não conseguem perceber o mundo de maneira que um ser humano de 20 anos deveria ver, mas enxergam a realidade através de olhos totalmente deturpados. Cheios de vícios. Quando na verdade o ser humano deveria ter toda a base livre de vícios maiores para começar a desenvolver um trabalho sério, é exatamente o que hoje é o ápice da desenvoltura e por ali fica a coisa toda. Devemos lembrar que comparativamente, aqui em uma hipótese por mim formulada que deve ser considerada livremente, podemos comprar uma criança de 14 anos de dois séculos atrás como equivalente no nível emocional de nossos jovens de 20 hoje. Se for no nível intelectual a criança ganha de muito.

Isso para falar em termos de início de uma existência minimamente satisfatória. Se olharmos nos consultórios de análise e psiquiatria de hoje veremos que a maioria das pessoas não possuem problemas patológicos, mas simplesmente são arrastadas aos consultórios por simples carência emotiva e desestrutura interna para manter-se como um adulto. Ou seja, temos um exército de adultos que ainda são infantis em suas vidas internas. Constatando isso não é espanto algum ver hoje em dia pais, mães, filhos e/ou filhas muitas vezes como amigos e companheiros. A distância mental é tão pequena entre os dois que eles conseguem esse nível de aproximação, quebrando toda a corrente hierárquica necessária à educação do ser humano. Toda a falta e toda a carência que uma mente pode sentir está à mostra para pesquisas nos adultos de hoje em dia. E principalmente nos jovens que serão adultos daqui a algum tempo.

Isso repercute em todos os níveis da vida social. Crianças são histéricas, inseguras, procuram a confirmação e comprovação de que estão certas em ídolos e figuras paternalistas. O pai é o símbolo, ou era, ou cada vez é menos, de referência do filho, a mãe é outro símbolo equivalente. O casal, cada um com sua parcela na construção do novo ser, quando hierarquicamente consolidado é um pilar na qual o filho irá se apoiar para lá chegar um dia. Quando os pais já são meros escombros de vigas retorcidas e colunas deformadas, não há mais apoio algum no qual o filho irá utilizar, e muitas vezes, estando no mesmo nível, haverá apoio mútuo de mesmo nível, o que é lamentável tanto para a consolidação dos pais, como para o crescimento da criança.

Essa forma de existir que hoje se espalha rapidamente por todas as camadas sociais, é um sintoma direto da falta de desenvolvimento interno de cada ser humano. Todos sabemos que um ser humano carente, que carece de algo, ou de tudo, é inseguro. Quem é inseguro procurará confirmações e apoio onde encontrar um pilar que ache íntegro. Se não houver tal pilar durante toda sua vida, a moral, todos os valores, todos os atos, a forma de pensar e perceber o mundo, serão relativizados. É como o estudante que possui toda a biblioteca mundial para estudar, mas não tem instrução de ninguém, tendo que sozinho ir lendo e buscando suas fontes de informação. Se toda a literatura e todos os livros filosóficos, científicos e de todos os tipos lá estiverem a chance que ele se perca no caminho e crie uma idéia absolutamente errada do mundo é enorme. Assim acontece hoje em dia. Mas o principal é que as obras mais significativas, as experiências mais enriquecedoras, não estão disponíveis ao grande público. Toda a literatura, cinema, todas as artes, os estudos, a ciência que está disponível para o grande público é da mais rasteira. Mas isso é evidente, como ensinar a uma criança um pensamento profundo, uma teoria elaborada, o método científico rigoroso? Não é possível.

Nesse momento reduz-se o mundo num círculo vicioso automático. Se as mentes estão mais fracas vamos relativizar e amenizar o estudo e os modos de compreender o mundo. E assim sucessivamente até o entorpecimento geral da mente humana em todos os níveis. Isso seria trágico por si só se fosse uma reação natural histórica da raça humana. Mas é, nesse caso, enraivecedor, pois o plano todo é orquestrado por uns poucos. O nível intelectual global tem caído profundamente nas últimas décadas. O engraçado é que era para ter crescido vertiginosamente. Qualquer trabalho literário e intelectual só pode ter lugar em sociedades confortáveis. Sociedades em que o nível de conforto atingiu um patamar tal que propicia a transferência de trabalhos braçais e de lutas constantes ao ócio individual. Deparamo-nos com um problema gigantesco aqui. Temos o nível de conforto mais elevado desde o surgimento da raça humana e ao mesmo tempo temos a derrocada do nível intelectual. Não digo que a produção deixou de existir. Nossos mercados editoriais crescem. Mas o lixo que é produzido e cada vez maior e a literatura de merda que existe é infinitamente superior a alta literatura, se ela ainda existir em algum lugar.

Qualquer ser humano com 20 anos de idade que conviveu em uma sociedade minimamente desenvolvida sabe que se ouvir um homem o aconselhando a pular de uma ponte para ser feliz vai saber que o que o sujeito diz é errado, por rápida impressão interna. Mas isso atualmente não se dá ao fato de que viver é melhor que morrer, mas simplesmente que o fato de morrer por alguma coisa maior foi simplesmente tirado do imaginário popular. A vontade individual foi minada de todas as maneiras. É impensável hoje alguém decidir algo autonomamente se isso vai contra o consenso popular de nascer-estudar-trabalhar-morrer. Aliado a esse fato temos o direito à felicidade, que é um expressão totalmente sem sentido e absolutamente vazia. A felicidade não chega através de luta, trabalho, suor nem nada disso, é um estado alcançado mais pela contingência que pelo plano elaborado, aliás somente pela contingência. Pascal Bruckner sintetizou de forma magistral esse pensamento nessa frase: “nós constituímos as primeiras sociedades a tornar pessoas infelizes por não serem felizes.”

A condição humana é ser infeliz, é ter momentos de angústia, desilusão, tristeza e lamento. Essa é a nossa condição básica, nascemos ignorantes, pelados e famintos. Somos por definição seres que alçam vôo sobre as misérias. Através do trabalho, da luta individual, do crescimento interno, do desenvolvimento dos valores, da consolidação da mente sobre o corpo. Mas todo esse trabalho não nos leva à felicidade, mas a realização humana. Muitas das vezes é trabalhosa e estafante. E na grande maioria não há felicidade em comer, dormir, trabalhar e se manter. Essas coisas básicas trazem a tranqüilidade para ser humano de forma mais plena. Quem tem comida diariamente, uma cama para dormir, possui saúde e família não deve por isso ficar feliz automaticamente, mas simplesmente perceber que possui todas as necessidades básicas satisfeitas e que a partir dali pode buscar uma completude maior. Hoje em dia, talvez, a única coisa pela qual as pessoas lutassem com a própria vida seriam seus filhos, mas uma reduzida parcela da população, a maioria bradaria por uma melhor gestão governamental enquanto culpa meio mundo pelas mazelas e segura seu filho morto no colo.

O senso individual autônomo foi perdido e com isso perdeu-se a unidade interna do indivíduo que se vê incapaz de analisar e validar ou não seus pensamentos em relação à realidade que se impõe a todos. Se a pessoa não se acha mais autônoma, pela lógica inexorável do fato teremos uma pessoa que não é capaz de se ver como canal entre si e o mundo. Essa é a doença mental que falei no começo do texto. As pessoas deixaram de perceber-se como algo real que possui correspondência com a realidade e por isso, autonomamente, são capazes de avaliar o mundo por si mesmos e tomar decisões e guiar as próprias vidas.

Essa é a típica condição da criança. Ela é incapaz de autonomia e por isso busca validar-se, e validar suas ações, pelas dos outros, dos pais, depois dos amigos, dos mestres etc. Temos um exército de crianças que não acreditam, ou não são capazes de ver o mundo como realidade mesma. E essas crianças podem ter a idade que for, temos crianças desde cinco anos de idade até crianças com cinqüenta. Esse problema é o maior problema que enfrentamos atualmente. A perda da noção básica individual como ser autônomo. E quando isso acontece, como acontece com qualquer criança, temos a realidade moldada por histórias, que não precisam de lastro real. Conte a uma criança qualquer história e ela acreditará, se for contada por alguém que confia. Por isso a sensação de autoridade da pseudo-ciência e da mídia que temos hoje é altamente destrutiva. Ela substitui a realidade mesma por histórias e narrativas. Que por atingirem crianças, terminam por serem absorvidas como realidade mesma.

A perda da autonomia é grave e traz conseqüências desastrosas para nossa sociedade. Trazem a perda dos valores, da moral e da ética, a perda da realização humana mesma, transferida para compras, trabalho e hedonismo, e trazem o mal maior, a influência à manipulação mental descarada que ocorre atualmente em todos os níveis da sociedade por uns poucos que conhecem a regra e se aproveitam dela para levar à cabo seus planos grandiloqüentes. Estar apto a perceber tais deformações sociais e mentais generalizadas é a busca básica de qualquer pessoa que perceba a realidade como está. Qualquer um que diga que sabe como trazer a felicidade e completude para a raça humana como um todo é maluco e megalomaníaco. Podemos ao máximo trazer alguns poucos esclarecimentos e uns caminhos incertos para a realização individual do ser, nunca da raça inteira, do povo inteiro, nem de toda nação. Salvar o planeta, salvar todas as crianças, salvar todas as mulheres, salvar todos os gays, salvar todos os árabes, salvar todos os judeus, salvar todas as baleias, salvar todos os negros etc., só pode ser piada de mal gosto e é, mas assim não é percebida pela maioria que não acha nada, o que é pior do que achar alguma coisa. Mas isso também é sintoma da doença mental, a perda constante de individualidade, de poder, de autonomia, de capacidade de crescimento e resolução dos próprios problemas. Perceber isso já é o grande passo para amadurecer, a criança só cresce da primeira vez que se vê como criança e logo busca crescer para ser adulto. Ou seja, ser responsável por si mesma e pelos atos que pratica.

20090206 Esclarecimentos sobre a doença mental: a mente infantilizada

Uma coisa é certa e quem se colocar contra o argumento vai ter que se ver com o desenvolvimento de todas as crianças já nascidas nesse planeta. Crianças deixadas por própria conta não viram seres humanos adultos, educados, falantes, escreventes e pensantes. A assistência quase que full time é necessária para que uma criança humana cresça e se desenvolva no que podemos chamar um ser humano. Seja essa atenção dada pelos pais, ou contratados, seja por escolas ou avós, é inevitável que uma criança seja assistida em tempo integral. Esse fato inexorável da realidade nos trás conseqüências gigantescas. E nos deixa uma boa dose de margem para argumentar que: o ser humano é a-essencial.

Por a-essencial quero dizer que o ser humano não tem um conjunto de ações e maneiras de ser pré-programadas que se auto desenvolvem, como num leão ou num cão, que em menos de 15 minutos de nascidos já andam, procuram a teta da mãe e se viram, em grande parte, sozinhos. O ser humano precisa de um guia, para desenvolver as aptidões que estão latentes em seu “programa”. O ser é capaz de falar? Sim! Mas não sozinho. O ser é capaz de escrever? Sim! Mas não sozinho. E assim por diante. Friso bem essa parte, pois é fundamental para todo o desencadear das idéias que virão. Aceito o fato de que a criança só se torna plenamente humana quando educada, vamos ao que interessa.

O que representa a individualidade humana é o Ser. Compartilhamos todos essa característica tão fantástica de ser, e ao mesmo tempo tão comum. Existimos. Mas ao existir somente nada muda e nada humaniza. O que nos torna únicos é nossa posição na existência, ou a manifestação do Ser no campo material como princípio de individuação. Assim eu sou eu e somente eu sou agora no meu lugar. Minha posição na existência diz quem sou eu. Creio que devemos levar em conta que a posição aqui não deve ser pensada somente em termos de referências espaciais quantitativas. Mas como referência primariamente qualitativa, e necessariamente quantitativa. Então é por eu ser um ser que persiste no tempo e sofre as modificações internas e externas nas quais eu sou influenciado e influencio ao mesmo tempo, que posso me chamar de Eu sem nenhum problema. Em adição a essa referência individual está o fato de eu me lembrar que eu sou eu. De nada adianta ser uma pedra, que é individual, mas não sabe que é nem se lembra que está sendo, ela é um Eu, mas sem a capacidade de saber, pensar e dizer isso, ou seja articular-se mentalmente. Pela memória consciente sabemos que somos, e só somos porque persistimos no tempo como seres pontuais que influenciam e são influenciados ao mesmo tempo, ou seja, temos consciência de memória.

É a dupla, memória consciente e consciência da memória, que nos dá a capacidade de saber tudo o que foi dito anteriormente. Se achou difícil de entender tente se lembrar de como você ouve uma música. A primeira nota é tocada em um tempo totalmente diferente da última nota, as variações, cada uma delas, é independente das outras, a sequência é que faz a música, e a chamamos de música pois conseguimos guardar na memória desde a primeira nota até a última as unindo, na síntese intelectual, no que chamamos propriamente de uma música. Se assim não fosse e por acaso não tivéssemos memória só ouviríamos uma nota e somente uma nota de cada vez sem conseguirmos saber que aquelas notas individuais tocadas em sequência fazem parte de um único agrupamento. A lembrança da sequência de notas tocadas de certa maneira com certa ênfase é que juntamos em um bloco só e “ouvimos” como uma música, e por fim temos a experiência total dela. Assim como a música só é capaz de existir pela memória, pela consciência da memória e a memória da consciência, que acontecem simultaneamente. Só podemos nos perceber como seres pelo mesmo processo. E é exatamente nesse ponto que diferimos dos outros animais, que não possuem a simultaneidade da memória consciente e da consciência da memória. Não há articulação entre esses dois fatores. O que nos leva a crer que a intensidade qualitativa da consciência animal é reduzida, e a capacidade de memória também, já que grande parte de nossa memória é “requerida” pela consciência.

Alguns fanfarrões apressados poderão pensar que se é assim que a coisa se desenvolve podemos entrar num ciclo eterno que fica auto-retornando em si mesmo e prende a memória a si mesma enquanto temos consciência de algo ilusório, teríamos a consciência sempre das memórias e nunca de novos inputs. Mas para esses que adoram reduzir o ser humano, ou a mente, a um esquema torto só tenho que lembrar que somos dotados de uma capacidade infinita de conhecer o conhecimento que conhecemos. Assim temos consciência da memória ao lembrar que somos conscientes de nossa memória consciente. Podemos ser conscientes da nossa consciência, e ter consciência que somos conscientes da nossa consciência, ampliando o espectro a camadas impossíveis de qualquer limite. Aliando isso aos sentidos, que são a porta de entrada de novos estímulos, temos sempre o contato interativo com a realidade. Fugindo assim das determinações positivistas que são a moda que ainda perdura em nossa sociedade.

Esse ponto requer uma explicação mais apropriada. Temos o conjunto psico-físico, que envolve o nosso corpo e a nossa psiqué, ou mente, mas temos ainda o princípio de individuação. O nosso Ser próprio. Esse Ser nos dá o intelecto, que forma um conjunto com a mente e o corpo. Temos assim um conjunto tríplice de: intelecto, mente e corpo. Quem nunca sentiu um impulso carnal, que se manifesta pela mente, e uma vontade oposta no intelecto, que nos diz, ou pergunta, se aquilo é bom ou não, não é humano. Essa dualidade do corpo-mente e intelecto é latente. Dessa maneira muitos são os que reduzem o indivíduo à sua mente, que é necessariamente ligada ao corpo e por isso constitui com ele um sistema. Mas isso de maneira alguma descreve o indivíduo totalmente. Assim temos o intelecto.

O conjunto corpo-psiqué não passa do nosso ferramental básico, que vai ser utilizado pelos meios educacionais para se transformarem em alguma coisa. Quando falo em meios educacionais não confundam com esse raio de pedagogia que temos atualmente, falo simplesmente do fato tradicional do ensino a criança primeiramente a andar, depois a falar, e posteriormente a escrever. Sem contar os modos de se comportar e práticas sociais normais. Quando falo que “ensinam” o filho a andar é mera força de expressão, pois a criança se arrasta e engatinha sozinha, assim como pronuncia sua primeira palavra por conta própria. Isso mostra que temos certas pré-disposições, mas só florescem no seio da família (da atenção, do cuidado, ou seja, a educação). O contato com outros seres humanos é fundamental. Parece que tudo isso que eu falo é tocar no óbvio, mas esquecemos completamente do óbvio. É característica intrínseca do óbvio passar despercebido. É óbvio que nós respiramos, mas praticamente não lembramos disso no dia a dia, e felizmente não precisamos lembrar para respirar.

Tudo isso serve para ilustrar que ao longo do crescimento humano somos determinantemente dependentes e nessa dependência outra característica é muito importante para o bom desenvolvimento humano. A alimentação. Se nos alimentarmos de papelão diariamente durante nosso crescimento desde o nascimento é claro e óbvio que danos irreversíveis vão acontecer. Uma alimentação minimamente satisfatória deve ser administrada para um funcionamento saudável do corpo humano. A analogia fica bem clara quando exposto que mente também é assim. Quando alimentada com as formas mais obtusas de alimentos ela se torna deficiente e capenga, se afasta do intelecto (aqui não como operador racional dos pensamentos, mas como princípio de individuação próprio do ser humano). Devemos ainda lembrar que a razão está longe do mero racionalismo a que é associada hoje. A razão é o próprio ato de inteligir, é a inteligência em ato. Cabe ainda ressaltar que a razão não é propriedade meramente humana de pensar, mas está também nas coisas.

Não é surpresa que ao serem criados desde pequenos crendo que judeus eram a escória da humanidade, a juventude hitlerista realmente acreditou nisso. Assim como as crianças Hutus que cresceram em meio ao genocídio de 1994 hoje em dia são militantes e revolucionários que vêem os Tutsis de maneira deformada. Ou seja, o modo como a mente vai se moldar depende totalmente das informações que lhe chegam. É bem difícil que uma mente que nunca viveu em um ambiente democrático saiba o que seja democracia, por mais que tome conhecimento teórico sobre a coisa. As teorias, informações abstratas, só possuem valor depois de certa medida de vivência mesma, mais ou menos é a passagem da mente para o intelecto, assim o fortalecendo. Se o sujeito nunca viu uma fruta, não adianta descrever para ele o que é uma maçã, uma pêra ou um abacate, ele só vai ter a idéia conceitual daquilo. Mas se ele já viu uma fruta, é muito mais fácil de entender o que seja outro tipo de fruta. Por isso que a educação tradicional era em muitos âmbitos prática, só cabendo os conhecimentos mais abstratos depois de certa vivência.

Assim podemos concluir que quanto melhor o nível de informações que chegam durante a formação de uma criança melhor. Se se deseja que a criança tenha uma mente aberta e ampla, dê-lhe informações amplas. Se se deseja que a criança seja ignorante nada lhe apresente. É uma lógica simples e cabal. Assim se você deseja que uma pessoa entenda o movimento histórico no qual participa, ensine-lhe os métodos de avaliação da história, e não os dados fatuais da história. Se você deseja que o sujeito não entenda nada de matemática, ensine-lhe somente a aplicação da matéria e nunca seu fundamento.

O ensino amplo e diversificado não significa uma permissividade. Não é porque temos a capacidade de formarmos uma mente ampla que isso signifique que devemos conhecer tudo, ou pensar qualquer coisa. Devemos ser capazes de ter um ferramental amplo. Esse ferramental, no caso o mental, é indispensável para a formação e qualificação do intelecto. Quando um ser humano não é estimulado a reforçar seu intelecto criamos seres passionais, emotivos, sensíveis a qualquer besteira, manipuláveis, fracos e infantis. O conceito básico da transformação da criança em adulto está exatamente na tomada de responsabilidade que lhe é imposta, tanto interna quando externamente. Primeiramente a responsabilidade costuma vir de fora, dos adultos que lhe cobram, e posteriormente é introjetada. Mas se é preciso ter responsabilidade para ser responsável, só se aprende ser responsável sendo.

Como o corpo físico obedece a certa lógica do mundo material para se desenvolver e agir, podemos falar também da lógica do intelecto. Quando esquecemos o intelecto criamos os andróides de Issac Asimov. Esses andróides, ou robôs, possuem mentes reativas que funcionam no mundo com certa capacidade de análise, movimento e ação. Mas por serem projetados possuem em sua programação fundamental três leis básicas da robótica, leis criadas pelo próprio Isaac, que controlam seu “funcionamento”, são essas: 1) Um robô não pode ferir um ser humano ou, por omissão, permitir que um ser humano sofra algum mal; 2) Um robô deve obedecer as ordens que lhe sejam dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens contrariem a Primeira Lei; 3) Um robô deve proteger sua própria existência desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira e Segunda Leis. Essas três leis regem os cérebros dos robôs e a maioria das histórias do livro Eu, Robô giram em torno de problemas lógicos causados por situações várias em que robôs entram em conflito interno por não conseguirem lidar com as contradições entre as situações e sua programação. Nesse ponto o filme estrelado por Will Smith, com o mesmo nome do livro, aplica cabalmente a lógica de Issac no computador central que controla todos os outros robôs em um link por satélite. A beleza do filme está em acompanhar de forma coerente e precisa a lógica dos contos do autor. Nesse filme o criador do robô central prevendo, pela lógica imputada na central robótica, que seria um caos e perigoso para os seres humanos cria um outro tipo de robô. Que será o protagonista da aventura. Este robô difere determinantemente dos outros por um único fator. Quando previu o desastre total, o criador dos robôs só conseguiu quebrar a sequência lógica de movimentos programados ao inserir outro cérebro no andróide. Esse outro cérebro é encarregado de avaliar as situações em que as três leis valem e ter autonomia de pensamento em relação à lógica estrita de ação do primeiro cérebro. Dessa maneira essa era a única saída possível para quebrar a corrente de acontecimentos apocalípticos que estavam em curso. O filme difere dos contos de Isaac pelo desenrolar da situação, no livro as situações são contornadas pela ação intelectual dos seres humanos envolvidos nas situações, no filme, o desenrolar é pela força, por saltos e piruetas, mas assim é hoje em dia Hollywood, que faz filme para crianças, tenham elas cinco ou cinqüenta anos.

Esse filme ilustra muito bem a condição humana. E o desenvolvimento do segundo cérebro é a nossa natureza mais básica. O que inquieta muitos é que nosso segundo “cérebro” não tem natureza física, mas somente sutil. Nosso intelecto, nosso Eu que “habita”, aqui com sentido de habitat ou lugar de coexistência, o corpo material, não é visível. Essa qualidade do ser humano é ignorada na quase totalidade dos casos da ciência e das especulações intelectuais.

Se queremos educar nossos filhos para que tenham autonomia intelectual, não é possível que primeiro não saibamos o que ela significa. Recorramos ao sábio Mário Ferreira dos Santos para nos esclarecer: “A intelectualidade é a função que capta semelhanças e diferenças. Chama-se intuição intelectual a intuição quando capta semelhanças e diferenças. (Intelecto vem de inter e lec. Inter significa entre, e lec é um radical que significa tomar, captar. Daí temos: ler, que vem de legere, eleger, de ¬e-lec, tirar para fora, separar; assim coleccionar, seleccionar). É por meio da intelectualidade, que o ser humano põe ordem ao caos dos acontecimentos, dos factos, que formam o existir.” Cabe esclarecer que o existir também engloba o próprio ser. Sem força intelectual ele não consegue sequer saber o que se passa com ele. E não podemos negar que a consciência é qualidade do intelecto. Assim a dupla memória consciente e consciência de memória só podem se dar pelo intelecto.

Atualmente criamos nossos filhos para serem completos des-intelectualizados, e isso não é no sentido de intelectual como aquele ser pensador, reflexivo ou recluso e dedicado aos estudos. Mas no sentido de que as situações e os fatos mais imbecis são devidamente ignorados, mal-interpretados, distorcidos etc. Criamos um exército de seres tão fracos intelectualmente que não conseguem fazer os links mais pueris entre causa e conseqüência, entre atores ativos e receptores passivos, entre determinantes fixas e as variáveis, ou seja, nada que ouse passar pela visão clara e objetiva (no sentido mais amplo) da realidade consegue ser intuído. Todo o processo da existência é deformado ou mal interpretado pelas mentes infantis que temos hoje. As mentes infantis estão tanto nas crianças, nos adolescentes e até, e cada vez mais, nos adultos. Cada vez mais infantilizados, fracos, débeis e pueris os seres humanos perdem qualquer capacidade de realização, transformação, auto-controle e interação com o mundo. Resultando no ápice da idiotização quando vemos hoje pais recorrendo a juízes, pois não conseguem controlar seus filhos.

É característico das mentes infantis acreditarem em tudo que dizem para elas, ou pelo menos acreditar em tudo que certas figuras de autoridade lhe dizem, secas de informação e carentes de autoconsciência reflexiva elas passam a maior parte do tempo concordando ou discordando. Não existe realidade para uma criança e sim apenas a construção de um mundo etéreo, não por acaso as literaturas de fantasia são a coqueluche das crianças e adolescentes. É característico das mentes infantis bradarem por tudo que desejam, sem qualquer filtro intelectual. A mente infantil é aquela que age indiscriminadamente. Toda a culpa pelos seus atos é automaticamente impugnada aos pais. Não é coincidência que em nossos tempos de bilhões de mentes infantilizadas as relações tenham sempre que ser regulamentadas e regidas por um poder de autoridade. Hoje temos a conjunção das mentes infantis com as três leis de Asimov. Se afastando daquela programação dá curto e tudo pára. E é justamente o que acontece ao nosso redor. Quando todos os jornais dão palavras de ordem, fazem todas as análises que serão repetidas pelas bocas populares, montam um séquito de pseudo-autoridades científicas para dizer a cada hora o que deve ou não deve fazer, dão dicas e pitacos de como cuidar da saúde, como cuidar da casa, como cuidar dos filhos, dos cães, da natureza, combater a discriminação etc., não podem concluir nada além daquilo que mostra o discurso típico de um pai para o filho.

Essa carência intelectual é notável e se dá justamente na parte da consciência e da memória. Atingidas full time com novas visões da realidade, cada vez mais contraditórias, essas pessoas por não possuírem as mais básicas ferramentas mentais são capazes de defender dois discursos simultaneamente sem saber que eles são obviamente contraditórios. São capazes das atrocidades lógicas, mentais, físicas e concretas mais díspares.

É substancial que as características que contribuem para o equilíbrio intelectual, e seu crescimento, não são materiais. O intelecto por ser uma função sutil não é regido pelas determinações espaço-temporais. O corpo humano se desenvolve ao longo do tempo, ele vai-se tornando cada vez mais humano na medida em que se transforma. Esse tipo de transformação é quantitativa. Por ser assim, determina certas afetividades e sensibilidades próprias dos corpos. Como um corpo extenso qualquer que é definido pela sua disposição quantitativa, que termina por determinar também algumas de suas propriedades qualitativas, assim o corpo humano também o é. Nesse mesmo campo podemos esclarecer que o corpo humano se torna pleno quando suas partes quantitativas se tornam de tal ou qual modo. Mas o desenvolvimento do intelecto não corresponde a essa relação descrita. O intelecto por ser puramente qualitativo não “cresce”. Ele, por participar da qualidade, se torna mais intelectual ou menos intelectual. Aqui a analogia é como o branco que é mais branco na medida em que se aprimora na brancura, ou seja, intensidade. O tempo e o espaço não interferem nesse processo. Desse modo é risível achar que por estar em uma escola assistindo aulas durante boa parte da sua vida um indivíduo irá automaticamente qualificar seu intelecto.

As mudanças qualitativas do intelecto só se dão no âmbito da determinação individual. O papel do estudante é aprender, mas para tal é preciso querer aprender. Interessar-se pelo conteúdo e buscá-lo ativamente. Esse processo é fundamental para o desenvolvimento do intelecto como capacidade de síntese e divisão da realidade. Em grande parte isso se dá através da linguagem. A fala e a escrita contribuem ativamente para desdobrar das capacidades intelectuais. Por isso a tão buscada erradicação do analfabetismo. Essa questão é ainda mais profunda quando constatamos que não é o domínio da técnica de leitura e escrita que desenvolve o intelecto, mas como essas técnicas serão utilizadas. Como disse mais acima o conjunto corpo-psiqué é uma ferramenta que deverá se desenvolver, quem usa essa ferramenta é o indivíduo como Ser. Assim o aprendizado da leitura e da escrita são ferramentas que precisarão de um foco em sua utilização. Martelar um prego pequeno com uma marreta gigantesca é o uso descabido da ferramenta para o fim que lhe é próprio. Pensando nesse caminho qualquer tipo de matéria escolar só é necessária quando o indivíduo sente que aquele conhecimento lhe falta. A busca da completude do intelecto só pode ser buscada individualmente. Já as ferramentas básicas do intelecto hão de ser impostas pela educação

Quando a educação era ministrada na reclusão da residência essa necessidade era premente. Envolvido diretamente no contexto da vida que vivia a mente que era educada dava sentido para aquele aprendizado. Quando este é dissociado da vida privada, ou pelo menos erigido como modelo educacional nacional, o indivíduo não percebe mais essa integração, e pior ainda é quando os pais também não vêem sentido para o que o filho aprende. Qualquer tipo de aprendizado pressupõe uma posição daquele que ensina. Seja por achar que a educação é necessária ao desenvolvimento do indivíduo, seja por questões práticas de gerência dos negócios da família, ou ainda pelo fomento do conhecimento como forma de integração pessoal, a educação passada diretamente pelo próximo não distanciava das questões morais e dos valores ali contidos. Em tempos que a educação era um privilégio da aristocracia, ela era vista como forma de melhorar o indivíduo para a vida que iria ter e não tinha qualquer papel pedagógico universal dos direitos à educação de hoje. Quando possuímos um exército de professores que nada mais querem que apenas ganhar seu salário, esse ensino não passa de mera formalidade, ou necessidade de mercado. Não podemos esquecer que a maioria das pessoas não necessita diretamente de um conhecimento aprofundado em história, geografia, química, biologia, física etc. O que antigamente era ensinado aos indivíduos eram matérias muito mais básicas e necessárias. Não é tão estranho que antigamente um político era jusfilósofo, entendia de medicina e flertava com outras áreas. Tudo isso aprendido de maneira autodidata. Quando você priva o intelecto das matérias básicas de sua formação relega o indivíduo a uma prisão, na qual ele é incapaz de se conhecer, conhecer o mundo ou saber o mínimo para avaliar qualquer tipo de conhecimento que seja.

Isso caracteriza o ataque direto à consciência e à memória. Esquecendo da consciência, do intelecto em última instância, e sobrecarregando a memória com informações que não possuem nenhum nexo lógico, que fomentam a desestruturação dos valores tradicionais ao desvincular o aprendizado do crescimento moral, abrindo espaço para a doutrinação ideológica antes mesmo do aprendizado das ferramentas de análise do indivíduo e pregando conceitos deturpados, a nossa educação não faz mais nada que desequilibrar mentalmente os alunos e tornar suas mentes débeis e deformadas. Não é estranho que o aprendizado das gerações sucessivas desde a década de 1950 decaiu a níveis alarmantes. A dissociação do desenvolvimento do sujeito de seu aprendizado trouxe malefícios enormes ao quadro da sociedade mundial. O ensino foi substituído pelo treinamento técnico.

Se ainda temos expoentes nos níveis técnicos, no campo da aplicação estrita de conhecimentos técnicos, no campo humano a desordem é generalizada. Quando o conhecimento universal e tradicional é extinto sendo substituído pela permissiva militância e o informacionismo descabido é exatamente isso que acontece. Criamos gerações inteiras de zumbis, ou de idiotas-úteis, que nada mais fazem que sobreviver sem qualquer sentido em suas vidas. Perdendo toda noção do que seja um ser humano autônomo e íntegro essas mesmas gerações deformadas nunca poderão passar às próximas gerações o tipo de conhecimento que fomentará o intelecto, causando uma notável infantilização das mentes, já que essas não podem ser responsáveis pelo que não conseguem fazer, nem querem fazer.

Quando se esgotam as energias da mente com informações a serem seguidas, e não se ensinam as ferramentas intelectuais de análise e decisão que tornam as existências autônomas, só podemos concluir que isso causa uma estafa mental absoluta no indivíduo. A capacidade intelectual de síntese e separação se esvai no mundo das possibilidades e nunca vêm a se tornar concreta. Quando a capacidade de perceber o campo dialético da existência não existe, e com isso tornando a capacidade de análise de qualquer situação concreta inexistente, o indivíduo, já de muletas mentais, é manipulável em qualquer nível pela ação constante do condicionamento mental perpetrado pelas mídias. Não é difícil vermos cidadão fazendo cara feia para um fumante que está a meia distância quando ao mesmo tempo não acham horrível a fumaça negra de carros, caminhões e vans. É só por essa i-lógica que podemos estabelecer que o resfriamento de boa parte do mundo é devido ao aquecimento global causado pelo homem. Ou pensamentos do tipo “rouba, mas faz”. Quando as capacidades de interação com um mundo complexo e articulado para desestruturar a mente do cidadão não estão presentes, esse mesmo mundo parece um emaranhado indecifrável de causas e conseqüências, onde o cidadão se vê como se numa selva sem bússola.

Quando falei mais acima que a dupla, consciência da memória e a memória consciente, faz o ser do ser humano mais humano, não foi à toa. Tudo o que descrevi só abre o caminho para que os seres ignorem suas capacidades intelectuais mais básicas e tratem o mundo como uma selva, na qual o único tipo de avaliação que pode existir é “gosto” ou “não gosto”, ou “concordo” ou “não concordo”. Mentes infantis são incapazes de perceber o mundo conscientemente de maneira concreta. Assim é fácil ver a maioria das pessoas falando que “não concordo com seu ponto de vista” quando na verdade nada foi opinado, mas simplesmente descrito. É notável no caso de Barack Obama. Quando descrito como criminoso, a primeira coisa que fazem é “não concordar com a opinião”, como se fosse realmente uma opinião e não uma descrição literal do sujeito. A in-capacidade de ver o mundo de forma natural e saudável só pode acontecer pela total perversão da mente humana. E é isso que chamei de doença mental. Que exigida cada vez menos possui, ou se atribui, cada vez menos responsabilidades, que é o passo determinante para a autonomia e o posicionamento no mundo como indivíduo autônomo. Essa situação se tornará insustentável, e o caos generalizado não tardará aparecer. Mais duas gerações de infantis e todo o progresso e conhecimento acumulado da humanidade estará esquecido, relegado somente a alguns iniciados, que por assim serem parecerão como que místicos, donos de conhecimentos profundos, quando na verdade detém somente o que seria normal para todo cidadão. A infantilização da mente é um processo destrutivo de última grandeza, e não pode ser deixado como está, mas pela organização estrutural que vemos da sociedade muito pouco pode ser feito, a não ser lutar bravamente sozinho, ou em pequenos grupos, para não deixar os benefícios conquistados do pensamento humano ao longo de toda a história morrer. Pois se assim for, estaremos perdidos, nos tornaremos em animais, que lutam pela sobrevivência, sem qualquer consciência disso. Mais ou menos como acontece hoje em dia.