A"EXCOMUNHÃO" TAMBÉM É SOCIAL!

"ARRISCO PENSAR MESMO NA DOR DE QUESTIONAR"

(MAVI)

Desde que o mundo é mundo, a Igreja sempre esteve ao lado, senão a frente, das decisões dos ESTADOS, estes definidos como organizações sociais e administrativas , ou seja, a representação institucional duma sociedade politicamente organizada.

Quando o poder não era o próprio "deus" caberia aos religiosos a importante missão de intermediar a vontade de "deus" para que o povo e as nações assim a cumprissem.

E assim o mundo caminhou e tenta ainda caminhar pela história dos homens...de modo que as ações da terra sejam subordinadas, ou moduladas às ordens do céu.

A igreja, no decorrer da história, e aqui refiro-me ao "corpo de igreja", independentemente de crença religiosa, também se transformou, e o pensamento foi buscando força e entendimento para delinear as forças que "desse mundo", aliadas às "do outro mundo", moldariam os caminhos futuros da humanidade.

Chegamos ao século vinte e um , e aqui no Brasil somos regidos por uma CONSTITUIÇÃO LAICA, ou seja, nosso Estado BRASILEIRO é algo totalmente desvinculado de qualquer poder eclesiástico, embora saibamos que, a despeito do sincretismo cultural e religioso, ainda somos um nação de predomínio católico.

É o que dizem as estatísticas.

Quando eu era criança, dentro da minha formação religiosa CATÓLICA, APOSTÓLICA E ROMANA, tinha muito medo da palavra "excomungar".

Além de feia, me soava pesada, e me parecia com algo que me abriria as portas do inferno.ENFIM,ASSOMBRAVA-ME!

Então, tomava os devidos cuidados para não correr o risco de perder a comunhão com a Igreja , embora ainda não soubesse que nossa comunhão com Deus dispensa totalmente intermediários.

Cresci e aprendi a pensar.

O custo é alto, muito alto, mas já me é mais acessível enxergar que entre um ESTADO POLÍTICO e um ESTADO RELIGIOSO o que muda apenas são os instrumentos de controle e submissão, o cenário do domínio, e o custo para se pertencer a um ou ao outro.

Pertencer aos dois nos encarece em demasia, posto que temos que dar conta dos dízimos e dos impostos.

Mas, voltando à excomunhão, filosofica e teológicamente aprendemos que todos somos criados a imagem e semelhança de Deus.

Se somos uma infíma centelha de Deus, então jamais seremos dele excomungados , nem de sua corporificação física (a igreja de irmandade que todos somos!), muito menos da metafísica, ainda que por decreto daqueles que julgam conhecer e comandar os mistérios.

E a palavra "excomunhão" voltou-me dos meus longínquos tempos de criança, via mídia, quando da polêmica que por hora surge frente a necessidade de se interromper a gestação GEMELAR duma menina de nove anos vítima de estupro, neste caso interrupção amparada legal e duplamente pelo código penal brasileiro.

Para contradizer o dito popular, o caso só foi parar no Bispo, embora a decisão dos médicos não tenha passado pela permissão, tampouco pela benção do mesmo.É compreensível.

Dessa vez não perguntaram ao Bispo!

Porque dentro dos preceitos éticos e bioéticos a ciência é autônoma!

É indiscutível que óbviamente tanto a ciência quanto a teologia, ambas são pela vida, mas se nos reportarmos a HISTÓRIA DA HUMANIDADE, a Igreja não pode negar que a ciência lutou e tem lutado muito mais pela vida, do que os religiosos! E pela vida digna!

O Bispo comparou a INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO GEMELAR (CUJA EVOLUÇÃO COLOCARIA A VIDA DAS TRÊS CRIANÇAS EM RISCO) com o holocausto nazista, e imediatamente me lembrei das páginas históricas das Cruzadas e da Santa Inquisição.

Difícil entender o ser humano...

Mas aqui há uma outra questão se não teológica, ao menos filosófica:

Será que o direito a vida é apenas o direito de vir ao mundo?

E o conceito de FAMÍLIA QUE A IGREJA TANTO DEFENDE?

Como seria a vida futura dessa menina que aos nove anos é vítima de estupro, a carregar a difícil tarefa da maternidade sem condições psíquicas?

E as crianças que viriam, a qual o contexto social e familiar seriam inseridas?

Caso vingassem, ficariam com a família traumatizada, ou o nosso Estado tão disciplinarmente desconstituído de qualquer mazela social daria conta de encaminhá-las pela vida cidadã?

Aliás, o que a Igreja efetivamente tem feito para mudar a nossa trajetória social assustadora, na qual milhares de pessoas perdem a vida todos os anos nas mãos de assassinos hediondos que nunca foram excomungados!?

Quantas crianças são "abortadas" holísticamente pelas consequências ocultas de tantas mazelas advindas do caos social?

Quantas crianças são "excomungadas" socialmente, execradas do mínimo material e espiritual para uma vida de dignidade?

Então, eu pergunto, pela fala do Bispo, pedofilia e estupro seriam crimes mais leves na escala dos crimes que chocam a opinião pública?

Será que é assim que a igreja pensa quando trata da pedofilia que se infiltra dentro da sua própria casa?

Será que os religiosos têm a verdadeira noção do que é um trauma familiar dessa proporção?

É preciso ser pais para poder sentir...

Estou estupefata!

Tão nobre quanto o direito a vida, é o direito de se viver em paz e em comunhão com a sociedade dessa "terra", bem abaixo do céu que misteriosamente nos rege.

Até Deus deve estar assustado!