O poeta de pasárgada - I-Parte (Cinzas das horas)

Impossível falar de Manuel Bandeira poeta de passargada sem comentar da perseguição pela morte em toda sua caminhada e da importância que essa indesejável exerceu em sua poesia sempre nas sombras de um tormento companheiro de toda vida e um inútil luar a persegui-lo sendo assim durante toda vida. Costumo chamá-lo de filosofo da morte por conta de sua destreza, sensibilidade e tranqüilidade ao falar desse temor, pavor de nós todos. É incrível a presença em quase todos os seus poemas da mãe das sombras, da deusa das trevas, do trem mórbido de tristeza. Em cinzas das horas livro publicado em 1917 com vestígios ainda do parnasianismo e simbolismo o temor da morte esta em todos os seus poemas e foi à inspiração maior, morte que está presente ate no titulo da obra, cinzas.

“sou bem nascido. Menino

Fui, como os demais, feliz

Depois veio o mau destino

E fez de mim o que quis.”

(Epigrafe)

Cinzas das horas são poesias de maior importancia junto a carnaval em toda obra de Manuel Bandeira, pois foram os livros precursores de sua entrada no movimento modernista de 1922 e estão neles algumas das poesias imortais e também da revelação do amor pela família manifestado em poemas longos como: cartas de meu avô, a minha Irma e elegia para minha mãe foi extremamente grato a seu manto familiar.

“O meu semblante está enxuto

Mas a alma, em gotas mansas

Chora, abismada no luto

“Das minhas desesperanças.”

(Cartas de meu avô)

Tinha pela irmã eterna gratidão, amor e ternura quando ela se foi à dor em seu peito se alastrou em seu corpo inundando o coração de lagrimas assim como quando foi seu pai, seu avô e sua mãe dores maiores que se foram antes mesmo dele jurado pela doença presa apenas no seu inconsciente. A Irma sempre companheira do seu lado nunca se ausentou, nunca o abandonou nas horas de angustias, nas horas em que batia na porta a iniludível querendo arrumar suas malas. Eterna gratidão transformada em poema, ou melhor, em soneto.

“Por isso aqui minh’alma te abençoa

Tu foste à voz compadecida e boa

“Que no meu desalento me susteve.”

(A minha irmã)

Foi homem que toda vida sofreu, sofreu com uma doença que a cada dia tirava um pouco de vida, a cada hora mais vulnerável a perversa doença, as pessoas queridas o deixava, entes queridos se foram. Sua angustia aumentava e com ela a cantoria falava mais alta, passava para os versos toda melancolia, foi assim quando sua mãe faleceu em elegia para minha mãe.

“Relembro o rosto magro, onde a morte deixou

Uma expressão como que atônita de espanto.

(que imagem de tão grave e prestigioso encanto

Em teus olhos já meio inânimes passou?)”

(Elegia para minha mãe)

E fazia versos como quem chora galopando na nevoa mascada de uma madrugada desconhecida pelos seus olhos de suplicante ao olhar para destino cada dia mais incerto. O amor em sua vida foi tão escasso que as poucas chamas existentes viraram fumaças.

“Amor – chama, e, depois, fumaça...

Medita no que vais fazer

“O fumo vem, a chama passa.”

(Chama e fumo)

Em sua desesperança o silencio prendeu a respiração amorosa e libertou o dom maior de escrever, foi entre todos de sua época critico voraz e através do olhar moribundo e largo foi incrivelmente perceptor da movimentação ao seu redor, voraz apreciador do tempo, da morte e da melancolia.

“Chora de manso e no intimo... procura

Curtir sem queixa o mal que te crucia

O mundo é sem piedade e até riria

“Da tua inconsolável amargura.”

(Renúncia)

Cinzas das horas verdadeira apresentação de estilo e forma de lidar com as palavras, com a vida amarga, com os corvos pousando em sua vida

Alçando voo lento de um lado a outro da caminhada com intuito que iria findar a qualquer momento com algumas poucas cinzas frias o que não aconteceu, caminhou longe e deixou cinzas vivas de beleza e vivacidade, deixou em todos os seus súditos leitores um doce sabor na boca.

Jânio Lima

São Vicente, 20/09/09