UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL, UMA TÉCNICA EXPIATÓRIA DA DESOBEDIÊNCIA NATURAL DA SOCIEDADE CAPITALISTA OCIDENTAL.

Qual é o papel das Áreas Naturais Protegidas, transformadas em Unidades de Conservação de Proteção Integral na vida do homem? Devem ser desejadas ou rejeitadas? Elas são inevitáveis? Questões como essas povoam a mente de cientistas, políticos, ambientalistas e o público em geral.

Para tentar compreender a razão deste conflito talvez benfeitor... talvez malfeitor... é necessário reconstruir a “primeira idade do mundo”, entrar naquele Éden, onde o pecado do uso de recurso natural, representado pela maçã, rompeu as fronteiras do paraíso e deu lugar ao conflito de uso do recurso e do próprio Éden. Esse conflito de uso do recurso natural pelo homem se constituiu no primogênito das obras da humanidade, e desde então a persegue sobre a terra.

A exploração desordenada do recurso natural configurou-se na filha expiatória da desobediência natural, aquela que a Unidade de Conservação de Proteção Integral quer apagar da história da humanidade. Ao confinamento da natureza sob a guarda da Unidade de Conservação, acrescentou-se a exclusão humana, uma espécie de expulsão do homem pecador do paraíso. Tanto quanto foi possível, ela, a Unidade de Conservação, saneou a natureza com dois elementos de seu próprio conceito: a exclusão do humano e a proteção do não-humano.

Odiosa para os excluídos, ela, a Unidade de Conservação de Proteção Integral, martirizou as gerações que se seguiram. De pai para filho, a história do Século XX transmitiu inquietações à essa comissária das obras naturalísticas, que quis se visualizar como torturadora e incompreendida para uma parte da humanidade. Principalmente para a parte da humanidade excluída da construção das Unidades de Conservação, tidas pela parte criadora como a deusa do bem (preservação) e do mal necessário (exclusão).

As Unidades de Conservação de Proteção Integral andaram por mais de um Século sob o peso da redenção e da maldição da humanidade. Cansada de sua tarefa reparadora e de inspirar sentimentos opostos, elas esperaram com impaciência a vinda do conceito humano da conservação. Este novo conceito, apesar de ainda conflituoso, criou um clima de redenção para esse tipo de Unidade de Conservação com sua abominável fama de excludente, bem como auxiliou a destruição desse execrável estigma que levava consigo.

A sociedade capitalista ocidental esperava que o modelo de Unidade de Conservação de Proteção Integral fosse a redentora dos conflitos de uso dos recursos naturais. No entanto, para essa sociedade esperançosa foi reservada sua violência sob o signo da repressão naturalística em suas fronteiras, contra o humano, considerada uma santa missão destinada ao preservacionismo. Esse lugar preservado reduziu à simples visitas as possibilidades de carícias entre o humano e a natureza.

As Unidades de Conservação de Proteção Integral foram de fato magníficas e fiéis amantes da humanidade-ciência, cuja capacidade de sofrimento pela presença humana ultrapassava o que ela tinha conhecido em sua história natural. Naquele tempo moderno em que, solitária e abandonada na história, a natureza assumia, mesmo que encarcerada, os pecados do mundo. Foi abraçada pela Unidade de Conservação, e tornou-se grandiosa por suas belezas cênicas e pelos recursos naturais que a fazia tão especial.

O abraço, no entanto, tornou-se tão terrível que a natureza empobreceu-se de humanidade. Sua agonia foi seu noivado com a humanidade-ciência. Seu sinal de aliança, como de qualquer noiva, foi um anel, mas um anel enorme que de anel tinha apenas a forma e, além de ser um símbolo de casamento, era um emblema de poder, uma fronteira geográfica. Com esse diadema a Unidade de Conservação cingiu a fronte da natureza, antes mesmo que a sociedade tivesse trançado uma coroa de conflitos adornada de histórias de ausências de natureza.

A Unidade de Conservação saciou a natureza com os únicos afagos de que era capaz, isto é, com tormentos atrozes de isolamento e de um mundo não-humano. E até hoje não mais a abandonou.

A solidão e a pobreza de humanidade permanecem lá na Unidade de Conservação de Proteção Integral e em sua natureza encarcerada, como apartadas da sociedade. A sociedade vem esperando o dia em que a natureza escapará para sempre dos braços da Unidade de Conservação e se reabilitará nos braços da humanidade, talvez outro pesadelo, mas com certeza, com novas oportunidades.

Tão vituperada quanto a Unidade de Conservação de Proteção Integral, elevar-se-á com a sociedade, a natureza encarcerada, que se verá dominadora do mundo e com sua missão ratificada e enobrecida. Doravante, elas, a Unidade de Conservação de Proteção Integral e a natureza serão compreensíveis para a sociedade e respeitadas, até o fim dos tempos.