Sobre a busca por um estilo próprio

- Um escritor deve evitar ler outros autores para estar livre de influências na definição de um estilo próprio.

- Qual a minha opinião sobre este assunto, digo: a minha, a opinião da 'Helena'?

Depende do propósito de cada escritor. Eu, de minha parte, acostumei-me à idéia de que escrever e ler (textos próprios ou os de outrem) são atividades inseparáveis. Tenho certeza que só fui motivada a escrever minhas próprias idéias depois de muito ‘ouvir’ as de outros. Fosse para contestar ou concordar com elas. Outras vezes para adicionar novas informações, em suma, para contribuir com alguma coisa.

Motivou-me a escrever este texto um comentário que li, por acaso, hoje de manhã. O autor defendia o ponto de vista de que literatura, antes de ser vista como algo obrigatório em escolas e faculdades, deveria ser vista como algo que se faz por prazer, sim pelo puro e simples prazer de compartilhar mundos e informações através da mágica da palavra escrita, desenhada, tocada, coreografada, recitada etc. E para esse texto havia um único comentário, breve. E nele o comentarista, ou a comentarista, colocava a primeira idéia acima, a de que um escritor, em busca da originalidade, deveria evitar a leitura de outros considerados mestres, isso para estar livre de influências e assim poder desenvolver um estilo próprio. Como um tipo de evidência, ele - ou ela – coloca muitas vezes ter encontrado em textos alheios não o autor em si, e sim o espelho de seus mestres.

Tudo bem. Esse pensamento “imitatio” não é algo novo para quem já se ocupou um pouco em tentar descobrir o que foi o tal do Renascimento. E também não surpreenderá aqueles que, ao terem lido um pouco sobre a história da produção artística humana, descobriram que o rompimento da idéia de “imitatio”, o “inovatio”, foi justamente o que deu vida ao tal do Barroco e outros que o sucederam e por aí vai.

Ser totalmente original, a meu ver, é um pensamento bastante ambicioso. Tal coisa talvez até parecesse plausível, antes do estabelecimento da aldeia global. Até há pouco tempo, europeus poderiam se achar mais evoluídos, ou mais originais, que povos antigos americanos. Fato é que muito pouco restou dessas culturas antigas e muito menos ainda se sabe sobre elas. Em suma: algo original no Brasil pode muito bem ser - ou ter sido - costume de alguma tribo perdida na Austrália, e vice-versa. Quem vai saber, com 100% de certeza?

Escrever (ou fazer qualquer outro tipo de arte) só para querer ser original, e ao mesmo tempo fechar os olhos para o que outros produzem ao seu redor, ou produziram no passado, é uma atitude que eu - EU, Helena, nesse momento da minha vida e no atual ponto de evolução em que me encontro – considero bastante imatura.

Como já disse, depende muito do propósito do artista. Em minhas pinturas infantis, por exemplo, como eu só queria brincar, dar-me a chance de descobrir cores, combinações, materiais e limitações por conta própria, como eu só queria me distrair, pude prescindir de ler sobre técnicas (para não me deixar influenciar por elas). Por outro lado, se quisesse mesmo investir nessa área, tornar-me de fato uma artista plástica, meu primeiro passo seria tentar educar-me no assunto, pelo menos tentar saber o que já foi tentado antes.

Como escritora e artista (ainda que seja só de telas infantis) também me preocupo com a questão da influência dos meus mestres sobre minhas produções. Lógico que é necessário buscar um equilíbrio. A receita para encontrá-lo? Cada artista tem que encontrar a sua e ponto! Penso que, de fato, é muito difícil – arrisco dizer quase impossível – vivermos sem nos deixar influenciar pelo que quer que seja. De algum modo precisamos construir o que somos a partir de uma base pré-existente. E até mesmo quando não se tem contato com outros seres humanos, como na lenda romana de Rômulo e Remo, ambos criados por lobos, ainda assim é possível reconhecer a existência de um núcleo básico em nós, como se fosse algo genético* – algo parecido com o que Noam Chomsky chamou de Gramática Universal no campo lingüístico.

Assim sendo, educar-se, instruir-se cada vez mais me parece ser requisito fundamental para encontrar um estilo próprio. Logicamente aqui me refiro àqueles artistas que querem se 'profissionalizar', digamos assim. Afinal de contas, como saber se um estilo é original se não pudermos comparar com outros? Seria algo mais ou menos do tipo: “Em terra de cego quem tem um olho é rei”? Pelo menos quando nos informamos (pelo menos tentamos!), diminui o risco de sermos acusados de sair por aí divulgando idéias vagas, sem um bom fundamento, não?

Não ambiciono que este artigo esteja acabado. Estou ainda pensando, ensaiando sobre o assunto. Se quiser contribuir, fique à vontade.

Um abraço fraterno.

*Errata: em lugar de 'genético', quis dizer algo 'instintivo', 'inato', uma idéia mais genérica.