O Marquês de Nossa Senhora das Mercês Responde.

Ultimamente – depois que meus contos passaram das 2.000 leituras no sítio virtual em que estão disponíveis – muitas pessoas vem até mim para fazer perguntas.

Não sou a pessoa mais interessante e sociável deste mundo. Menos ainda a mais carismática, inteligente ou mesmo original. Devem existir montes de montes de Geraldos Töperas andando pelas ruas de qualquer cidade do mundo. Nunca me senti um gênio incompreendido e, aliás, acho que isso é pretensão megalomaníaca perigosa e suscetível a tratamento psiquiátrico em caráter de urgência. Em suma, para a decepção de meus leitores, sou realmente um cara normal até demais. Pode até chamar a atenção o fato de eu cultivar as madeixas um pouco mais longas que as do cidadão médio e também o fato de eu ser um estudioso e entusiasta adepto da arte milenar de tatuagem. Também é fato que sou um verdadeiro rato de livraria. Leio compulsivamente e escrevo da mesma maneira. Para mim os melhores escritores são aqueles que foram reacionários, funcionários públicos ou jornalistas. Ou as três coisas juntas. Tenho muito de jornalístico em meu texto. Incontestável que Bukowski, Kafka, Miller, Dostoievski, Nelson Rodrigues, Louis Ferdinand Céline e Mário Benedetti foram os maiores escritores que já pisaram sobre essa terra. Nenhuma verdade insofismável nisso. Nenhuma constatação genial, tampouco. Pura observação. Então, para não ficar me delongando e escrevendo laudas e laudas de belas e inúteis palavras compridas que necessitam de constantes idas ao dicionário, resolvi selecionar as melhores e mais coerentes perguntas e tentar soluciona-las sem muitos prolegômenos e pormenores. Aqui estão elas:

Porque você escreve desse jeito? De que jeito? Pergunta o humilde autor. Escrevo do jeito que sei escrever. Comecei com um poeta idiota metido a concretista e quebrei a cara. Piegas que só vendo. Sentimentalões como um pote de Karo. Nada mais adocicado e enjoativo que meus versinhos pueris. Um belo dia encheu o saco fazer isso. Pura perda de tempo. Fiquei enojado do meu estilo e resolvi arriscar, resolvi mudar. Ou se preferirem essa explicação nas palavras de Zóla: “Minha musa demostrou-se ser uma lambisgóia inútil. Doravante, seria prosador”. E foi isso que fiz. Decidi-me por ser contista por um único primeiro texto em prosa que escrevi. Ótimo, prefiro assim. E você também.

Quem são seus personagens? Ora, pode ser qualquer pessoa. Sua mãe, seu pai, seu professor de física de sétima série, aquele seu colega de trabalho que você tem certeza que é um alienígena que veio de outra galáxia ou dimensão, o motorista homicida da condução que leva você ao trabalho ou a universidade todos os dias, o garçom do seu bar preferido que você trata pelo primeiro nome e discute resultados do Campeonato Brasileiro e das corridas de cavalo, seu estagiário lerdo, sua cantora preferida, ou vizinho de porta há anos que não recebe a esmola do seu olhar ou um prosaico “bom dia”. Pode ser qualquer um. Inclusive eu mesmo. Apenas não me exponho tanto assim. Privacidade e minhas manias adquiridas pelos anos são sagradas para mim. Não é apego. Apenas instinto básico de sobrevivência. Nada mais que isso.

Ás vezes você escreve contos pela perspectiva feminina essa perspectiva é muito parecida com a sua porção masculina? Essa é moleza! Eu tenho um lado feminino muito pronunciado. E ele é homossexual declarado assim como sou indubitavelmente heterossexual. Se eu tivesse nascido mulher seria uma lésbica igualzinha a Camile Paglia. E promoveria uma verdadeira revolução armada contra aquelas feministas radicais que são feia, desinteressantes, burras, gordas, desleixadas e com os peitos caídos. Sou fascinado pelo universo feminino. Beleza é fundamental sim. Mas beleza vem acompanhada de sensibilidade, inteligência, sagacidade, senso de humor, meiguice, ternura, companheirismo e carinho. Sem isso não existe o belo. Sonho com o dia que as mulheres recebam salário igual ao dos homens. Por isso escrevo muito sobre elas. Por puro fascínio pelo seu universo tão paralelo ao nosso. Conheço muitas garotas que tem uma história de vida que daria um romance épico espetacular. Histórias que arrepiar os cabelos da nuca de tão incríveis e cheias de reviravoltas que são. Conheço homens intrépidos mas conheço mulheres que são um verdadeiro exemplo. Adoro homenageá-las. Adoro ver por suas perspectivas. E ademais, a companhia delas é muito mais interessante.

Uma doce jovem senhora que leu meu conto no blog e perguntou-me em tom maternal se meus contos sobre trabalho são fictícios: Minha resposta, cara senhora, é uma só: são reais até demais. Já expliquei várias vezes em meus textos que trabalhar para mim é um martírio. Se a senhora realmente quer saber se tudo aquilo é real posso adiantar-lhe que todos eles são a retratação de uma hora do meu dia. Meu dia de trabalho tem sete horas. Ninguém faz nada durante sete horas seguidas. Ninguém faz amor sete horas seguido, ninguém bebe sete horas seguidas, ninguém beija sete horas seguidas, ninguém come sete horas seguidas, muito raro nos dias de hoje alguém dormir por sete horas seguidas. Então, não é realmente patético, brutal e exploratório se trabalhar durante sete horas? E cada hora para mim é um novo pesadelo e por fazer o serviço mais burocrático, desnecessário, mambembe, inútil e letal do universo meus contos refletem apenas meus sentimentos mais sinceros sobre o que acho do mecanismo muito bem engendrado e essa armadilha sórdida que convencionamos em chamar de sociedade.

Porque você descreve as suas mulheres daquele jeito? Ora, novamente o “daquele jeito”. Não descrevo nenhuma mulher de jeito nenhum. Se você pegar isoladamente minhas descrições das personagens femininas dos meus textos irá reparar que elas são belas barangas. Meu patrão de beleza (assim como todos os meus padrões referentes ao ser humano médio) é completamente apartado dessa doença infantil que foi disseminada pelo planeta inteiro pela indústria da moda. Essas atrizes hollywoodianas para mim são a coisa mais fabricada que existe. Esse papo de “mulher brasileira” para mim não passa de um engodo para justificar essa miscigenação desenfreada que ocorreu por aqui e que distorceu totalmente os seres que habitam essa terrinha. Nenhum comentário racista por aqui. Não tenho raça, religião, ideologia, anseios, projetos, sonhos. Não penso no futuro para além de o que eu vou comer no meu intervalo e onde vou beber meu trago hoje. Minhas mulheres de papel são apenas a tentativa de mostrar seres humanos com emoções e que sejam os mais reais possíveis. O resto é perfumaria.

Porque você bebe e se droga tanto? Eu não bebo, xará. Meus personagens é que são desagradáveis e doentios que bebem e se chapam como se fossem extinguir toda produção de do álcool e das drogas do universo. Eu bebo como todo mundo. Todo mundo não bebe, afinal? Os bares apinhados todos os dias da semana aqui da cidade não me deixam mentir. Os bares que estão jogados às moscas e à beira de fechar suas portas foram mal geridos. Simples assim. Se você prestar um bom atendimento ao público, tiver um cardápio honesto e um preço idem, boa música e umas gatas interessantes para se olhar, todo dia terá a sua casa cheia. E o bar é um bom lugar para pincelar impressões e pessoas que depois posso muito bem transformar esses detalhes em crônicas, contos e histórias. Toda minha produção é focada na observação. Nada de extraordinário nisso, não é mesmo?

Você fala muito de crack em seus contos. Já usou? Perguntinha capciosa essa, mas vou dizer com a maior fraqueza do mundo. Sou adicto de drogas pesadas há 16 anos (se chegar até oito de agosto desse ano) e sei que o tratamento é duro, doloroso e continuo. Posso também afirmar categoricamente que esse será o problema de saúde pública numero um do século vinte e um. Outra vez a observação se faz presente. O meu livro que está sendo escrito e que é intitulado de “Contos Murinos”, antes de qualquer coisa, é um libelo contra essa praga que assola todas as classes sociais e gente de todas as idades. A politica governamental norte americana que é pútrida até o amago criou raízes de sistemas de dizimação populacional e durante o regime militar brasileiro assumiu essa politica que reflete nos dias de hoje da forma mais degradante possível. Os negócios escusos apenas mudam de mão, vide situação do Rio de Janeiro. E assim podemos tirar essa pergunta cheia de veneno da frente. OK?

Porque seus contos sempre são ambientados em Curitiba? Essa é meio óbvia, mas vá lá... Pelo simples fato de eu ter nascido e insistir em residir ainda por aqui. Se eu morasse em Montevidéu seriam ambientados lá. Além do mais, Bukowski, Nelson Rodrigues, Honoré de Balzac ambientaram seus escritos em L.A., Rio de Janeiro e Paris respectivamente e tudo mundo acha isso muito bonito. E eu também.

Quando você vai publicar o livro, afinal? Desde que te conheço você escreve? Vou publicá-lo quando achar que está terminado. Vou publicá-lo quando colocar um ponto final que ainda não veio. Posso até publicá-lo virtualmente ou por dinheiro próprio. A pressa é inimiga de arte e se você deturpa ou desrespeita a sua arte pode até ganhar rios de dinheiro, mas para mim você perde credibilidade e afirmo categoricamente que isso não tem preço. Tenho dito.

Beijos e Abraços Fraternos para todos.

Namasté.

Geraldo Töpera

Marquês de Nossa Senhora das Mercês

Curitiba, 18 de maio de 2011.

Geraldo Topera
Enviado por Geraldo Topera em 18/05/2011
Código do texto: T2978042
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