O CASO PIMENTA NEVES

O estudo da psicologia, não sei se seria redundância eu aqui qualificá-la com o adjetivo "humana", já que a tal ciência que me refiro se propõe a estudar e entender o comportamento da espécie Homem, diz que qualquer um de nós, em condições adversas muito críticas, somos potenciais homicidas.

E mais uma vez um crime passional ocorrido há onze anos vem a tona por mandar, tardiamente, o seu réu ao cumprimento da sua pena por homicídio.

Lembro-me que uma vez eu já discuti num de meus textos do Recanto a semântica da palavra paixão (sofrimento- vide Paixão de Cristo), muito além do sentido "amoroso" e o caráter muitas vezes patológico deste torpor já reconhecido pelas ciências médicas como um estado de inundação orgânica hormonal advindo da secreção de inúmeros neurotransmissores cerebrais.

Por que ela ocorre, só Deus nos saberia explicar.

Não estou aqui a defender os crimes movidos por ela, longe disto.

Apenas discuto os lados da questão: físico, psíquico, social, jurídico e pessoal.

Quando vemos o desfecho prospectivo de onze anos do caso Pimenta Neves, ficamos estarrecidos como o tal sentimento "paixão" muitas vezes destrói vidas, não apenas dos envolvidos diretamente, como também dos seus entornos familiares.

Ver o estado da família da namorada que perdeu a vida brutalmente, e também ver o presente estado físico e emocional do Homicida, faz com que percebamos o grave desfecho do desastre "paixão" sobre suas vidas, o que nos deixa perplexamente tristes e preocupados.

Todos perderam, e perderam muito.

Perdas definitivas.

Também já citei que existe no currículo de direito criminal de algumas universidades de Direito a indicação da leitura dum livro muito valioso chamado A PAIXÃO NO BANCO DOS RÉUS, e ali percebemos que as tristes histórias passionais são sempre as mesmas, têm roteiros e desfechos idênticos.

Um mar de envolvimentos fortes, insanos, insensatos, aonde o egoísmo e o egocentrismo preponderam, a velar o senso de percepção e de individualidade dos seres patologicamente e simbioticamente envolvidos nos seus caos.

Fato é que por mais que exista a justiça dos homens, penso que tal julgamento humano está muito aquém de entrar na intimidade real do âmago de toda a dinâmica comportamental dos relacionamentos patológicos, mesmo daqueles que levam o outro a matar.

Talvez o homicídio ocorra no exato momento insano no qual quem mata o faz porque se sente despersonalizado e totalmente perdido, tão desnorteado a ponto de acreditar erroneamente de que não tem mais nada a perder. E alí alguém se perde para sempre.

O que levaria alguém a perder o rumo?

Neste sentido, se for o réu o tal do embriagamento" paixão", não resta dúvidas de que ela se configura como uma grave doença, ainda que por fracções muito bem delimitadas de tempo.

Ninguém mata por amor, isso é bobagem, mas mata por paixão...muitas vezes por SI MESMO.

E nós, meras pessoas todas sujeitas aos mesmos infortúnios, atiramos pedras, julgamos e condenamos arbitrária e leigamente porque não conseguimos entender algo tão difícil e complexo de ser explicado.

E por fim a prisão de Pimenta Neves levanta mais uma vez a precária situação do nosso sistema carcerário e do nosso código penal.

Só mais umas entre tantas das nossa mazelas humanas e sociais.

Nós, todos réus condenados a vivermos neste mundo sem grandes acomodações, muito menos sem grandes explicações.

O nosso veredicto? Viver. Simplesmente viver sem muito , para não dizer sem nada, entender.

E apenas a rogar: que Deus nos livre de toda e qualquer semântica paixão.